Filme do Dia: Raza (1942), José Luiz Sáenz de Heredia

 


Raza (Espanha, 1942). Direção: José Luiz Sáenz de Heredia. Rot. Original:  Antonio Román & José Luiz Sáenz de Heredia, a partir do argumento de Francisco Franco. Fotografia: Heinrich Gärtner. Música: Manuel Parada. Montagem: Eduardo García Maroto & Bienvenida Sanz. Dir. de arte e Cenografia: Sigfrido Burmann & Luis M. Feduchi. Figurinos: Manuel Comba. Com: Alfredo Mayo, Ana Mariscal, José Nieto, Blanca de Silos, Rosina Mendía, Pilar Soler, Julio Rey de las Heras, Luis Arroyo.

Final do século XIX. A família Churruca vê seu pai, Pedro (de las Heras),  partir para a Guerra Hispano-Americana, onde morrerá em combate. Idos de 30. Dos quatro filhos do casal, um, Jaime (Arroyo), tornou-se frade, outro, José (Mayo), combate pelas forças de Franco e um terceiro, Pedro (Nieto),  traiu os ideais familiares e se tornou um importante burocrata do governo, rompendo com o irmão mais entusiasta pelo fascismo e Isabel (de Silos) se casa com um soldado. Quando José é condenado a morte por suas ações vinculadas ao fascismo, Pedro lava as mãos para não se comprometer. A sentença é executada, mas ele milagrosamente escapa, mesmo tendo sido gravemente ferido. A mesma sorte não possui Jaime, executado covardemente como os outros membros da sua congregação. Pedro, a serviço da República, prepara-se contra o iminente ataque das forças leais a Franco, mas acaba entregando os planos a uma agente espiã (Soler), impedindo o sucesso da ação republicana. A família comemora a vitória dos fascistas em uma parada militar.

O filme de propaganda do regime franquista por excelência, torna-se provavelmente mais tosco que qualquer um de seus contemporâneos produzidos a serviço de uma ideologia autoritária/totalitária. Talvez o que ressalte ainda mais o quão tosco é o empreendimento (proveniente de um argumento de Franco, assinado com o pseudônimo de Jaime de Andrade) seja as pretensões de superprodução a se chocarem com as patéticas cenas de ação, como a da morte do patriarca no conflito hispano-americano, assim como a afetada empostação dramática de seu elenco, marcada pelas habituais miradas para o horizonte por parte das mulheres, antes de cometerem suas empoladas falas. Fazendo uso de motes eminentemente melodramáticos, a partir das relações diferenciadas que acabam por separar três irmãos (sendo que dois deles podem se encaixar como uma luva na base de sustentação da sociedade defendida pelo fascismo franquista, um padre e outro soldado lutando ao lado das hostes do ditador), o filme fracassa seja na sua frágil emulação de grandiosidade épica (mais bem conseguida nos documentários alemães assinados por Riefensthal), seja como portador de um estilo próprio (sendo o realismo dos de longe menos enfáticos filmes produzidos pelo cinema italiano de longe mais ousado). Até mesmo em um dos raros momentos nos quais consegue uma solução visual de peso dramático interessante – marido e mulher separados por telas e um corredor se vêm antes do que será a execução dele – o clichê da mão crispada que segura a tela ao final da sequência põe por terra o que havia sido tentado. Seu simplório maniqueísmo, menos evidente na relativamente discreta descrição dos revolucionários no julgamento sumário que resultará em sua condenação, ganha toda a caricatura à altura do restante do filme no momento em que os revolucionários invadem o seminário onde se encontra um dos irmãos e destroem ícones religiosos. A sequência que finda com um massacre dos religiosos que lá moravam, embalada por uma trilha de cânticos gloriosos, pretende uma dimensão de universalidade que soa quase cínica em sua impostura de ocultar qualquer elemento histórico que possa compreender a ação daqueles que promovem a invasão e o massacre (algo que, guardadas as devidas proporções, repetir-se-ia num filme como Homens e Deuses). Mesmo que o uso de imagens de arquivo tenha se tornado lugar comum na época,  independente da coloração ideológica, aqui o momento que faz maior uso das mesmas parece soar particularmente incongruente com a narrativa romanesca, demasiado retórica, inclusive nas cenas de ação. De um modo geral, o que talvez mais chame atenção no filme seja o esforço consciente de se apropriar de todo um imaginário romântico associado aos guerrilheiros revolucionários para seus próprios interesses. Todos os clichês vinculados habitualmente àqueles se encontram aqui a serviço da causa oposta: do drama romântico do casal apaixonado separado pela guerra às tentativas desesperadas de alistamento voluntário de jovens, idosos e mulheres (essas particularmente vinculadas ao imaginário das guerrilhas de matriz socialista); dos momentos de companheirismo boêmio aos atos de abnegação por uma causa “desinteressada”. Destaque para o efeito que provoca um halo de luz ao redor dos olhos dos personagens. Cancilleria del Consejo de la Hispanidad para Distribuidora Cinematográfica Ballesteros. 113 minutos.

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