Filme do Dia: A Delinquente (1933), Yasujirô Ozu
A Delinquente (Hijôsen no Onna, Japão, 1933). Direção: Yasujirô Ozu. Rot.
Original: Tadao Ikeda, a partir do argumento de Ozu. Fotografia: Hideo
Shigehara. Montagem: Kazuo Ishikawa & Minoru Kuribayashi. Dir. de arte:
Yonekazu Wakita. Cenografia: Takeshi Hoshino. Figurinos: Kurenai Saitou. Com:
Kinuyo Tanaka, Jôji Oka, Sumiko Mizukubo, Kôji Mitsui, Yumeko Aizome, Yoshio
Takayama, Koji Kaga, Yasuo Nanjo.
Tokiko (Tanaka) trabalha em um
escritório no qual o filho do chefe lhe corteja. Ela, no entanto, apenas possui
olhos para o gângster Jyoji (Oka). Um jovem estudante, Hiroshi (Mitsui)
decepciona sua irmã, Kazuko (Mizukubo) quando pretende se unir ao grupo de
Jyoji. Jyoji, por sua vez, sente-se atraído por Kazuko, provocando forte crise
de ciúmes de Tokiko.
Já de início salta aos olhos tanto
cacoetes de um estilo visual que seria refinado na maturidade, com montagens de
planos de corte seco de objetos e
elegante angulação intercalados por eventuais
travellings descritivos com um enorme fascínio pelo cinema
norte-americano, e pela cultura norte-americana em geral, representado não
apenas pela emulação dos tipos, trajes e ambientes dos contemporâneos filmes de
gângster como igualmente pelos cartazes em inglês na academia de boxe – dentre
eles de O Campeão (1931), filme sobre
boxeador de King Vidor - e pelo jazz nos nightclubs. Além do selo RCA/Victor na
loja de discos e a referência ao então célebre boxeador Jack Dempsey e ao
cartaz francês de Nada de Novo no Front. O reflexo do luminoso de néon sobre o quarto
do gângster, evidente alusão a Scarface (1932).
Embora interessante, o filme parece igualmente se ressentir dessa excessiva
influência, não conseguindo nem de longe atrair o mesmo pathos de produções posteriores na mesma década como Uma História de Ervas Flutuantes (1934)
ou O Que Foi Que a Senhora Esqueceu?
(1937), em que motivos aparentemente mais triviais e sem tanto apelo
espetacular davam vazão a uma poética mais afinada e certeira na elaboração dos
conflitos associados a vida afetiva em família, tema único de praticamente toda
a (melhor) obra de Ozu, aqui apenas arranhado. Em termos comparativos, basta
observar o quanto é mais carismática e densa a personagem da sobrinha que se
pretende moderna na produção de 1937 para a “delinquente” aqui apresentada, não
muito diferenciada de similares não apenas do cinema americano mas igualmente,
pouco depois, do realismo poético
francês. Não faltam o olhar parado e soturno do gangster e a dependência
afetiva que lhe faz prometer abandonar a vida criminal e o “último golpe” e a
utopia de uma vida futura sem problemas com o dinheiro a ser conseguido nesse
antecipado gozo, que sinaliza para uma provável tragédia. A ironia fica por
conta do momento em que Tokiko afirma ao amante que ele será um simples
empregado, seguido pelas imagens iniciais da rotina de trabalho que haviam sido
entrevistas ao início do filme, não significando que ele irá finalmente se
empregar, mas sim aplicar o último golpe. Curiosamente, embora inspirado
plenamente pelo cinema americano, ao mesmo tempo o filme antecipa com a ação do
casal, ao final, ações criminais célebres de casais hollywoodianos como as de Mortalmente Perigosa (1950) e Bonnie e Clyde (1967). Tampouco se pode
deixar de salientar a relativa falta de foco narrativo, escapando do casal
principal para ficar com Hiroshi e sua irmã por demasiado tempo. Shochiku. 100
minutos.
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