Guia Crítico de Diretores Japoneses#2: Hideo Gosha

 


GOSHA Hideo

(16 de fevereiro de 1929 - 30 de agosto de 1992)

五社英雄

A obra de Hideo Gosha habita o meio termo entre o detalhe histórico e o realismo físico do jidai-geki e a pura ação do chanbara. Inicialmente empregado como um diretor de televisão na Fuji TV, aprendeu  a trasnportar o essencial do enredo de modo econômico e encenar repentinos clímaxes de forma efetiva. O sucesso de sua mais famosa série de TV, Sanbiki no Samurai (Três Samurais Fora da Lei) proporcionou-lhe um convite para adaptá-la para um longa-metragem para o cinema, na Shochiku, em 1964. Influenciado em estilo e conteúdo por Kurosawa, a estreia em tela grande de Gosha foi talvez sua melhor obra, combinando uma afiada fotografia em preto e branco com direcionamento narrativo, e incorporando incisivos comentários sociais na sua descrição do mau tratamento de camponeses por um magistrado insensível. 

Essa simpatia pelos despossuídos foi uma característica recorrente da obra de Gosha. Em Goyōkin (Tirania, 1969), os habitantes de uma vila pesqueira são assassinados por ordens de um aristocrata de província, para se prevenir de testemunharem sobre o roubo da carga de ouro de um navio do shogunato, enquanto o guerreiro louco, protagonista de Hitokiri (Hitokiri - O Castigo, 1969) é a garantia de um jogo político, primeiro utilizado, depois descartado por seu mestre. Estes se encontram entre os filmes mais politicamente perspicazes de Gosha; mas aqui, como alhueres, o tom de sua obra foi, em última instância, niilista. Em Três Samurais Fora da Lei, a despeito da proteção do samurai, os camponeses estão demasiado amendrontados de apresentarem sua petição de melhor tratamento para seu senhor, enquanto em Hitokiri - O Castigo, o anti-herói sacrifica de boa vontade sua própria vida a fim de se vingar de seu traidor.

Dentre os outros filmes dos anos 60 de Gosha, Kiba Ōkaminosuke (Lobo Samurai, 1966), foi uma paradoxalmente concisa, ainda que exagerada, narrativa do conflito entre um guarda-costas contratado e um assassino de aluguel. Com suas caracterizações estranhas e visual exagerado, torna-se mais reminiscente de um western-spaghetti que de um filme de samurai ortodoxo. Tange Sazen: Hien Iaigiri (O Segredo da Urna, 1966) foi um incomumente leve filme sobre um samurai de um olho e um braço Sazen Tange; na verdade uma refilmagem de Tange Sazen yowa: Hyakuman-ryō no Tsubo (Tange Sazen e o Pote de Ouro, 1935), de Sadao Yamanaka, faltando a delicada mescla entre humor e pathos do original. Gohiki no Shinshi (Cash Call Hell, 1966), um raro gendai-jeki, foi um suspense superior sobre um condenado em liberdade condicional, que concorda em cometer um assassinato a pedido de um companheiro de prisão. Seus tiques estilísticos modernistas são, frequentemente, demasiadamente enfáticos, mas jacta-se de uma fotografia soberbamente monocromática e uma impressionantemente meditava interpretação principal de Tatsuya Nakadai. 

Nos anos 70, a abordagem de Gosha se tornou mais convencionalmente genérica. Shussho Iwai (Os Lobos, 1971), ambientado em um cenário histórico de uma anistia proporcionada aos cirminosos na época da ascensão do Imperador Showa, foi uma banal história de yakuza, mesmo com um festival de impressionantes clímaxes visuais. Kumakiri Nizaemon (Bandits vs. Samurai Squadron, 1978)  foi um suave chanbara. Yami no Kariudo (Caçadores das Trevas, 1979) foi de alguma maneira mais individual, com um ronin amnésico como quintessencial "homem comum" como protagonista, ameaçado por maquinações que não compreende. No entanto, a narrativa do filme foi excessivamente complicada e as caracterizações rasas. 

A despeito do machismo destes filmes, Gosha nos anos 80 adquiriu alguma reputação como especialista em histórias com mulheres fortes como protagonistas. Nikutai no Mon (Gate of Flesh, 1988), foi a quinta adaptação do romance de Tajirō Tamura sobre as vidas de prostitutas durante a Ocupação, enquanto Kagerō (Heat Haze, 1991), foi uma saga de vingança da Era Showa sobre uma jogadora profissional. Também notável entre as obras posteriores de Gosha foi 226 (Quatro Dias de Sangue e Neve, 1989), uma história sobre a tentativa de golpe militar de 26 de fevereiro de 1936, e seu último filme, Onnagoroshi abura jigoku (Oil Hell Murder, 1992), uma tragédia de vingança derivada do Chikamatsu.

Gosha possui alta reputação entre os devotos dos gêneros de ação japoneses. Alain Silver tem citado Hitokiri - O Castigo como "um dos mais bem conseguidos exemplos do gênero samurai desde a Segunda Guerra". Certamente, Gosha tinha talento para terríveis orquestrações e momentos chocantes: observe a imagem, em Caçadores das Trevas, de uma espada suspensa do teto, agarrada por uma mão. Suas lutas de espadas possuem um realismo brutal, enfatizando bastante nos jorros de sangue e no som do metal penetrando a carne. Infelizmente, ele não estendeu realismo comparável aos seus personagens, que raramente vão além dos confins de um estereótipo genérico. As limitações estilísticas de Gosha potencializam esta falha; adepto da ação coreográfica, foi menos gabaritado no manuseio da câmera. Sua direção, com o frequente auxílio de zooms, primeiros planos e câmera lenta, contentou-se em permanecer na superfície, com a consequencia de que o impacto de seus filmes foi geralmente mais físico que emocional. 

1964 Sanbiki no samurai / Três Samurais Fora da Lei

1965 Kedamono no ken / A Espada do Mal

1966 Gohiki no shinshi / Cash Calls Hell 

Tange Sazen: Hien iaigiri / O Segredo da Urna

Kiba Ōkaminosuke / Lobo Samurai

1967 Kiba Ōkaminosuke: Jigokugiri / Lobo Samurai 2

1969 Goyōkin /Tirania

Hitokiri /Hitokiri - O Castigo

1971 Shussho iwai / Os Lobos Violentos

1974 Bōryokugai / Ruas Violentas

1978 Kumokiri Nizaemon / Bandits vs. Samurai Squadron

1979 Yami no kariudo / Caçadores das Trevas

1982 Kirūin Hanako no shōgai / Onimasa 

1983 Yōkirō / Gueixa

1984 Kita no hotaru / Fireflies in the North

1985 Kai / The Oar Usugeshō 

1986 Jittemai / Death Shadows 

Gokudō no onnatachi / Yakuza Wives

1987 Yoshiwara enjō / Tokyo Bordello 

1988 Nikutai no mon / Gate of Flesh 

1989 226 / Quatro Dias de Sangue e Neve

1991 Kagerō / Heat Haze

1992 Onnagoroshi abura jigoku / Oil Hell Murder

Texto: Jacoby, Alexander. A Critical Handbook of Japanese Film. Berkeley: Stone Bridge Press, 2008  pp, 60-62. 

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