Filme do Dia: Attica (2021), Traci Curry & Stanley Nelson

 


Attica (EUA, 2021). Direção Traci Curry & Stanley Nelson. Rot. Original Stanley Nelson. Fotografia Stefan Beaumont, Ryan Bronz, Kevin J. Burroughs, Ronan Killeen, Antonio Rossi & Bill Winters. Música Tom Phillips. Montagem Jaclyn Lee & Aljernon Tunsil.

No cinquentenário do episódio mais sangrento que envolveu um presídio norte-americano,  em setembro de 1971, dois longas documentais foram lançados, esse e Betrayal at Attica. Se o último tende a ficar demasiado colado em uma única voz e em fotos dos corpos massacrados até então indisponíveis ao olhar público, esse traz o tema para um formato mais padronizado de narrativa documental, com vozes de vários dos depoentes que sobreviveram, envolvidos no episódio e uma estrutura de montagem que é referendada pelos dias do conflito (tal como o contemporâneo Get Back), sendo que apenas ao primeiro dia são dedicados mais de 40 minutos. E tal como no documentário sobre os Beatles, e ainda mais, há uma construção de suspense sobre como se desenrolará a principal tensão que ronda os dias dos que são maciçamente filmados – como será a apresentação pública da banda no caso do filme sobre o quarteto britânico, como se desenrolará o final da rebelião no presídio, no caso em questão. E enquanto observamos em uma narrativa o avanço da banda em termos de desembaraço musical, aqui a crescente tensão representada pela abandono dos mediadores (personalidades da vida pública americana que haviam sido convocados pelos presos, como um senador vinculado a direitos humanos, o jornalista negro John Johnson, que afirmará próximo ao final que está perto de completar seus 90 anos e jamais esquecerá Attica, e o advogado do célebre julgamento dos “7 de Chiicago”) é estabelecida por volta do quinto dia, com o crescente agrupamento de tropas de policiais, assim como da Guarda Nacional. E também o lava-mãos do então governador de Nova York, onde o presídio ficava situado, Nelson Rockefeller, com apoio do presidente Nixon (e cujas conversas também são exploradas em Betrayal at Attica). E o filme traz uma infinidade de imagens do interior do presídio bem mais extensas que o último, inclusive os reféns vendados que serviam como escudos humanos diante de uma invasão completamente desproporcional em termos de armamentos – batalhões da guarda nacional armados com rifles contra barras de ferro, tacos de beisebol, facas e similares. Há requintes de perversão na execução dos presos, já que muitos dos que haviam se destacado como lideranças nos momentos de execução nos dias prévios, como um advogado que rejeitara o documento das garantias de não agressão física, por não se encontrar com selo, sendo perseguidos e executados. E é chocante observar a imagem em rigor mortis de alguém tão repleto de vida poucos dias antes (e algumas dezenas de minutos antes no filme). A mesma foto chocante de um verdadeiro riacho de sangue em meio aos cadáveres,  presente no outro documentário, também se encontra aqui. E não menos chocantes são as manifestações de comemoração dos policiais que gritam “white power”. E também retorna aqui, as fotos dos prisioneiros despidos e com as mãos para o alto, também incluídas em Betrayal at Attica. Muitos dos reféns (oito ao menos) foram também mortos, todos por tiros disparados pela ação de retomada do controle sobre o presídio. Finda com fotos do meteórico momento de glória dos prisioneiros, alguns deles com as mãos representando o então bastante popular gesto de “black power”, seguidos das legendas e depoimentos que se referem às  vitórias judiciais em termos de indenizações das vítimas pelo estado de Nova York (a figura da advogada Elizabeth Think, que é protagonista do outro documentário sequer é citada aqui); mas com todas as ressalvas da inexistência de um pedido de desculpas ou qualquer tipo de indiciamento judicial dos responsáveis pelas 39 mortes, provocadas pela operação de retomada, o mesmo não valendo para os prisioneiros responsáveis pelas 3 mortes de guardas no momento do levante prisional – o que também expressa o grau da disparidade de forças empregadas.| Showtime Documentary Films/Firelight Films/Topic Studios. 116 minutos.

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