Filme do Dia: Atlantis (1913), August Blom

 


Atlantis (Dinamarca, 1913). Direção: August Blom. Rot. Adaptado: Axel Garde & Karl-Ludwig Schröder , a partir do romance de Gerhart Hauptmann.  Fotografia: Johann Ankerstjerne.  Com: Olaf Fonns, Ida Orloff, Ebba Thomsen, Carl Lauritzen, Frederik Jacobssen, Charles Unthan, Torben Meyer, Marie Dinesen.

Ao mesmo tempo que recebe uma carta de advertência que suas pesquisas, consideradas demasiado originais, provavelmente não encontrarão acolhida acadêmica, o biólogo Friedrich Kammacher (Fonns) se depara com uma forte crise mental de sua esposa, Angèle, sendo ela levada aos cuidados do Dr. Rasmussen (Jacobssen), a ser internada. Deixando os filhos aos cuidados da mãe (Dinesen), Friedrich viaja a Berlim para relaxar. É convidado a uma matinê de dança artística de Ingigerd (Orloff). Sente-se imediatamente atraído por Ingigerd, mas o plantel de admiradores faz com que parta enraivecido. Sua vaidade é novamente ferida ao chegar no hotel e saber que sua tese foi rejeitada como previsto. Parte para Paris. Lá fica sabendo da viagem de Ingigerd para Nova York e embarca no mesmo navio. Após corteja-la no navio, ele a salva quando o navio começa a afundar, levando-a para um barco salva-vidas. Iniciam namoro, mas o fato de Ingigerd nunca dispensar a constante corte masculina ao seu redor faz com que Friedrich se afaste dela. Ele compra uma casa nas montanhas do amigo, Dr. Schmidt (Lauritzen) e vive solitário e ainda mais deprimido após saber da morte da esposa. Quem se aproxima cada vez mais dele é Eva Burns (Thomsen), escultora como o pai. Os dois se tornam um casal e viajam de encontro a família de Friedrich, sendo recebidos com festa pela mesma.

Desde literalmente o seu primeiro plano chama a atenção não apenas a qualidade da imagem da cópia, restaurada em 1998, quanto o uso profícuo da profundidade de foco, apresentando ações que se desenvolvem em planos distintos com razoável distância. Na aurora do filme de longa-metragem (quando nem Griffith ainda havia tentado o novo formato) essa produção consegue perfeitamente dar conta de sua narrativa. O patético momento da dança, mesmo apresentado sob uma perspectiva similar a de quem o assistiria no teatro – reforçando as similaridades entre o teatro e o cinema do período como A Regeneração de um Ébrio, de Griffith, ainda que no último se reforce dramaticamente o apelo emocional (lá da transformação moral, aqui do entusiasmo por uma mulher) com uma dinâmica de planos x contraplanos entre palco e plateia, que não ocorre aqui. Tudo é demasiado previsível e centrado no narcisismo de seu protagonista. As imagens dos deslocamentos desse de carro, bonde ou barco e a dose de realismo aderente (a ponto de se observar transeuntes observando a câmera décadas antes que isso ficasse mais notório em filmes como Acossado) são um atrativo à parte, em tendência oposta a recriação em estúdio que se tornaria dominante no cinema hollywoodiano clássico. O filme apresenta um momento de franco anti-semitismo, com um grupo de judeus que tentará a sorte na América acotovelados na parte mais popular do transatlântico e o clima algo promíscuo é ressaltado pela mulher que flerta com facilidade com Friedrich. O que o filme possui de grandiloquente (filmagens em 4 países, diversidade de cenários e locações, simulação de afundamento e resgate das vítimas de um transatlântico) possui igualmente de dispersivo e convencional. De fato, existe cenas inteiras consagradas ao artista sem braços que efetua inúmeras ações com os pés pelo simples motivo dele ser um personagem do livro e/ou ter sido um achado que a produção achou digna de nota por seu caráter “sensacional”. O mesmo pode ser dito, em larga escala, do afundamento do navio, que ganha ares de espetáculo voyeurista similar ao Titanic, de Cameron, e muito provavelmente tirando partido da memória recente do evento – o filme foi lançado em dezembro de 1913, enquanto a tragédia ocorreu em abril do ano anterior. Em nenhum momento Friedrich parece minimamente preocupado ou saudoso dos filhos tão assoberbado por si próprio sempre está – nesse quesito soa um tanto inverossímil que levado a “digressões” tão bruscas por se considerar fracassado profissionalmente e atormentado por más notícias da família, sua união com Eva possa sobreviver indelével a tal lacuna, a partir da conveniente morte da esposa. A referência a Atlantis, a partir de um sonho, parece um tanto marginal e pouco convincente em termos de peso dramático. Nordisk Film para Fotorama. 121 minutos.

 

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