Filme do Dia: Victoria e Abdul - O Confidente da Rainha (2017), Stephen Frears

 


Victoria e Abdul – O Confidente da Rainha (Victoria and Abdul, Reino Unido/EUA, 2017). Direção: Stephen Frears. Rot. Adaptado: Lee Hall, a partir do livro de Shrabani Basu. Fotografia: Danny Cohen. Música: Thomas Newman. Montagem: Melanie Oliver. Dir. de arte: Alan MacDonald, Sarah Finley & Adam Squires. Figurinos: Consolata Boyle. Com: Judi Dench, Ali Fazal, Tim Pigott-Smith, Eddie Izzard, Adeel Akhtar, Michael Gambon, Paul Higgins, Olivia Williams, Simon Callow.

Abdul Karim (Fazal) foi escolhido de ter a honraria de entregar uma moeda em sinal de oferenda à Rainha Vitória (Dench), então considerada autoridade máxima na Índia igualmente. Ele viaja em  condições precárias com o também indiano Mohammed (Akhtar). No dia da cerimonia formal, mesmo alertado diversas vezes a não fazer nenhum contato visual com a Rainha, ele o faz quando se afasta e é correspondido. Posteriormente, a Rainha decide que os dois farão parte do cerimonial dela durante os dias de celebração. O contato aproximado com Abdul, que quebra desde o primeiro dia o protocolo e fala bastante sobre a cultura de seu país, encanta a Rainha, cansada das formalidades protocolares e insípidas que seu cargo exige, e um carinho por Abdul cresce, ao ponto dela querer que ele se estabeleça na Inglaterra e passe a fazer parte da família real. Quem não gosta nada do rumo que tudo transcorre é Mohammed, cansado do frio e agora igualmente da submissão que tem prestar a alguém que, na Índia, possuía uma posição inferior a sua. Quando a Rainha permite que Abdul traga sua esposa – e ele traz igualmente a cunhada - e cria uma ala hindu em uma de suas residências, um mal-estar conspiratório, incluindo seu filho Bertie (Izzard), passa a tramar sobre a forma de como neutralizar a influência crescente de Abdul sobre Vitória.

Pernosticamente simplório em sua aproximação calculada de elementos que suscitem uma identificação com sensibilidades contemporâneas, porém sem deixar nunca de, em última instância, referendar o lugar social (e nacional) de cada um. Pior que isso, no entanto, é não conseguir equilibrar a contento a relação não menos polar entre Abdul e Mohammed. Se o último poderia ser a voz da má consciência, reclamando do imperialismo e da submissão humilhante do amigo aos caprichos de sua poderosa nova amiga, ele é caracterizado em tudo e por tudo como a porção humorística da dupla, com suas assertivas curtas e repetitivas a reclamar do frio e dos costumes ingleses, e até fisicamente um contraponto à altura e beleza de Abdul. É lógico que o filme ao levar a sério e se centrar na figura de Abdul, transforma o elemento político em não mais que um chiste secundário, que não chega a ser enfrentado de fato. Porém o que dizer da morte cruel, mais ao menos digna de Mohammed em contraposição a um Abdul que, mesmo após a morte de Vitória e de ser expulso violentamente do país, ainda se vê beijando a estátua da mesma diante do Taj Mahal? É jogar todas as fichas não apenas nas relações afetivas, mas em um sentimentalismo rasteiro que transforma Vitória quase numa paladina do multiculturalismo, enquanto Abdul seria aquele toque de vivacidade oriunda do Terceiro Mundo a irromper em meio a frieza britânica-aristocrática. Quanto a Victoria, dessa magnânima senhora se pretende criar laços de identificação irrestritos, pois afinal ela se move no campo dos sentimentos e chega a deitar lágrimas quando relembra dos amores perdidos, enquanto de Abdul nos é sonegada qualquer intimidade e, pior que isso, ainda se lança a sombra do oportunismo, da bajulação e da promiscuidade. Da mesma forma, a corte real é observada em bloco como o reino do egotismo maledicente enquanto de Victoria se escuta até a autocrítica quanto ao seu egoísmo e gozo com o poder. Em última instância, o filme refaz um trajeto tão seguro quanto produções dos tempos de Griffith (e do próprio, inclusive) em que a questão inter-racial era tematizada. Trata-se de um amor sob formato de amizade, incapaz de se expressar sexualmente, por conta de todas as diferenças, sendo a maior – ao menos tal como posto pelo filme – a da idade. E momentos como o que a corte mais próxima da Rainha desdenha dela praticamente a sua frente são tão óbvios que nos fazem nostálgicos do Frears de Ligações Perigosas ou mesmo de produções mais recentes (e decentes) como Philomena, com a mesma Dench, que se molda perfeitamente a exigência de cada produção, sendo a daqui evidentemente mínima. BBC Flms/Cross Street Films/Perfect World Pictures/Working Title Films para Universal Pictures Int. 111 minutos.

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