The Film Handbook#138: Paul Schrader



Paul Schrader
Nascimento: 22/07/1946, Grand Rapids, Michigan, EU
Carreira (como diretor): 1978-

Os filmes de Paul Schrader são marcados por uma tensão esquizofrênica: tematicamente, encontram-se entre a repressão e a indulgência, o espiritual e o carnal; estilisticamente, entre a arte e o entretenimento. De fato, poucos diretores americanos tem produzido um corpo de trabalho tão obsessivo e pessoal.

De forma crucial, em relação ao posterior desenvolvimento de sua carreira, Schrader recebeu uma formação estritamente calvinista e somente assistiu seu primeiro filme com dezoito anos. Fascinado pelo cinema, que havia sido condenado pelos calvinistas como demasiado manchado pela "mundanidade", tornou-se um crítico de cinema, frequentando uma escola de cinema e, por fim, ingressando na indústria enquanto roteirista, seus créditos incluindo Operação Yakuza/The Yakuza (para Sidney Pollack), Trágica Obsessão/Obsession (para De Palma) e, o mais bem sucedido de todos, Taxi Driver, para Scorsese. Por volta de 1977 sua reputação já era suficiente para dirigir Vivendo na Corda Bamba/Blue Collar>1 de seu próprio esquemático, mas inteligente, roteiro, no qual três pequenos ladrões de carros roubam fundos da União apenas para descobrir que a própria União é corrupta e vinculada à Máfia; mesmo que sendo basicamente uma peça de gênero, o filme foi notável por sua visão corajosamente não sentimental da vida operária e por sua tentativa de mesclar melodrama com política. Ainda mais ambicioso, mesmo que amplamente negligenciado, foi Hardcore - No Submundo do Sexo/Hardcore>2. Uma angustiante a admitidamente exagerada história de um equilibrado e profundamente religioso americano médio que abandona sua pacata cidade natal no Michigan para procurar por sua filha desaparecida numa desprezível Los Angeles, sendo o filme claramente marcado não apenas pela ambivalência emocional de seu próprio realizador, mas por ser uma alegoria noir efetiva da inocência se encaminhando para o inferno. De forma significativa, o pecado é mais acentuadamente evocado pela realização de filmes pornográficos, a divisa tênue entre o puritanismo e a sensualidade, ódio e vingança moral pelos papéis de parede cor de sangue de um prostíbulo.

Se Hardcore foi prejudicado pela histeria, O Gigolô Americano/American Gigolo>3 foi uma história estranhamente fria sobre um gigolô de luxo aprisionado a um caso policial envolvendo assassinato, corrupção política e adultério. Schrader bebeu explicitamente no Pickpocket de Bresson para sugerir  a redenção final de seu herói, através do amor; infelizmente, a ênfase em um estilo berrante e a postura vazia dos atores atenuaram seu sentido. Da mesma forma, uma refilmagem de Sangue de Pantera/Cat People de Tourneur (A Marca da Pantera), que transformava a visão poética e ambígua de uma sexualidade destrutiva do realizador para fins mais literais e introduzia um elemento de incesto através de um irmão igualmente amaldiçoado da heroína, sepultou sua análise da repressão e da liberação violenta das pulsões reprimidas por meio de uma ênfase em um erotismo exótico e sofisticado.

Mishima>4, no entanto, foi no todo mais intrigante, em seu tema - a relação da vida de um escritor japonês com sua obra, sua política e sua cultura que ele tanto tipificava quanto lutava contra - e estilo: o filme consistia, ambiciosamente, de três segmentos diversos, mas intercalados, apresentando a vida pregressa de Mishima em preto&branco, seus últimos dias em cores naturalistas e três de suas histórias em cenários notáveis por seu estilizado artifício. Como anteriormente, o tema foi o da batalha individual com o destino, enquanto seu tom muda de um cerebralismo contemplativo à ação violenta. A obra recente de Schrader, no entanto, foi bem menos satisfatória: Luz da Fama/Light of Day se detia sobre o abismo entre uma dissoluta cantora de rock e sua religiosa mãe, enquanto O Sequestro de Patty Hearst/Patty Hearst tentava apresentar uma visão desapaixonada de seu papel então controversos nas atividades criminosas e terroristas. Apesar de ambos os filmes serem obras de um realizador inteligente, um sofreu com sua previsibilidade melodramática  e o outro com uma aparente ausência de comprometimento moral raro na obra de Schrader.

O poder emocional bruto e ambições intelectuais que marcam os melhores filmes de Schrader ficam mal acomodados com um visual enfaticamente extravagante e caracterizações fracas de seus trabalhos menores. Porém sua seriedade de propósito e disposição de explorar sua própria ansiedade através de um meio essencialmente popular o confirmam como um diretor fascinante.

Cronologia
A influência de Bresson (que figura ao lado de Dreyer e Ozu no livro de Schrader) é clara em sua obra; ele pode ser comparado com o igualmente atormentado (católico) Scorsese para quem - desde Taxi Driver - escreveu O Touro Indomável/Ragging Bull e A Última Tentação de Cristo/The Last Tempation of Christ; escreve ocasionalmente com seu irmão Leonard.

Leituras Futuras
Transcendental Style in Film: Ozu, Bresson, Dreyer (Berkeley, 1972), de Schrader, ilumina algumas de suas preocupações.

Destaques
1. Vivendo na Corda Bamba, EUA, 1978 c/Harvey Keitel, Richard Pryor, Yaphet Kotto

2. Hardcore - No Submundo do Sexo, EUA, 1979 c/George C. Scott, Peter Boyle, Season Hubley

3. Gigolô Americano, EUA, 1979 c/Richard Gere, Lauren Hutton, Nina Van Pallandt

4. Mishima - Uma Vida em Quatro Tempos, EUA/Japão, 1985 c/Ken Ogata, Masayuki Shinoya, Junkichi Orimoto


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