Filme do Dia: Hora de Morrer (2007), Dorota Kedzierzawska

 


Hora de Morrer (Pora Umierac, Polônia, 2007). Direção e Rot. Original Dorota Kedzierzawska. Fotografia Arthur Reinhart. Música Wlodzimierz Pawlik. Montagem Dorota Kedzierzawska. Dir. de arte e Cenografia Albina Baranska. Figurinos Katarzyna Morawska. Com Danuta Szaflarska, Krzysztof Globisz, Marta Waldera, Patricja Szewczyk, Agnieszka Podsiadlik, Piotr Ziarkiewicz, Kamil Bitau, Kai Schoenhals.

Após se livrar de seu último inquilino, Aniela (Szaflarska) acredita que finalmente poderá ter sossego em sua mansão decrépita, e cobiçada por seus vizinhos. Vivendo sozinha, com sua cadela Fila(delfia),  recebe ocasionalmente visitas inesperadas (e nem sempre desejadas) de crianças que participam de um projeto levado a cabo por um jovem casal. Ela tenta convencer o filho (Globisz) e sua família, a virem morar com ela, reformando a casa. Ele alega que a esposa não permite. Os vizinhos novos-ricos, no entanto, há tempos estão de olho na propriedade, cuja posse Aniela é irredutível. Até ter uma ideia...

Referências nada didáticas brotam de imagens do passado. Numa delas, uma provável alusão a uma intervenção estatal para que abrigasse “cidadãos” em sua moradia, que anteriormente haviam sido tratados apenas como “inquilinos”. E, como moradora solitária, o falar consigo própria ou com ausentes se torna a via de  acesso aos seus pensamentos. Servindo como ponte para interações outras. Seja lapsos do passado, seja observações sobre os vizinhos e a família, ou ainda o esquecimento do que fora buscar em outro aposento. E ainda, claro, os diálogos com a cadela Fila. Que reage muitas vezes as interações. Dedicado a avó da cineasta. Alguns achados imagético-sonoros não funcionam tão bem. Imagens do passado, em que ela própria surge dançando enquanto jovem e se misturando a imagem dela atual, ao som de uma trilha musical, que peca pelo uso excessivo e efeito adocicado, pode ser um exemplo desestimulante em relação à expectativa criada pela cena inicial (percebida e destacada, inclusive, no documentário Women Make Film). Ou ainda o excesso de contraplanos para a cadela quando instigada. E, como a cena da dança, mais do mesmo se aplica ao momento em que ela vai para baixo da tempestade. Outras, até mais curtas e simples, como a de Aniela passando batom, faceira, ainda com a lembrança do homem que viera pela venda da casa e afirmara que ela era encantadora mesmo gritando, funcionam de longe melhor. O que possuem em comum? Lugares-comuns associados à velhice. Talvez esse seja o maior problema a ser enfrentado pelo filme. Falta um estofo mais particular na composição de sua personagem. Cai-se na repetição do que a própria sociedade já induz. De uniformizar os mais idosos, agora destituídos de trabalho e geralmente de uma vida social mais ativa. E que poderia caber, nessa abordagem, em um curta metragem. Na verdade, não apenas lugares-comuns associados a velhice, mas também ao próprio cinema, como é o caso da expulsão do invasor, emissário do vizinho, que é escorraçado pela fiel Fila de sua propriedade. E quando consegue escorregar um pouquinho que seja desses, como é o caso da fruição que Aniela sente em flagrar um beijo juvenil roubado, e nem sequer imaginado de estar sendo observado (muito menos por alguém da idade dela), dá-se bem. Nem tampouco é sutil a articulação entre as ruínas da casa e a decadência física, e também financeira, e a lembrança de uma época da qual nem se consegue imaginar, de bailes. Talvez o que resista de mais interessante, ao final, seja sua contraposição entre o sentimentalismo e o seu oposto, mesmo o filme assumindo apenas a proximidade da velha senhora, como se fosse sua cadela, sendo os outros personagens observados apenas como vultos – do filho sequer sabemos o nome, e da nora, o nome vem a ser citado uma vez, o que faz sentido dentro da economia de sentidos do filme, que também está associada ao fato de ser uma realizadora mulher. Danuta já tinha 92 anos à época dessa produção e ainda viveria outros dez. Sua cena catártica-epifânica no balanço só perde algo de sua potência por ser inserida dentro dessa incômoda moldura sentimental-moral, algo rasteira, que persegue o filme do início ao final. Chimney Pot/Film Ilumination/Kid Film/Tandem Taren-To/TVP. 104 minutos.

 

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