Filme do Dia: A Árvore dos Frutos Selvagens (2018), Nuri Bilge Ceylan
A Árvore dos Frutos Selvagens (Ahlat
Agaci,
Turquia/Macedônia/França/Alemanha/Bósnia-Herzogovínia/Bulgária/Suécia, 2018).
Direção: Nuri Bilge Ceylan. Rot. Original: Akin Aksu, Ebru Ceylan & Nuri
Bilge Ceylan. Fotografia: Gökhan Tiryaki. Montagem: Nuri Bilge Ceylan. Dir. de
arte: Meral Aktan. Figurinos: Demet Kadizade. Com: Dogu Demirkol, Murat Cemcir,
Bennu Yldirimlar, Hazar Ergüçlü, Serkan Keskin, Tamer Levent, Öner Erkan, Ahmet
Rifat Sungar.
Sinan (Demirkol), após finda uma graduação, volta
ao seu vilarejo, onde descobre que seu pai, Idris (Cemcir), gasta o que ganha e
o que não ganha em jogo, enquanto ele possui uma verba que pretende publicar o
seu livro, A Árvore dos Frutos Selvagens,
negado auxílio da autoridade local por ser uma ficção e não um livro de turismo
ou de exaltação da região.
Ceylan efetua um tour de force menos nas interpretações, menos carregadamente
dramáticas que alguns filmes seus exigem, que nos intermináveis diálogos, na
maior parte das vezes bastante triviais, mas nem por isso menos tocantes,
entabulados por Sinan e seus interlocutores. Uma espécie de retrato das ilusões
perdidas do jovem à sua revelia, pois esse, ao contrário do herói de Stendhal,
encontra-se longe do arrivismo e da inserção social e admite que detesta os
humanos e ama a natureza e os animais. Os momentos mais rasgadamente dramáticos
demonstram invariavelmente ser - e
acertadamente – frutos de uma licença que representaria a mente de seu autor,
quando não abertamente de seus sonhos. Ceylan consegue construir personagens
raramente densos no cinema que lhe é contemporâneo, que podem sugerir
aproximações com um realizador como Tarkovski, sem a necessidade de fazer uso
de uma representação de uma transcendência mística. Aqui, se existe algo
semelhante, dá-se no próprio terreno da materialidade e de uma continuidade com
as limitações da vida, mas que com grandes saltos e/ou superações. A determinado
momento Sinan procura saber do livreiro quantos livros seus foram vendidos e o
resultado é zero. Tempos depois, descobrirá que seu pai o leu, e guardou um
recorte quando do lançamento dele em um jornal local, tornando-se o
livro uma forma que serviu ao menos para se comunicar seja com a dedicatória
oferecida à mãe, seja no reconhecimento do pai de si próprio no livro, em um
filme que parece bastante centrado, embora não exclusivamente, nessa relação de
afastamento e identidade (Sinan observa que o avô, como o pai e ele próprio,
são figuras solitárias, forma para conseguirem lidar com o estranhamento brutal
que sentem em relação ao mundo). Belamente fotografado, mas sem cair nos
perigosos excessos de imagens demasiado formalistas. Extremamente literário, e
não apenas por conta da quantidade de diálogos, o filme é repleto de
referências literárias igualmente, incluindo um cavalo de troia (em que Sinan
se refugia após ter sido flagrado jogando uma parte de um monumento de uma
ponte na água, numa cena que também poderia sugerir seu suicídio) e pôsteres
enormes de autores como Kafka, García Marquez e Virginia Woolf, em uma
livraria. Ao longo do filme se houve acordes da Passacaglia e Fuga em C Menor, BWV 582, de Bach. Detailfilm/Film i
Väst/Memento Films Prod./Nulook Prod./RFF International/Sister and Brother
Mitevski/Zeynofilm. 189 minutos.
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