Filme do Dia: Noite Passada em Soho (2021), Edgar Wright
Noite Passada em Soho (Last Night in Soho,
Reino Unido, 2021). Direção Edgar Wright. Rot. Original Edgar
Wright & Krysty Wilson-Cairns, a partir do argumento de Wright. Fotografia
Chung Chung-hoo. Música Steven Price. Montagem
Paul Machliss. Dir. de arte Marcus Rowland & Tim Blake. Cenografia Judy
Farr. Figurinos Odile Dicks-Mireaux. Com Thomasin McKenzie, Anya
Taylor-Joy, Matt Smith, Michael Ajao,
Diana Rigg, Rita Tushingham, Terence Stamp, Synnove Karlsen, Pauline McLynn,
Margaret Nolan.
Eloise “Ellie” (McKenzie), moradora da
Cornualha com a avó (Tushingham) comemora seu aceite na mais prestigiada escola
de moda londrina. Sua mudança para o bairro do Soho, no entanto, após um
primeiro contato não muito agradável com colegas de curso, lhe reservará ainda
mais problemas, a partir do momento que realidade e visões dos anos 60 passam a
se confundir, de forma cada vez mais intensa, em sua vida. E ela se sente
obcecada por uma personagem que surge repetidamente em seus sonhos, Sandie
(Taylor-Joy), aparentemente vítima de um
crime.
Há inteligência na forma como confunde
as temporalidades ao início, é bem verdade, inclusive fazendo uso de rostos
(Rigg e Nolan, mas sobretudo Tushingham e Stamp) e canções (Don’t Throw Your
Love Away, You’re My World, Got My Mind Set on You, Heat
Wave, Land of a 1000 Faces) que povoavam as telas e as rádios
e discos de um dos momentos gloriosos do passado britânico recente, a Swinging
London. E também como dispõe o que parece ser uma aproximação mais literal do
tema do duplo – vivida, aliás, por Stamp, em seus áureos dias, em um dos
episódios de Histórias Extraordinárias.
Porém, há também o inevitável desgaste quando passa a seguir os
protocolos mais próximos do horror/suspense, de forma mais escancarada,
aproximando-se mais de excessos recentes a seu lançamento (como Saint Maud)
e talvez indo até além em recorrências – como a
cena em que Ellie corre alucinada pelas ruas da Londres contemporânea,
observando literalmente seus fantasmas, não menos que deplorável. Está-se
atento às marcas identitárias geracionais, que podem ser caricatas – a
vulgaridade das garotas comandadas por Jocasta, que inicialmente pode-se pensar
se tratar de um descuido de produção, assim como os cenários e posturas mais
contemporâneas – ou afirmativas, no que tange às minorias (John, a figura
masculina menos ameaçadora, é negro; a investigadora policial que não a leva na
troça demonstra sensibilidade com Ellie, enquanto seu colega ri no banheiro
masculino (espécie de lócus privilegiado onde pode aflorar uma “sensibilidade
masculina” menos tolhida pela grade de força civilizacional) compartilhando suas histórias com outros
colegas; e, mais chocante de todas, que é a condescendência com que
assassinatos seriais podem ser observados, a partir do sexo de quem os realiza
e/ou fica ciente dos mesmos. E ocorre
descidas ao vale dos clichês, nas quais o filme perde grande parte de seu
potencial, e parece lembrar que seu caro orçamento deve sinalizar para algo que
atinja um grande público, como é o caso
do personagem de John, demasiado patético em seu tom monocórdio de apoio a
Ellie. Com seus excessos, o filme revisita tropos do gênero, de forma
relativamente original, como é o caso de um novo ambiente claustrofóbico e
associado com morte e realidades paralelas que, obviamente, remetem a filmes como
Repulsa ao Sexo (inclusive em termos de uma provável lida problemática
com a sexualidade) e Inverno de Sangue em Veneza. Também poderia ser
visto, ainda que involuntariamente, como trabalhando de forma sombria os
aspectos oníricos que se tornam mais reais que a própria realidade de O
Fabuloso Destino de Amélie Poulan. Último filme de Rigg, que não viveria
para vê-lo lançado e para quem o filme é dedicado. E o mesmo vale para Nolan,
cuja dedicatória fica reservada aos créditos finais.| Focus Features Int./Film4/Working
Title Films/Complete Fiction para Universal. 116
minutos.
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