Filme do Dia: A Batalha do Chile - Segunda Parte: O Golpe de Estado (1976), Patrício Guzman

 


A Batalha do Chile – Segunda Parte: O Golpe de Estado (Cuba/Chile/França, 1976). Direção Patrício Guzmán. Rot. Original Jose Bartolome, Pedro Chaskel, Federico Elton, Julío Garcia Espinosa & Patrício Guzmán. Fotografia Jorge Müller Silva. Montagem Pedro Chaskel.

Inicia com o clima de confusão e desnorteio que se segue às primeiras reações de não aceitação do resultado das eleições, que surpreendendo o otimismo da oposição, sagrou Allende vitorioso. E com o Exército supostamente dividido entre forças leais (das quais está, pasmem, Augusto Pinochet) e de oposição. E com a célebre imagem de um cinegrafista argentino que não “filma sua própria morte”, como afirma o narrador, mas é baleado e morre enquanto filmava a truculência de membros do exército chileno nas ruas. A primeira quartelada partiu de um grupo fascista que se refugia na Embaixada do Equador, enquanto o Partido Democrata Cristão reconhece os princípios constitucionais. Os trabalhadores se apossam de uma grande quantidade de fábricas e há passeatas, acusando a reação da esquerda à tentativa de golpe. Allende, em seu discurso, não aprova o fechamento do congresso que boa parte da multidão pede, mas não deixa de sinalizar para a possibilidade de um plesbicito. O Congresso nega o pedido de estado de sítio a Allende, que poderia torna-lo capaz de efetuar mudanças na cúpula militar. Em uma das cenas mais emblemáticas da polarização e instabilidade política gerada no país, um deputado do Partido Comunista apresenta o seu colega, do Partido Nacional, como um golpista cuja rádio não se pronunciou frente a quartelada que deixou mais de vinte mortos. Quando este tem a palavra, não consegue mais que tartamudear generalidades sobre ser contrário a incitação da luta de classes, fazer uma referência indireta ao desabestecimento e tentar desqualificar quem lhe acusa pela idade e por não pensar em outra coisa que a revolução. Mas não responde de fato ao que lhe foi inquirido. A fala do reitor da Universidad Catolica parece desmentir a declaração prévia de Allende sobre sua ausência se ter dado por compromissos outros, já que este acusa a Unidad Popular (UP), a frente de partidos de esquerda apoiadora do presidente,  de enxergar como uma lupa o que acredita serem uma pequena minoria contrárias a seus projetos. Há posições divergentes também à esquerda, sobre a ocupação das fábricas. Enquanto setores da UP acreditam que é um sinal de debilidade frente à legalidade, provocando ingerência na tentativa de acordo com a Democracia-Cristã para possuir uma maior sustentação parlamentar, setores mais radicais, como os vinculados ao Partido Socialista, acreditam se tratar de um movimento necessário frente ao conflito inescapável (guerra civil) que se anuncia. E o discurso de uma unidade política não alinhada com a UP, conclama uma verdadeira sedição, com exército autônomo. Ocorre uma resistência de trabalhadores à devolução de unidades fabris para que se torne possível o acordo político. Uma autoridade da UP fala com as lideranças policiais para que recuem. As cisões internas da classe trabalhadora são explicitadas em uma assembleia da CUT, o sindicado dos trabalhadores, que se encontra próximo da visão da UP, enquanto os participantes se encontram crédulos que já estão suficientemente organizados para reagirem à reação da direita. Como se fosse apenas uma questão de organização do movimento. Uma das incompreensões é sobre a dificuldade de conseguir capitalizar fábricas ocupadas-nacionalizadas, que acabarão se tornando um peso morto ao governo. Outra, uma delas ser uma fábrica suíça, que é um país que compõe o Clube de Paris, que negocia a dívida externa do Chile. O longo trecho que capta o debate, finda com a fala do representante da CUT, associando as decisões ao “companheiro Allende”, como que temoroso das cisões mais profundas em relação ao governo, em um momento de equilíbrio tão delicado. E o final da sequencia com sua fala parece corroborar uma posição similar dos realizadores do documentário. A igreja católica conclama a pacificação e o diálogo, deixando em posição delicada a Democracia Cristã (DC), que há vinte dias se escusa em receber o governo. O assassinato de um ajudante de ordens do presidente, pela extrema direita, segue-se. O homicídio visou que Allende não fosse informado do golpe que está já sendo gestado junto aos círculos militares de Valparaíso. As ofensivas ações militares às fábricas sobre o domínio dos trabalhadores, sob o pretexto de buscar armas, já se somam 27, sem ter encontrado nada em nenhuma. A DC incita Allende a interromper com as nacionalizações e submeter os oficiais do Exército a aprovação do partido. Com a negativa de Allende, as negociações entre UP e DC são interrompidas. O Exército passa a ser incorporado ao governo, trazendo o General Pratts (fiel a Pinochet, e posteriormente assassinado na Argentina) e Pinochet (tido ainda como constitucionalista) para mais próximos de Allende. Greve dos empresários de transporte para prejudicar o abastecimento e a população se organiza para a criação de uma alternativa junto ao governo, vendendo os produtos a preço de custo. Em 22 de agosto de 1973 se dá a legitimidade parlamentar ao golpe de estado. Em 4 de setembro há uma grande comemoração pelos 3 anos do governo Allende. Este planeja um plebiscito sobre a continuidade ou não de seu governo, para ser anunciado no dia 11. Nesse mesmo dia, 4 destroieres americanos se aproximam de Valparaíso. Com as forças militares que ainda permaneciam no La Moneda liberadas (e observamos um breve plano de sua saída desesperada do edifício), apenas 40 civis e Allende permanecem na edificação. No discurso militar para a televisão que anuncia a subjugação do governo de “podridão marxista”, embora o primeiro a se pronunciar e o mais breve, seja justamente Pinochet. Também é memorável  a afirmação de um dos membros da junta militar, de que a maior parte da população estava favorável a ação empreendida por eles – ação vislumbrada ao início do episódio, chocante por sua agressividade, fazendo uso de caças para bombardeio aéreo,  sem que haja qualquer reação do Palácio, que passa a sofrer incêndios nos seus andares mais elevados. Finda com uma frase de esperança de Allende, proclamada nesse mesmo dia, que também foi o de sua morte. |Equipe Tercer Ano/ICAIC. 88 minutos.

 

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