Filme do Dia: Caixeiro-Viajante (1969), Albert Maysles, David Maysles & Charlotte Zwerin
Caixeiro-Viajante (Salesman, EUA, 1969). Direção: Albert Maysles, David Maysles &
Charlotte Zwerin. Fotografia: Albert Maysles. Montagem: Charlotte Zwerin &
David Maysles.
Esse documentário, um dos marcos do Cinema
Direto norte-americano, acompanha 5 vendedores de bíblia em suas duras jornadas
de trabalho, sob o sol ou sob a neve. Ao contrário de outros luminares
associados ao movimento, como Wiseman, que se especializou em efetivar
panoramas críticos de instituições como hospitais psiquiátricos, hospitais,
escolas ou o sistema penal, aqui se depara sobretudo com situações e
personagens peculiares. Há uma evidente tensão e melancolia que vão em extrema
oposição ao que é recitado nas reuniões de vendedores, uma mescla entre um
discurso de auto-ajuda pré-fabricado,
tentativa de impor um otimismo inexistente e prédicas que mal conseguem
disfarçar sua dimensão puramente econômica e liberal através de um discurso
moral e até religioso – como é o caso de um dos vendedores que ganhou um prêmio
de reconhecimento e não faz parte do grupo de personagens observados de forma
mais próxima pelo filme. Dentre esses, a figura que se destaca, Paul Brennan,
inclusive em seu pessimismo e rancor evidentes, que, a determinado momento o
filme delega a função de algo como um narrador interno através de seus
comentários sobre os outros quatro, todos apelidados como nomes de animais,
intercalados por cenas desses em ação e pelos risos desse, como se estivesse
igualmente acabado de ver a cena em que um dos seus colegas tenta, a todo
custo, empurrar uma venda para uma família que se encontra completamente sem
dinheiro. Se nos documentários clássicos de Flaherty há uma dimensão épica da
sobrevivência em meio as adversidades da natureza indócil aqui as adversidades
se encontram no coração da própria civilização ocidental e está associada a
relações sociais efêmeras entre vendedores e clientes. E, mesmo quando ocorre,
ao contrário da cliente de origem polonesa que após muita conversa, não se
demonstra convencida em arcar com a responsabilidade de pagar as prestações da
bíblia, como é o caso do casal que compra um bíblia e enquanto escutamos os detalhes do contrato
serem discutidos entre vendedor e a mulher ouve-se um fundo sonoro de uma versão
instrumental de Yersterday posto no
toca-discos pelo marido. Ocorre uma cena constrangedora, próxima ao final, em
que o “Touro” tem que advertir sobre o pessimismo e mau humor de Brennan,
quando ele eleva o tom de voz em sua prédica para um casal que não se encontra
disposto a comprar, ficando mudo e cabisbaixo durante uns instantes. E é sua
imagem a última entrevista, tensa e angustiada, quase que próxima a desabar,
que se acompanha. Se o seu ritmo pode parecer moroso e algo repetitivo, sem
dúvida reflete o da vida profissional (e, por extensão, pessoal) de seus
retratados. Maysles Films. 85 minutos.
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