Filme do Dia: Tirésia (2003), Bertrand Bonello
Tirésia
(Tiresia, França/Canadá, 2003).
Direção: Bertrand Bonello. Rot. Original: Bertrand Bonello, sob o argumento de
Luca Fazzi. Fotografia: Josée Deshaies. Música: Albin De La Simone & Laure
Markovitch. Montagem: Fabrice Rouaud. Dir. de arte: Roman Denis. Figurinos:
Dorothée Guiraud. Com: Laurent Lucas, Clara Choveaux, Thiago Teles, Célia
Catalifo, Lou Castel, Alex Descas, Fred Ulysse, Stella, Marcelo Novais Teles.
Homem obcecado pela união dos dois sexos na mesma pessoa,
Terranova (Lucas), aprisiona um transexual, Tiresia (Choveaux) em cativeiro.
Depois de alguns dias fura seus olhos e a deixa numa região abandonada. Uma
jovem, Anna (Catalifo) recolhe Tiresia e cuida dele (Teles), cujos traços se
tornam os de um homem após a ausência das habituais injeções de hormônios.
Tiresia se transforma num oráculo, descobrindo o futuro de todos os que lhe
indagam. Decidido a abandonar a antiga vida, Tiresia sente-se bem em seu novo
ambiente. Padre François (Lucas), pároco da província, acha que seu dom
premonitório vai contra às leis da natureza e o acaba matando.
Essa terceira produção franco-canadense de Bonello,
construída com todas as pretensões de se transformar num cult, sofre do mal do cinema falsamente profundo, característica
bastante comum na produção francesa contemporânea. Vão nesse sentido as imagens
de larva vulcânica que abrem e fecham o filme, o tema musical de Beethoven e as
interpretações despojadas de sentimentalismo, para não falar de toda uma
discussão ética subliminar que procura se filiar na linha de cineastas como
Robert Bresson ou Maurice Pialat ou mesmo a interpretação de um casal de atores
para representar o personagem-título. O resultado final, no entanto, soa
grandemente oco e empostado e com laivos de um tom reacionário implícito –
afinal, o que o filme parece sugerir é que o maníaco acabou fazendo um bem a
Tiresia ao lhe tirar a visão, pois só assim ele/ela descobriu uma vida outra
que a da decadência completa no travestismo e prostituição, para não comentar a
escolha de uma mulher para representar um travesti. Curiosamente se trata, como
Orfeu do Carnaval (1959) de Marcel
Camus, de uma adaptação da mitologia grega
ao mundo contemporâneo e com referências à cultura brasileira – ainda
que aqui, ainda de modo mais superficial que no filme de Camus, servindo o
português e a canção Teresinha de Jesus
como temperos exóticos para acentuarem
ainda mais a aura de densidade que o filme persegue sem maior sucesso e o
personagem-título se transformando num transexual brasileiro, característica
bastante comum no mercado do sexo parisiense. Inclui também pitadas de
voyeurismo com relação ao sexo e violência, mesmo que longe de ser apenas uma
exploração de ambos como o contemporâneo Irreversível
(2002), de Gaspar Noé. Detalhe para a bem realizada composição da volta dos
traços masculinos à figura de Tiresia e a representação física de seu
transexualismo. Canal +/CNC/Haut et Court/Le Studio Canal +/MEDIA Programme of the
European Union/MJBC Foundation/Ministry of Culture and Communications/Ministére
de la Culture de la Republique Française/Procirep/SODEC/Téléfilm Canada/arte
France Cinéma/micro_Scope Media. 116
minutos.
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