Filme do Dia: Mutum (2007), Sandra Kogut

Mutum (Brasil, 2007). Direção: Sandra Kogut. Rot. Adaptado: Ana Luiza Martins Costa & Sandra Kogut, baseado no romance Campo Geral, de João Guimarães Rosa. Fotografia: Mauro Pinheiro Jr. Montagem: Sérgio Mekler. Dir. de arte: Marcos Pedroso. Cenografia: Déia Brito. Com: Thiago da Silva Mariz, Wallison Felipe Leal Barros, Maria Juliana Souza de Oliveira, Brenda Luana Rodrigues Lima, João Vítor Leal Barroso, Izadora Fernandes, Rômulo Braga, Paula Regina Sampaio da Silva.
No rústico sertão mineiro, o garoto Thiago (Mariz), deve lidar desde cedo com várias adversidades. Primeiro, a violência contra sua mãe (Fernandes)  perpetrada pelo próprio pai (João Miguel), por conta do romance dela com o tio (Braga) de Thiago. Depois, a súbita morte do irmão e companheiro Felipe (Barros) e a fuga do pai, após ter cometido um assassinato. Por fim, a partida com um médico que pretende adotá-lo. Para não falar da constante perseguição do pai a ele, por achá-lo por demais sensível e com pretensões maiores que as cabíveis no ambiente no qual viviam.
Kogut realizou um sensível drama de uma precoce iniciação ao mundo adulto, no qual o relativo distanciamento com que tudo é narrado, sem apelos excessivos e mesmo trilha musical e a ênfase em um ritmo narrativo bastante próprio amortecem qualquer possibilidade de pieguice na sua opção pela perspectiva do olhar infantil. Tampouco se torna problemático o seu relativo descolamento de um período histórico preciso – mesmo que o sertão apresentado seja contemporâneo, permanece grandemente devedor do original de Rosa, já que utiliza com parcimônia de elementos que denotam essa contemporaneidade como o dinheiro ou uma garrafa térmica plástica, afastando-se corretamente de uma busca de descrição realista de maior hibridismo, como a presença da televisão.  Suas estratégias narrativas encontram pontos de contato com filmes tais como Cinema, Aspirinas e Urubus e O Grão, buscando igualmente uma reflexão de matizes fortemente existenciais para o ambiente sertanejo. Ao contrário dos outros dois, no entanto, não se furta em tematizar aspectos mais convencionalmente dramáticos como morte e separação (aqui evocativa de situação semelhante vivenciada pelo protagonista de Cidadão Kane), com grande maestria, em boa parte devido a um via de regra bem sucedido treinamento com um elenco predominantemente amador e oriundo da própria região. Mesmo que a comparação com O Grão renda outras similaridades inequívocas, como o fato de ambas se tratarem de narrativas sob a perspectiva infantil e trabalharem com boa parte de elenco não profissional, aqui a dimensão subjetiva do protagonista mirim demonstra ser mais forte e centrada  que no filme de Petrus Cariry. E o processo de identificação com os personagens, devido a utilização de situações dramáticas de maior apelo emocional, como o tema da separação, mais facilmente articulado. Estréia de Kogut, até então mais conhecida por seu documentário Um Passaporte Húngaro (2001), em longa-metragem ficcional.  Ravina Filmes/Gloria Filmes. 95 minutos.


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