Filme do Dia: A Serpente (1925), Buntarô Futagara


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A Serpente (Orochi, Japão, 1925). Direção: Buntarô Futagara. Rot. Original: Rokohei Susukita.  Fotografia: Seizo Ishino. Com: Tsumasaburô Bandô, Misao Seki, Utako Tamaki, Kensaku Haruji, Momotarô Yamamura, Kotonosuke Nakamura, Shigeyo Arashi, Kichimatsu Nakamura, Shizuko Mori, Zen’ichirô Yasuda.
Numa reunião de samurais Heisaburo Kuritomi (Bandô) é injustamente acusado de ter sido quem iniciou as provocações que geraram briga e confusão no grupo e não Namioka, o verdadeiro provocador, sendo advertido pelo Mestre que uma confusão mais e ele será banido. Até mesmo Namie (Tamaki) pensa ter sido ele o pivô da situação, sendo suspenso por um mês. Quando Heisaburo escuta três samurais conversando sobre boatos a respeito de Namie os ataca em plena luz do dia. Kuritomi é banido. Melancólico, acredita que Namie é a única que ainda confia nele, e para ele é o suficiente. Porém, quando chega em sua residência, ela o rejeita e ele tenta se explicar. Ela se agita. O Mestre flagra a confusão. Dia seguinte, Heisaburo é banido da cidade. Heisaburo decide se tornar um ronin. Um ano após vagar, um quase irreconhecível Heisaburo, cada vez mais indignado com as injustiças do mundo, é acertado acidentalmente pela comida que cai de um samurai que pretende forçar a uma gueixa. Ele vai tomar satisfações. O dono da pousada lhe oferece dinheiro, o que o enfurece ainda mais. A polícia é chamada e o homem afirma que Heisaburo exigia dinheiro. Após muita luta, vários homens conseguem prendê-lo, ele é julgado e condenado de chantagem e resistir à prisão, ficando confinado por dois meses. Ao sair e vagando a esmo, o miserável Heisaburo recebe a oferta de abrigo por parte de Kokichi (Kotonosuke Nakamura), sem saber que se trata de um ladrão comum, tornando-se guarda-costas dele. Após mais alguns dias presos por se encontrar no restaurante em que homens do seu patrão iniciaram confusão, sua fama de rufião e perigoso se espalha. Heisaburo observa a garçonete do restaurante por quem está apaixonado, Ochiyo (Mori), e se declara a ela, que foge desesperada. Kokichi, que testemunhou a cena, afirma que sabe como ele pode possui-la. Manda que seus homens a sequestrem e a levam para Kuritomi. Esse, mesmo tentado por vozes demoníacas, resiste a tentação de estuprá-la. A polícia chega ao local. Heisaburo fica seis meses na prisão. Ao sair  procura desesperado por Ochiyo, apenas para descobri-la casada, situação que o deixa completamente fora de si. A polícia o persegue, ele refugia-se na propriedade de Jirozo Akagi (Kichimatsu Nakamura), com o consentimento deste.Porém, logo descobrirá que seu senhor nada possui de nobre e que enriqueceu de atividades ilícitas como chantagem e sequestro de mulheres. Tal situação apenas acirrava ainda mais o ressentimento contra a injustiça em Heisaburo, que se considerava honesto mais um monstro pela sociedade enquanto ocorria o oposto com Akagi. Namie, o primeiro amor de Heisaburo, refugia-se de uma longa viagem com o marido enfermo, Shin’nojo  (Haruji) na casa de Akagi. Esse tenta seduzi-la. Heisaburo percebe a brutalidade contra Namie, mas pensa que nada pode contra Akagi. Ele suplica que não se use de mais violência contra o casal e não vê outra opção senão intervir violentamente. A policia chega ao local e mais uma vez Heisaburo é tido como culpado. Após lutar incessantemente contra dezenas de soldados e perceber que havia matado um homem pela primeira vez, Heisaburo deixa sua espada cair e é aprisionado e levado para a morte. Namie e seu marido observam tudo horrorizados. Ochiyo e seu marido também se encontram entre as testemunhas.
Se é quase um milagre a sobrevivência de um título desse período, quando se sabe as perdas maciças da produção silenciosa – e mesmo sonora dos primeiros tempos – na cinematografia japonesa, a opção nessa cópia por tentar aparentemente reproduzir o efeito do benshi, aquele que comentava aspectos da história durante a projeção, soa um tanto excêntrica. Para sua construção narrativa abertamente mitológica e similar a um conto de fadas algumas soluções visuais são perfeitamente convenientes como o passeio do melancólico herói à margem do mar, quando igualmente se acha à margem da sociedade. Da forma como filmado, o mar mais parece um efeito hiper-realista de estúdio, tão excêntrica parece a imagem. Sua trajetória poderia ser considerada quase um clichê psicanalítico: quanto mais tenta afirmar “a verdade”, ou seja, seu próprio ego, mais o protagonista se afunda nas incompreensões de um mundo cruel a sua sensibilidade, sensibilidade essa ao qual não falta igualmente o destempero e a força física fenomenal, diga-se de passagem. E, nesse sentido, torna-se interessante observar as formas de negociação que seu narrador propõe, entre a inocência de seu herói, elaborada através do tradicional processo de polimento que o eleva acima do mundo perverso e a capacidade de se aceitar ou não sem desconfiança como algo verossímil em qualquer época ou local, a sua “inocência”. Se se torna habitual as cenas em que  Heisaburo dá conta de lidar com vários ao mesmo tempo, por si só um clichê em filmes de aventura, ao final não apenas a quantidade é maior como os confrontos mais longos e cansativos. Destaque para a patética cena em que, mesmo cercado de dezenas de policiais bem próximos, o herói, em seu desespero, não percebe o cerco. E também para que uma montagem hiper-acelerada ressalta o exorbitante número que luta contra ele, num uso da montagem pouco habitual e sem provável qualquer influência soviética, cujas primeiras obras mais influentes internacionalmente ainda estavam sendo produzidas, sem falar que o efeito da apresentação de planos de milésimos de segundos é bem distinta da vanguarda soviética. Ao final, o sofrimento de Heisaburo poderia se assemelhar ao de Cristo, caso fosse enfatizado o momento em que é dominado, mas o que o filme insiste é antes na sua vigorosa resistência, que nada apresenta de passividade.  Seu produtor é também seu ator principal.   Bando Tsumasaburo Prod. 74 minutos.


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