Filme do Dia: No Calor da Noite (1967), Norman Jewinson
No Calor da Noite (In the Heat of
the Night, EUA, 1967). Direção: Norman Jewinson. Rot.
Adaptado: Stirling Silliphant, a partir do livro de John Ball. Fotografia:
Haskell Wexler. Música: Quincy Jones. Montagem: Hal Ashby. Dir. de arte: Paul
Groesse. Cenografia: Robert Priestley. Figurinos: Alan Levine. Com: Sidney Poitier, Rod
Steiger, Warren Oates, Lee Grant, Larry Gates, James Patterson, William
Schallert, Beah Richards, Peter Withney, Scott Wilson.
Virgil Tibbs
(Poitier) é um policial confundido com assassino de uma importante figura, o
industrial Phillip Colbert, para os negócios de uma diminuta cidade do sul dos
Estados Unidos. Ele acaba contando com a ajuda do policial Gillespie (Steiger),
que inicialmente o hostilizara, para desvendar o crime, contando com uma
perícia técnica ao tratar dos assassinatos que ninguém da cidade possui. A
polícia encontra um fácil suspeito para incriminar, Harvey (Wilson) que havia
assaltado o cadáver. Tibbs desconstrói rapidamente as acusações. Faz o mesmo
com o assessor do xerife, Sam Woods (Oates) e tem como principal alvo a mais
importante figura local até a chegada de Colbert, Eric Endicott (Gates),
latifundiário racista e prepotente. Porém, tampouco ele é o assassino. Mesmo
com todas as intimidações para que não permaneça na cidade e correndo risco de
vida, Tibbs encontra o verdadeiro assassino.
Pode-se entender
a sobrevalorização que esse filme teve a época de seu lançamento nos Estados
Unidos. Tratava-se de um momento-chave na história americana em que os direitos
civis dos negros estavam sendo conquistados. Uma cena que deve ter causado
enorme impacto na época para o público norte-americano é a que Tibbs revida o tapa desferido pelo
poderoso Eric Endicott. Ou seja, um negro revidando à altura a tentativa de
humilhação que lhe pretende impor um branco. Porém, talvez seja menos fácil de
entender essa sobrevalorização ainda hoje, mais de quatro décadas após seu
lançamento. De fato, o filme apresenta o mesmo jargão do herói liberal que se
impõe contra uma sociedade ainda marcada por pusilânimes preconceitos que desde
os anos 1950 havia sido a tônica da produção mais associada com uma visão
progressista nos Estados Unidos. Porém, mesmo quando comparado com outras
produções que ganharam proeminência com um discurso ideológico semelhante, tal
como O Sol é para Todos (1962), de
Robert Mulligan ou, para ficar num exemplo mais próximo, o bem menos valorizado
e contemporâneo Caçada Humana
(1966), de Arthur Penn, o resultado final soa menos interessante aqui. Ainda
que o delegado que protagoniza o último filme citado também possua uma índole
inquebrantável, ele parece mais humano que o Tibbs de Poitier, então no auge de
sua carreira, assim como de seu engajamento na luta anti-racista. Virgil Tibbs
parece uma máscara impassível da certeza de suas ações. Ele chega a se enganar,
apenas para não acusarem o personagem de um dom sobrehumano, como quando
direciona suas suspeitas contra Endicott, mas seu tom de paladino da certeza
moral se torna cansativo e valoriza o personagem em contraponto vivido por
Steiger, que demonstra uma maior riqueza em sua ambiguidade entre a admiração
por seu colega negro e o preconceito habitual que forja o ethos do local onde vive. Ao se centrar demasiado na questão do
racismo que rodeia Tibbs, o filme tende a transformar todos os eventos
vinculados ao assassinato e suas implicações sociais quase como um McGuiffin
hitchcockeano. Ou seja, mero pretexto. Algo que o filme de Penn, também
vinculado a um tema racial, não faz. E, para completar, os filmes de Mulligan e
Penn conseguem injetar uma maior verve emocional em suas narrativas do que o
estilo mais suave e menos violento aqui apresentado. A tensão iminente, no
entanto, também se encontra presente, mas com alguém tão seguro de si quanto
Virgil Tibbs, pouco se aposta que terá que enfrentar cenas de humilhação
explícita como a do espancamento brutal sofrido pelo personagem de Marlon Brando em Caçada Humana, o que, de
certa forma, atenua o impacto da tensão. The Mirisch Corp. para United Artists.
109 minutos.
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