Filme do Dia: A Culpa dos Pais (1944), Vittorio De Sica
A Culpa dos Pais (I
Bambini ci Guardano, Itália, 1944). Direção: Vittorio De Sica. Rot.
Adaptado: Cesare Giulio Viola, Margherita Maglione, Cesare Zavattini, Adolfo
Franci & Vittorio De Sica, baseado no romance Pricó, de Viola. Fotografia: Guiseppe Caracciolo & Romolo
Garroni. Música: Renzo Rossellini. Montagem: Mario Bonotti. Dir. de arte:
Amleto Bonetti & Vittorio Valentini. Cenografia: Guido Fiorini &
Gastone Medin. Com: Emilio Cigoli, Luciano de Ambrosis, Isa Pola, Adriano
Rimoldi, Giovanna Cigoli, Jone Frigerio, Maria Gardena, Dina Perbellini.
Pricó (Ambrosis) é um garoto de
quatro anos negligenciado tanto por sua mãe Nina (Pola), quanto por seu pai,
Andrea (Cigoli). Quando Nina parte com o amante, Roberto (Rimoldi), Andrea leva
o garoto para casa de parentes, tentando evitar os boatos. Nina retorna após
algum tempo e, depois de uma rejeição inicial, conta com a simpatia de
Andrea. Porém, surpreende Nina sendo
maltratada por Roberto e, ele próprio, sofre violência quando tenta defendê-la.
A família parte para a Riviera italiana. Andrea, no entanto, tem que retornar
mais cedo. Nina volta a encontrar Roberto e se esquece completamente de Pricó,
que tenta sem sucesso voltar para a casa do pai, permanecendo desaparecido por
três dias. A polícia o encontra e leva para Nina, que ao retornar a Roma,
deixa-o com a governanta (Cigoli), que se dispõe a cuidar dele. A decisão do
pai, no entanto, é de levá-lo a um internato católico. Pouco tempo depois o pai
é assassinado, e quando Nina vai visitá-lo, esse mesmo emocionado, não
demonstra qualquer interesse em voltar a viver com ela.
Muitos dos elementos que seriam
depurados posteriormente no clássico Ladrões de Bicicleta (1948), já se encontram presentes aqui. Não se pode dizer
propriamente que o talento de De Sica esteja a reboque do excelente parceiro
roteirista que foi Zavattini, talvez o mais articulado dos homens que
representou o Neo-Realismo, enquanto uma de suas figuras de destaque. Ele se
encontra aqui em momentos isolados, como na bem construída seqüência que evoca
os temores do garoto através de sobreposições de imagens – recurso nada novo, é
fato, mas utilizado de modo bastante plástico aqui – ou na corrida solitária do
garoto pela praia à noite tendo o brilho da lua sobre o mar ao fundo e ainda na
bela cena final, aonde a profundidade de campo busca visivelmente acentuar a
sensação de ruptura afetiva. De todo modo, mesmo o filme não fazendo propaganda
apologética do regime, tal como a trilogia das “forças armadas” de Rossellini o
faria ao menos em trechos, contemporaneamente (foi filmado em 1942), o filme
não apenas apresenta uma estrutura narrativa bem mais ortodoxa do que aqueles
que compõem a trilogia, como igualmente
uma implacável visão moral que seria persistente na colaboração da dupla
Zavattini-De Sica em seus dramas neo-realistas, algo que não passaria
despercebido dos distribuidores brasileiros, explicitando-o de vez. Sem dúvida,
o filme parece sempre fazer eco aos comentários moralmente indignados de todos
aqueles que observam a negligência da mãe para com seu filho, como a pequena
multidão que é abordada pelos policiais quando trazem a criança de volta para o
hotel onde se encontra aquela se encontra. Essa parece ser sempre a máscara da
displicência. Ela não odeia ou maltrata o filho, e até mesmo chega a
defendê-lo, mas pensa antes de tudo em si própria e em seus prazeres. E a forma
relativamente fria com que reage a afetividade do filho em muitos momentos do
filme, inclusive em sua rejeição final, ainda que possa sugerir um
distanciamento emocional evocativo do cinema moderno, encontra-se mais próximo
da perspectiva moral que engloba todo o filme. Não há duvida do porque De Sica
ter sido, ao menos em termos numéricos, mais influente na história do cinema do
que Rossellini. Esse filme já apresenta suas forças e fraquezas (as mesmas, a
depender do ponto de vista ou proposição estético-moral-narrativa) e filmes
relativamente recentes e de grande destaque internacional, como Central do Brasil (1998), atestam a
força duradoura que conjuga melodrama e problema social apresentados com
talento visual. Mastroianni foi um dos anônimos figurantes, enquanto o então
garoto Ambrosis, após participar de uma meia-dúzia de produções até 1950,
raramente seria visto desde então. Invicta Film/Scalera Film S.p.a para Scalera
Film S.p.a. 84 minutos.
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