Filme do Dia: Sargento Getúlio (1983), Hermano Penna

 



Sargento Getúlio (Brasil, 1983). Direção: Hermano Penna. Rot. Adaptado: Hermano Penna & Flávio Porto, baseado no romance de João Ubaldo Ribeiro. Fotografia: Walter Carvalho. Montagem: Laércio Silva. Música: José Luiz Penna. Figurinos: Percival Rorato.  Com: Lima Duarte, Orlando Vieira, Inez Maciel, Flávio Portho, Fernando Bezerra, Antônio Leite, Amaral Cavalcanti, Marieta Fontes.

No sertão nordestino, década de 40, Sargento Getúlio (Duarte) é um “cabra” sempre disposto a cumprir as ordens do patrão. No caso em questão, trata-se de dar um fim em um oposicionista importuno ao coronel. Junto com ele e a vítima encontra-se o motorista (Vieira). Porém a série de sevícias que realiza acaba sendo comprometida após ordens de que o homem deve ser levado com vida de Paulo Afonso à Aracuju. O alívio do infeliz encontra-se ainda longe de ocorrer, no sentido de que Getúlio irá fazer de tudo para espezinhá-lo, desde rebocá-lo a pé com o carro até arrancar dois dentes seus sem anestesia. Após uma tentativa de relacionar-se sexualmente com uma jovem que encontra na fazenda em que se hospedam, quase também perde os testículos. Getúlio defende com unhas e dentes sua presa e à ameaça de uma milícia federal que veio recuperar o prisioneiro, reage animalescamente, cortanto a cabeça do tenente. Mais adiante encontra guarida na casa de um padre (Portho), onde recebe emissários do coronel para que solte o homem. Após um momento de conflito e indecisão, decide cumprir sua sina por bem ou mal. Como o carro falha, vai a Aracaju à pé. Encontra mais adiante um velho amor (Maciel) e resiste a uma nova investida de tropas federais, embora o amigo motorista que era praticamente a única referência de afetividade em sua vida, não resiste. Destemido e persistente, amarra sua presa e espera um novo destacamento militar que aproxima-se.

Essa adaptação de romance de João Ubaldo Ribeiro peca pela excessiva obviedade com que pretende delimitar a transição do tradicional coronelismo para uma prática política aparentemente menos violenta já a partir da escolha do protagonista, interpretado por Duarte, reproduzindo caricatamente todos os tiques de personagens semelhantes que representou na televisão. A crise existencial que assoma ao personagem no momento em que se hospeda com o padre soa, mesmo para um filme sem maiores pretensões de realismo, excessivamente intelectualizada e inverossímil. Seu sentimento de atordoamento quando a ética sobre a qual construiu sua personalidade começa a desmorar não necessitava ser expresso em palavras, de já tão enfatizado ao longo da narrativa. Num filme de fraca direção de atores, a interpretação de Portho, como um padre de sotaque e trejeitos que mais lembram as praias cariocas nos anos 80, é particularmente comprometedora, salvando-se a menos carregada atuação de Vieira. Não menos problemática é a forma irresponsavelmente superficial com que heroiciza Getúlio. A autocondescendência e os clichês com que os temas regionais são tradicionalmente tratados encontra-se a anos-luz, guardadas as devidas proporções, de realizações como Vidas Secas (1963) de Nélson Pereira dos Santos ou Deus e o Diabo na Terra do Sol (1964), de Gláuber Rocha e mesmo de produções menos ambiciosas e de menor orçamento como Tigipió (1987), de Pedro Jorge de Castro, também centrado em uma questão de honra masculina.

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