Filme do Dia: Hitler - Um Filme da Alemanha (1977), Hans-Jürgen Syberberg
Hitler -- Um Filme da Alemanha (Hitler – Ein Film das Deutschland, Al.
Ocidental/França/Reino Unido, 1977). Direção e Rot. Original: Hans-Jürgen Syberberg. Fotografia: Dietrich Lohmann. Montagem: Jutta Brandtsaedter. Dir. de
arte: Hans Gailling. Figurinos: Barbara Gailling. Com:
Harry Bauer, Heinz Schubert, Peter Kern, Hellmut Lange, Rainer von Artefals,
Martin Sperr, Peter Moland, Johannes Bozalski.
Esse monumental ensaio sobre Hitler e
sua influência sobre a cultura, inclusive cinematográfica, mundial e,
particularmente alemã, mesmo numa versão menor que a original, torna-se um
divisor de águas na carreira do realizador, em termos de sua monumentalidade,
tornando-se seu filme mais artisticamente reconhecido e o final do tríptico
sobre a Alemanha, juntamente com Ludwig,
Réquiem para um Rei Virgem (1972) e Karl May (1974). Como desde o primeiro filme da trilogia, Syberberg prima por um
estilo bastante iconoclástico com relação ao sistema de representação
tradicional do cinema. Seus filmes, em termos de encenação, encontram-se
próximos do teatro e da ópera (que não por acaso seria a matéria prima para seu
posterior Parsifal) e, em termos
visuais, combinam, de forma magistral, a falta de profundidade de campo na qual
seu elenco se movimenta com a tridimensionalidade sugerida pelos ambientes,
naturais ou internos, projetados ao fundo. A onipresença de elementos em cena,
de um pequeno globo com uma representação do Black Maria, estúdio de Edison e
espécie de marco do surgimento do cinema até toda uma variedade de bonecos, de
marionetes a manequins, Syberberg se debruça em um tema ainda basicamente tabu
na própria Alemanha – com exceção de Brutalidade em Pedra (1961), praticamente nenhum realizador do Novo Cinema Alemão ousou
se deter diretamente sobre o legado de Hitler. Syberberg o faz a partir de uma
não menos monumental apropriação de fontes, sobretudo sonoras e, quando mais se
aproxima o final, também audiovisuais, de discursos, referências literárias e
cinematográficas (como O Gabinete do Dr. Caligari e O Grande Ditador) que
constrói um painel multifacetado com momentos de brilho intelectual e emotivo
intenso – talvez nunca tão intenso como quando Baer, ator habitual de
Fassbinder e protagonista de Ludwig,
disseca sobre a maior herança de Hitler foi de, em outras palavras, ter tornado
a humanidade mais cética. Noutro momento, a representação de um assessor direto
de Hitler desfia sobre o seu cotidiano de forma tão próxima da documental que
bem poderia não se tratar de um ator. Imagens vaporosas e cenários (“virtuais”
ou reais) grandiloquentes e demasiado estilizados, impregnados de simbolismo o
aproximam da dimensão operística, assim como a presença recorrente da música de
Wagner – uma das outras obsessões de Syberberg, sendo o neto do compositor o
tema de seu documentário produzido no mesmo ano, As Confissões de Winifred Wagner e de quem adaptaria Parsifal. O estilo de Syberberg é tão
iconoclástico que quando ele efetua um plano/contraplano entre dois
personagens, soa quase como uma ironia. A reflexão sobre o próprio universo do
cinema se encontra presente a todo momento, das menções em cartolina do Dr.
Caligari e Cesare a presença das logomarcas dos grandes estúdios
hollywoodianos, passando pela reencenação do dramático discurso final de M (1931), de Lang pelo ótimo Peter Kern que, como quase todo o
elenco, assume vários papéis. E, no plano visual, se por vezes os personagens
se dirigem diretamente à câmera, a determinado momento interpelam diretamente o
espectador (ao estilo provocativo do Godard de Vento do Leste). A versão mais longa conta com 442 minutos. TMS
Film GmbH/Solaris Film/WDR/INA/BBC. 360 minutos.
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