Filme do Dia: O Homem Elefante (1980), David Lynch
O Homem
Elefante (The Elephant Man, EUA/Reino
Unido, 1980). Direção: David Lynch. Rot.
Adaptado: Eric Bergren, Christopher De Vore & David Lynch, baseado nos
livros The Elephant Man: A Study in Human Dignity de Ashley Montagu e The
Elephant Man and Other Reminisces de Frederick Treves. Fotografia:
Freddie Francis. Música: John Morris. Montagem: Anne V. Coates. Dir. de arte: Stuart Craig & Robert Carthwright.
Cenografia: Hugh Scaife. Figurinos: Patricia Norris. Com: Anthony Hopkins, John
Hurt, Anne Bancroft, John Guielgud, Wendy Hiller, Freddie Jones, Michael
Elphick Hannah Gordon, Helen Ryan, John Standing, Dexter Fletcher.
Na Inglaterra vitoriana, John Merrick (Hurt), com o tronco e rosto completamente
deformados, devido a um possível acidente que ocorreu com sua mãe –
aparentemente pisoteada por um elefante - quando gestante, é conhecido como
Homem-Elefante, sendo explorado por Bytes (Jones), um bêbado que o exibe em
espetáculos sensacionalistas e o faz viver em condições sub-humanas. Tendo
ouvido algo sobre o caso, o médico Frederick Treves (Hopkins) negocia com Bytes
para que ele permaneça no Hospital de Londres, exibindo-o para seus colegas
cientistas. Sofrendo inicialmente a desaprovação de profissionais do hospital,
como a da chefe de enfermaria (Hiller) e do próprio diretor, Carr Gomm
(Gielgud), Treves descobre que Merrick possui vida inteligente, quando ele
passa a recitar o salmo 23 da bíblia. O guarda noturno do hospital (Elphick),
consegue faturar algum dinheiro, levando escondido pessoas que recruta nos
bares decadentes, para observar Merrick. Por outro lado, Treves o leva para
conhecer sua esposa (Gordon), e Merrick emociona-se por que a acha parecida com
sua mãe. Também faz com que a sociedade londrina sacie sua curiosidade,
visitando-o. Entre eles, encontra-se uma famosa atriz, a Sra. Kendall
(Bancroft), que leva sua foto autografada e um exemplar de Romeu e Julieta para Merrick. A enfermeira-chefe adverte Treves de
que o grupo de pessoas que visita Merrick não demonstra muito interesse pelo
próprio. Em crise de consciência, Treves pensa até que ponto não reproduz
essencialmente o mesmo modelo dos espetáculos em que o havia encontrado, ainda
que agora Merrick vista-se como um dândi e o público seja mais sofisticado. A
comissão que cuida dos interesses do hospital não pretende mais que Merrick
permaneça na instituição, e na reunião em que visam selar essa decisão, são
obrigados a revertê-la com a inesperada chegada da herdeira de Vitória
(Ryan), que manifesta seu total apoio à iniciativa de Treves. Em uma de suas
visitas com um grupo grande de pessoas, o porteiro noturno realiza uma pequena
orgia no quarto de Merrick, inclusive fazendo com que ele veja o próprio rosto.
Aproveitando a ocasião, Bytes o leva novamente. Desesperado Treves vai atrás do
porteiro, que afirma não saber do paradeiro de Merrick. Voltando a viver sob
condições indigentes, Merrick um dia é posto na mesma jaula em que encontram-se
os macacos. Condoídos com sua sorte, um grupo de artistas circenses o liberta.
Quando chega na estação ferroviária londrina, é assediado por crianças e, na pressa da fuga, pisoteia uma garota. Perseguido por uma
pequena multidão, que o desmascara, Merrick é salvo pela polícia, que o leva de
volta aos cuidados de Treves. Merrick tem seu dia de glória quando vai ao
teatro pela primeira vez, e Kendal dedica a apresentação a ele, sendo
ovacionado pela platéia. No final da noite, após despedir-se de Treves, prepara
o leito para dormir.
Lynch,
em seu melhor filme, consegue ir além do cinismo, ironia e humor negro
habituais e narrar uma história tocante, sem pieguice. Muito da força do filme
advém justamente da recusa aos excessos, seja na caracterização da atmosfera da
Londres vitoriana (bem diversa dos dramas hollywoodianos dos anos 30 e 40), na
fotografia em p&b de Francis, na utilização parcimoniosa da trilha-sonora ou
na interpretação dos atores. Entre os momentos memoráveis se encontram a
seqüência do teatro e a que, acuado na estação ferroviária, Merrick reivindica
sua dignidade de ser humano. Mesmo que em termos formais o filme, extremamente
realista, distancie-se do Kaspar Hauser,
de Herzog, não há como não traçar paralelos entre momentos diversos das
trajetórias desses dois párias sociais que foram motivo de atenção das
sociedades de suas épocas. O mesmo pesar que sentimos quando observamos a
tristeza de Kaspar por terem pisado na horta que fizera na forma de seu próprio
nome, é sentido quando observamos os destroços da miniatura de catedral que
estava sendo construída por Merrick. Por outro lado, em certos momentos, como a
bela seqüência final, que se desenrola sobre os acordes do não menos belo Adágio para Cordas, de Barber, em que
Merrick prepara-se para dormir, não há como não evocar a influência do
expressionismo alemão, sobretudo a forte melancolia existencial do Nosferatu (1922), de Murnau,
aproximando-se mais, nesse momento, do clássico alemão que a refilmagem de
Herzog. Da mesma forma que Nosferatu se angustia com a impossibilidade da
morte, Merrick sente o mesmo com relação a sua deformidade física. Alguns
momentos, no entanto, pecam por seu tom hiperbólico, como o da crise de
consciência de Treves, após o alerta da enfermeira-chefe. Produzido por Mel Brooks, como presente à própria mulher, Bancroft. Esta versão contém 3 minutos a menos que a original americana. Brooksfilm
para a Paramount.122 minutos.
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