O Dicionário Biográfico de Cinema#251: Lon Chaney



Lon Chaney (Alonso Chaney) (1883-1930), n. Colorado Springs, Colorado

Chaney possui a doçura, a lentidão silenciosa de um mágico no momento de revelar uma transformação, para evitar qualquer indício de truque e deixar tudo a cargo da imaginação poética. Não há um intérprete da tela que ilustre tanto o fascínio das plateias pela promessa e ameaça de metamorfose. Por que vamos ao cinema, sentar-nos no escuro diante de fantasias opressivas que parecem reais? Para participar destes movimentos plásticos, para mudar nossas próprias vidas, e para encorajar uma noção profundamente espiritual de nossa identidade flexível. A esperança cresce no exercício da fantasia. O cinema tem sempre dependido do momento que a criação nas telas e o espectador começam a participar um do outro. Quem incorpora este potencial melhor que o ator conhecido como "o homem das mil faces"? Esta descrição é não apenas a ostentação de uma caixa de maquiagem versátil, mas um dos convites mais atraentes ao público. Para o homem no cinema com a constante mudança do rosto do espectador. A aparência oscilante de Chaney estrepitava com a luxúria do público pelo vicário.

Os fatos de sua própria vida são decisivos como os eventos de um roteiro: parecem factualmente improváveis, mas imaginativamente inevitáveis. Foi criança de pais surdos-mudos. Quando Alonso tinha nove anos, sua mãe se tornou inválida pelo reumatismo. Inerte, inaudível e incapaz de responder, foi a primeira e trágica representação do público cinematográfico que Chaney teria. A história vai adiante com ele mimetizando experiências vividas por ele próprio para diverti-la. Talvez pareça mais próximo do sentimento retrospectivo da máquina publicitária que de uma verdadeira vida em família. Pode ser também um signo da descoberta de Chaney da verdade imaginativa em sua própria vida. Os fatos de sua obra nas telas evidenciam ser um supremo pantomista. Mas ele sujeitou sua mãe às mímicas do sofrimento e do horror? Isto, uma vez mais, parece improvável, mesmo que a situação dela o tornasse consciente do sofrimento da vida, assim como criasse um anseio por uma cura ou transformação milagrosas. 

Tornou-se um artista mambembe e, em 1912, dirigiu-se, falido, para Los Angelos e os estúdos Universal.  Já carregava uma caixa de maquiagem e gostava de se disfarçar, fazer piadas com narizes falsos e entrar e sair de personagens grotescos. Allan Dwan interpretou isto como uma busca por trabalho e começou a usar Chaney como vilão exótico. Sua virtuosidade com a maquiagem frequentemente possibilitou-o interpretar diversos papéis em um mesmo filme. De 1913 a 1917 fez mais de setenta filmes, de dois a cinco rolos, na Universal. Os diretores com os quais trabalhou incluíam Dwan - Back to Life (13); Red Margaret - Moonshiner (13); The Lie (13); Discord and Harmony (13); The Embezzler (13); The Tragedy of Whispering Creek (14); The Forbbiden Room (14); mais frequentemente Joseph De Grasse - Her Bounty (14); Her Escape; The Threads of Fate (15); Maid of the Mist (15); The Stronger Mind (15); Bound on the Wheel (15); Quits (15); Grasp of Greed; The Mark of Cain (16); Place Beyond the Winds (16); e ocasionalmente, o próprio Chaney - The Stool Pigeon (15); For Cash (15); The Oyster Dredger (15); The Violin Maker (15); e The Trust (15).

Arrastou-se ao reconhecimento público como um gângster de San Francisco na época do terremoto em Hell Morgan's Girl (17, de Grasse), um melodrama no qual Chaney está apaixonado por uma garota que ama outro. Sua aspereza física leva-no a este tema do amor não correspondido, anunciando um tema maior dos filmes de horror, através do qual a frustração romântica e sexual provocam vingança misantrópica e demoníaca. A feiúra de Chaney é interpretada frequentemente como um efeito da sociedade brutal. Em Phantom of the Opera [O Fantasma da Ópera], ele afirma, "Se sou um fantasma é porque o ódio do homem me fez assim."

Nos anos seguintes, moveu-se próximo ao centro de seus próprios filmes, afirmando-se como estrela ao invés de vilão. Isto, por si só, foi uma inovação; o modo no qual o estrelato de Chaney foi tão aliado à mutação foi mais uma novidade. Realizou A Doll's House (17, de Grasse); e foi von Tirpitz em The Kaiser, the Beast of Berlin (18, Rupert Julian); foi encorajado por William S. Hart em Riddle Gawne (18, Lambert Hillyer); e então encontrou Tod Browning, que lhe deu um papel em The Wicked Darling (19). A Universal foi hostil aos seus pedidos por mais dinheiro e Chaney foi então a Paramount para seu primeiro estudo em ilusão: o falso aleijado de The Miracle Man (19, George Loane Tucker). Enquanto esteve por lá, fez dois filmes com Maurice Tourneur: Victory (19) e Treasure Island (20), no qual interpretava George Merry e Blind Pew. Voltou então à Universal para Outside the Law [Fora da Lei] (21, Browning), no qual tem dois papéis - um gangster e um chinês - e no qual o chinês por fim atira contra o gangster. Nitidamente, o seu potencial Jekyll e Hyde dentro da metamofose estava se evidenciando. 

Depois The Light in the Dark (22, Clarence Brown); Fagin em Oliver Twist (22, Frank Lloyd); All the Brothers Were Valiant (23, Irvin S. Willat); While Paris Sleeps (23, mas na verdade filmado em 1920, Tourneur); e The Shock (23, Hillyer); interpretou Quasímodo em The Hunchback of Notre Dame [O Corcunda de Notre Dame] (23, Wallace Worsley), uma extraordinária imersão na deformidade e um grande sucesso de bilheteria.

Chaney agora era um astro maior, disputado pela Universal e MGM. Irving Thalberg admirava-o na Universal e eventualmente o ganharia para a MGM. A obra de Chaney de meados ao final dos anos 20 hoje é raramente vista. É, no entanto, certamente um dos grandes artistas de imaginação nos anos do cinema silencioso, indubitavelmente mais estimulado por Tod Browning, mas atrativo em todas as circunstâncias: The Next Corner [Desonra Honesta] (24, Sam Wood); He Who Gets Slapped [Ironia da Sorte] (24, Victor Sjöström), um drama mais convencional, sobre um cientista que se torna palhaço de circo quando sua esposa o abandona; The Monster [O Monstro] (25, Roland West); o muito assustador The Unholy Three [A Trindade Maldita] (25, Browning), no qual é um escroque que se traveste como velha senhora; The Phantom of the Opera [O Fantasma da Ópera] (25, Rupert Julian), um verdadeiro clássico contendo uma das grandes cenas de descoberta horroríficas, na qual Chaney se movimenta com impressionante langor, como se conhecesse o Conrad Veidt de Caligari; outro drama de Sjöström, The Tower of Lies [Castelos de Ilusões] (25); The Blackbird [O Falcão Negro] (26, Browning), sobre um homem que se faz passar por dois irmãos; The Road to Mandalay [Tirano e Mártir] (26, Browning), como um escroque zarolho; um papel "normal" como o sargento em Tell It to the Marines [Os Fuzileiros] (26, George W. Hill); Mr. Wu [O Mandarim] (27, William Nigh); como Alonzo, o maneta em The Unknown [O Monstro do Circo] (27, Browning); Mockery [Nobreza] (27, Benjamin Christensen), outra história de fingimento; soberbo como o detetive e vampiro em London After Midnight [Vampiros da Meia Noite] (27, Browning); The Big City Sleeps [Piratas Modernos] (28, Jack Conway); West of Zanzibar [No Oeste de Zanzibar] (28, Browning); Laugh, Clown, Laugh [Ridi, Pagliacci!] (28, Herbert Brenon); Where East is East [Sedução] (29, Browning); Thunder [O Trovão] (29, Nigh); e seu último filme e primeiro talkie, uma refilmagem de The Unholy Three [Trindade Maldita] (30, Conway). Sua voz neste é tão variada quanto sua aparência, mas teve um câncer de garganta e morreu em poucos meses. Somente quarenta e quatro anos (*), ele fez mais de 140. Iria interpretar Drácula para Browning, papel que foi para Bela Lugosi. E é talvez o segredo de sua qualidade  éque Chaney poderia ter interpretado a maior parte dos papéis tanto de Lugosi quanto de Karloff. Ele havia estabelecido a base do horror. Ninguém superou a sua convicção.

Texto: Thomson, David. The New Biographical Dictionary of Film. N. York: Alfred A. Knopf, 2014, pp. 447-52. 

N.do E-T.: uma referência bem mais provável à idade que outra (como a de filmes sobreviventes) e equívoca, como o próprio Thomson demonstra nas datas que aponta entre o nascimento e a morte do ator e o IMDB corrobora, como tendo morrido aos 47 anos. 

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