Filme do Dia: Juventude, Divino Tesouro (1951), Ingmar Bergman
Juventude, Divino
Tesouro (Sommarlek, Suécia, 1951). Direção:
Ingmar Bergman. Rot.Original: Ingmar Bergman & Herbert Grevenius.
Fotografia: Gunnar Fischer. Música: Eskil
Eckert-Lundin, Erik Nordgren & Bengt Wallerström. Montagem: Oscar Rosender.
Com: Maj-Britt Nilsson, Birger
Malmsten, Alf Kjellin, Annalisa Ericson, Georg Funkquist , Stig
Olin, Mimi Pollak, Henrik's aunt, Renée
Björling, Gunnar Olsson.
Marie (Nilsson), bailarina que se encontra nos
últimos preparativos para a estréia de uma apresentação do Lago dos Cisnes, recebe o diário de Henrik (Malmsten), com quem
vivera um intenso e breve romance há muitos anos. Emocionalmente perturbada,
ela inicia uma jornada ao passado, relembrando muitos momentos como quando
voltando em uma balsa de um ensaio no balé fora abordada por Henrik, que afirmara ser ela
a mulher mais bela que já vira. Como o ensaio é adiado devido a um
curto-circuito elétrico, Marie ignora os queixumes banais da companheira Kaj
(Ericson) e pega um bote que a leva para a ilha onde fica a casa de um
ex-amante de sua mãe, a quem chamava de Tio Erland (Funkquist). Na mesma noite
em que se tornaram amantes, ao voltarem de um passeio de bote ao luar,
escutaram constrangidos suas declarações, sentado ao piano e alcoolizado, a
respeito de seu envolvimento com a mãe de Marie, ferida renascida com a
semelhança física entre ambas. Sua esposa, Elisabeth (Björling), compreensiva e
temerosa de seu estado, aconselha que os jovens se retirem. Eles vão então para
o quarto onde passam a primeira noite juntos. Porém, poucos dias antes de
partir para Upsalla e de se separarem, Henrik insiste em um último banho de
mar, e salta para a morte, ferindo-se nas pedras. Marie, após presenciar sua
morte no hospital, jura a Erland, odiar a Deus até o final de seus dias. Erland
afirma que a única forma que ela poderá superar o drama será nunca mais se
lembrar do ocorrido e a leva para uma viagem de alguns anos. Assim como havia
reencontrado o pastor (Olsson) que vira jogando com a moribunda tia de Henrik
(Pollak), na única vez que o visitara em sua casa - ele não conhecia a mãe e,
seu pai, divorciado, morava distante, Marie sente o impulso de revisitar a casa
de Erland. Porém ao se deparar repentinamente com ele, que revela ter sido quem
lhe enviara o diário de Henrik, ela apenas demonstra seu desprezo e asco,
afirmando que suas mãos apesar de belas eram também feias, quando se lembrava
que as haviam tocado na sua juventude. Embora, no momento envolvida com o
jornalista David (Kjellin), com quem se encontrara rapidamente antes de pegar o
barco, Marie se encontra solitária e deprimida
nos camarins do teatro, após mais uma vez ignorar os comentários
vulgares de sua colega Kaj, que igualmente ignora seu drama existencial, quando
repentinamente aparece o mestre das bailarinas (Olin). Esse, em pouco tempo,
faz um breviário de sua vida afetiva, fazendo com que a máscara de rigidez
emocional de Marie caia, afirmando que toda a muralha emocional que construíra
nos últimos vinte anos, a partir do momento que centrara toda sua vida na
carreira profissional fora suficiente para transformá-la no que era, sem a
coragem de enfrentar a morte como também a vida e agora pateticamente tentando
esboçar uma nova vida tardiamente. Como conselho, este lhe aponta que - como ele - tudo o que lhe resta é seguir sua
carreira profissional. Ou isso ou nada. David, chega no momento e entra em
atrito com o mestre bailarino, que vai embora. Marie, dividida, pede que ele vá
e leve os diários de Henrik para ler, após tê-lo chamado de Henrik. Este
retorna no dia seguinte, quando Marie demonstra que além da profissão ela
também pretende voltar a viver emocionalmente.
Assim
como em Monika e o Desejo e Rumo à Alemanha, Bergman mais uma vez
explora a fragilidade do amor juvenil frente a complexidade de um mundo pouco
condescendente. Seu retrato é tão tocante e agridoce quanto os de outros filmes
da época, embora o arranjo final e a superação do trauma de Marie sejam breves
demais para soarem críveis. Mesmo assim, deve-se elogiar a busca de uma saída
que vá além do pessimismo absoluto como em Rumo à Alemanha e ao contrário de Monika e o Desejo. Entre os grandes momentos a seqüência em que Marie externa sua
revolta após a morte de Henrik e, principalmente, o forte dialogo próximo ao
final em que Bergman também lança mão de algumas características que se
tornariam recorrentes ao longo de sua obra como o uso dramático do espelho e o
close do rosto feminino dividido. Curiosamente podemos traçar um paralelo entre
a aparição do mestre das bailarinas fantasiado de mágico e a do cineasta vivido
por Truffaut procurando também remediar a crise de sua estrela para que o
espetáculo continue em Noite
Americana (1973), sendo que em ambos os casos o conselho é para que
a vida se torne secundária frente à arte,
ainda que no caso de Bergman aponte para uma saudável recusa dessa
opção, preferindo apostar também na vida e na busca da satisfação pessoal. É
traçado um paralelo entre os personagens de Marie e do odiado tio Erland, ambos
carregando a ferida de um amor não mais possível de se concretizar, embora no
caso de Marie ocorra a redenção final.
Formidável e poética utilização do flashback
que pontua toda a narrativa presente, como que confirmando que, após ter Marie
rompido com o bloqueio de pensar no caso de Henrik, a memória se tornou nesse
momento tão ou mais presente que o próprio presente. Svensk Filmindustri. 96
minutos.
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