Filme do Dia: Last Spring (1954), François Reichenbach

 


Last Spring (França, 1954). Direção: François Reichenbach.

Mesmo que sem cenas de nudez como seu outro curta (Nus Masculins) também de viés pioneraimente homoerótico, e igualmente tido como desaparecido, redescoberto e recuperado pela Cinemateca Francesa (em 2016), esse, filmado em p&b, ao contrário daquele, talvez se apresente como mais ousado para os olhares da época de sua redescoberta. E isso se dá inevitavelmente por apostar em narrar fragmentos de uma história de amor, de enamoramento, do sentimento de ausência da pessoa amada, e da tristeza, expectativa e ansiedade que gera a inexistência de notícias do objeto de afeto. Também se trata de algo visivelmente mais burilado formalmente, brincando com os tempos narrativos e fazendo uso mais efetivo de recursos estilísticos como sobreposições e de uma banda sonora com a presença de jazz féericos (no momento de decadência e bebedeira do personagem), ou do tema de Albinoni, em momentos mais voltados para o idílio amoroso ou os primórdios de sua insegurança quanto a um reencontro, ou ainda de outro tema musical instrumental mais enérgico e menos melancólico para o momento da perseguição ao amado, para compor um mosaico que mais parece seguir os caprichos do desejo e da memória, intercalados por um presente maciçamente agoníaco. Também faz uso da criatividade para se referir à sexualidade mais explícita, como a mão do amado alcançando no espaço, à altura do genital do amigo, sem que o contato físico ocorra, mas sugerindo-o fortemente pela imagem. E onde a literalidade se encontra com o simbólico. Encontro talvez que não seja dos melhores achados do filme – seu amado corre e quando ele tenta segui-lo, o portão se fecha e dois outros garotos riem sadicamente de seu desespero, remetendo ao surrealismo das vanguardas mudas, mas longe de seu efeito e sofisticação. O mesmo pode ser dito da bela reverse motion que faz com que o amigo “volte” a subir na árvore, evocativa de Cocteau. Ou ainda do que consegue extrair da vazão discreta da luminosidade de um trapiche ao lado do mar, que é percorrido por baixo por seu atormentado apaixonado.  Seu final surpreende, ao acenar para um possível pesadelo e retorno da situação anterior à partida do amado. Estreia do realizador.  22 minutos e 22 segundos.

 

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