Filme do Dia: A Lagoa Azul (1980), Randall Kleiser
A Lagoa Azul (The Blue Lagoon, EUA, 1980). Direção Randall Kleiser. Rot. Adaptado Douglas Day
Stewart, a partir do romance de Henry De Vere Stacpole. Fotografia Nestor
Almendros. Música Basil Poledouris. Montagem Robert Gordon. Dir. de arte John
Dowding. Figurinos Jean-Pierre Dorléac. Com Brooke Shields,
Christopher Atkins, Leo McKern, William Daniels, Elva Josephson, Glen Kohan,
Alan Hopgood, Gus Mercurio.
Duas
crianças, Emmeline (Josephson) e Richard (Atkins) sobrevivem ao naufrágio do
barco no qual viajam, e percorrem o oceano com um escaler comandado por um
membro da tripulação, Paddy (McKern). Esse morre pouco tempo depois, em
circunstâncias misteriosas, investigando uma outra área próxima. As crianças
agora terão que sobreviver sozinhas e, quando maiores (Atkins e Shields)
descobrem instintivamente o sexo, desse surgindo uma criança, criada como
Paddy. Richard, explorando o outro lado da ilha que Paddy havia alertado para
não irem, descobre uma tribo de nativos selvagens sacrificando um de seus membros.
Talvez
apenas duas expectativas possam mobilizar alguém de seguir adiante nessa
terceira adaptação do romance, motivo
geralmente tão esquecido esse de existir essa duas outras conversões às imagens
em movimento de título homônimo em 1949, quanto a própria obscura produção em
si, enquanto a de 1923 é tida como desaparecida. A primeira, provavelmente
motivadora sobretudo à época de seu lançamento, a promessa de nudez de seus
jovens atores. A segunda, alheia ao erotismo adolescente sinalizado que gerou
um boca-a-boca em relação à terceira, porém mais duradoura é a fotografia assinada pelo mestre
Almendros -que faz questão de evocar um passado mais feliz, em sua colaboração
com Malick, nos closes de pequenos animais, como uma aranha se movendo em sua
teia ou uma centopeia abaixo da água, um lagarto, um casal de cegonhas, e tantos outros mais. A volta a temas e
títulos do passado, aliás, passou a ser um infortúnio crescente no cinema
hollywoodiano da década, com resultados sempre piorados. E à subserviência ao
sensacionalismo associado a nudez de seus jovens (e péssimos, por sinal)
protagonistas bate para escanteio qualquer tentativa de verossimilitude
eventualmente sentido como um prurido na retomada de adaptações anteriores.
Eles se tornam uma dupla encarnação ao modo Tarzan-Jane que conseguem vencer o
vácuo civilizatório de base precária esgotada, inclusive, com a morte de seu
tutor involuntário. Para que, inclusive, o espectador que o assistia quando de
seu lançamento pudesse se lançar a essa fantasia sem maiores impedimentos. Do tipo o que você levaria ou como agiria em
uma ilha deserta. E também projeções mais concretas, como a de ter um filho
produzido pelo sexo adolescente e a inexperiência – alimentá-lo com o que? E
outras que são quase um escárnio à inteligência do espectador, como o elaborado
forte de areia que Emmeline constrói para o filho, ao qual não falta sequer uma
rota bandeirola americana. A referência à tribo selvagem provavelmente
permaneceu intacta de suas versões anteriores, caso tenham feito uso, o que é
mais que provável. E também cabe o que
seria de bom tom explorar então em termos de cada sexo. Ao garoto, a
masturbação. A garota, a menstruação. Construído sob o signo da hipocrisia, o
filme aproveita-se de uma época em que os códigos não estavam tão restritivos
para vender sob a puritana bandeira do “amor natural”, erotismo – e o faz por
dezenas de minutos a fio, com uma atriz de 14 anos mesmo que se fazendo uso de
uma dublê de corpo, no idílio
pré-nascimento do garoto que, uma vez mais mimetizando o padrão ocidental
típico, torna-se praticamente assexuado após o nascimento do filho. Embora tenha
transformado Shields em personalidade conhecida, não necessariamente motivou
uma carreira promissora. E Atkins, nada muito distante do visual de um surfista
da época em que o filme foi produzido, mesmo com os atributos dramáticos tão
modestos se encontraria na ativa, como Shields, no momento da escrita desta
resenha, na indústria cinematográfica. Embora quatro anos mais jovem, não se
tratava exatamente de uma estreia no caso dela, que já havia trabalhado,
inclusive, com um realizador de prestígio como Malle (em Menina Bonita).
E além da alusão mais próxima e mundana ao célebre personagem de Bouroughs, há
a óbvia referência edênica, aqui salpicada de laivos incestuosos.|Columbia
Pictures. 104 minutos.

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