Filme do Dia: Enquanto Durou o Nosso Amor (1966), Florestano Vancini

 


Enquanto Durou o Nosso Amor ( Le Stagione del Nostro Amore, Itália, 1966). Direção: Florestano Vancini.  Rot. Original: Elio Bartolini & Florestano Vancini. Fotografia: Dario di Palma. Música: Carlo Rustichelli. Com: Enrico Maria Salerno, Anouk Aimée, Jacqueline Sassard, Gastone Moschin, Valeria Valeri, Gian Maria Volonté, Massimo Giuliani, Pietro Tordi.

Vittorio (Salerno) é um jornalista de meia-idade desesperançado e sem expectativas para o futuro, após o final de seu relacionamento com a jovem Elena (Sassard) e sem mais sentir nada pela esposa (Valeri). Vittorio visita a sua cidade de nascimento, Mantua, após muito tempo sem por lá andar. Reencontra pessoas que fizeram parte do seu passado, como Tancredi, apelido de Carlo di Giusti (Moschin), hoje vigilante, Leonardo Varzi, que quando criança (Giuliani) fora expulso da casa do pai de um colega deles, por citar Matteotti, o líder político socialista morto pelos fascistas nos idos da década de 20 e hoje (Volonté) um homem amargo e desesperado, que chama sua mulher de puta. E também a charmosa Francesca (Aimée),  uma paixão de sua juventude cujo reencontro tampouco é pacífico de ambos os lados.

Se a Nouvelle Vague e o cinema de Antonioni se insinuava de forma discreta no mais interessante A Noite do Massacre (1960), assim como se fazia menção a um episódio de grande peso histórico, o massacre a sangue-frio, aqui por muitas vezes se resvala para longas (e aborrecidas) cenas de diálogos  que verbalizam a impossibilidade do protagonista continuar o relacionamento com sua jovem amante. Se a esterilidade da vida moderna contraposta aos “verdes anos” da juventude, observadas com bem maior vividez se tornou um lugar-comum em dramas envolvendo as “ilusões perdidas” da maturidade (como é o caso, no Brasil, do contemporâneo O Desafio) não há como negar a integridade com que Vancini apresenta o vazio existencial de Vittorio (vivido pelo mesmo Salerno que era o perfil que mais  se aproximava de algo do tipo no filme anterior) sem propor qualquer saída ou catarse reparadora – aquela vivenciada pelo personagem próxima do final, em que chora e perturba um grupo de jovens que se diverte em nada parece amenizar sua situação ou apontar solução; aliás essa cena parece algo paradigmática de uma revolta que implica tanto uma inveja do vigor e entusiasmo juvenis quanto uma ira em relação a falta de vínculos e permissividade fácil dessa em relação à geração de seus pais, considerada mais “autêntica”. A geração ou a própria época, pois ele próprio, enquanto jovem, participou de reuniões de “conscientização” da população camponesa que salvaria dois de seus companheiros de também se transformarem no que ele e seus contemporâneos se tornaram, sua compreensão em relação a morte de ambos, sintomaticamente menos valorizada pela narrativa que a de um velho que conhecera seu pai e que descreve a cena em que o mesmo fizera ouvidos de mercador aos pedidos da milícia fascista para que cantasse La Giovinezza, o hino do Partido Fascista. Como na produção anterior, e aqui evidentemente ainda mais ressaltado por conta do momento histórico e do estado de espírito de seu personagem, é comum Vancini destacar a melancolia solitária destes contra a “imensidão do mundo”, indiferente a mesma, seja as árvores a perder de vista enquanto Anna permanece sozinha em um banco ou o atormentado Vittorio e paisagens anônimas como pontes repletas de carros ou postos de gasolina à noite. Do mesmo modo, a utilização constante da voz over representando o pensamento do personagem assim como os referidos diálogos entre os amantes tornam o filme bem mais intismista que o anterior, de quem sabíamos da posição de Pino apenas por suas explosões solitárias de revolta impotente.  Deve-se ter em conta que retratos de melancolia e sofrimento existencial povoavam as telas italianas a mais de meia década, dos filmes de Antonioni passando pela visão festivo-apocaliptíca de A Doce Vida de Fellini e chegando A Primeira Noite de Tranquilidade de Zurlini (ou, ampliando o escopo, A Grande Beleza de Sorrentino), sendo o último mais próximo de Vancini que qualquer um dos outros. Vancini abordaria o caso Matteoti, aqui apenas referido em seu O Delito Matteoti (1973). Ga.Va. Film. 93 minutos.

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