Filme do Dia: Koyaanisqatsi - Uma Vida Fora de Equilíbrio (1982), Godfrey Reggio
koyaanisqatsi – Uma Vida
fora de Equilíbrio (EUA, 1983). Direção:
Godfrey Reggio. Rot. Original: Godfrey Reggio, Michael Hoenig, Ron Fricke
& Alton Walpole. Música: Phillip Glass & Michael Hoenig. Fotografia:
Ron Fricke. Montagem: Ron Fricke & Alton Walpole.
O primeiro de uma trilogia que só seria completa
quase vinte anos após, apresenta como mensagem-título a modernização como
principal estimuladora de uma vida louca ou sem equilíbrio no idioma hopi – de
onde foi, igualmente, extraída a letra da composição, em forma de ópera
minimalista, que acompanha todo o filme. Munindo-se somente de imagens, em sua
maior parte filmadas pela própria equipe e ocasionalmente de imagens de
arquivo, da citada trilha sonora e de efeitos de câmera lenta – e
principalmente – acelerada, o filme procura “denunciar” a sordidez de um mundo
moderno que se movimenta obsessivamente sem o menor sentido, seja no tráfego
louco de Nova York ou nos gestos repetitivos a exaustão (e, com efeito de
ampliação da aceleração da imagem) de jogadores de videogame ou de operários da
indústria automobilística. Em uma das primeiras sequências em que o ser humano
é divisado, Reggio aponta que há algo de errado em uma civilização em que uma
mãe tranquilamente faz lazer com o filho nas areias de uma praia há poucos
metros de uma usina nuclear. Segue-se, então, um turbilhão de imagens de
multidões em movimento como formigas, automóveis que se transformam em imagens
semelhantes a laser e, numa sequência de destaque particular, a cidade moderna por
excelência se transforma em algo muito semelhante as placas de computador.
Quanto aos seres humanos, as poucas vezes em que a câmera se aproxima deles,
são a própria expressão da apatia, da solidão e do patético (um grupo de
trabalhadoras de um cassino em Las Vegas posa para a câmera com seu ridículo
uniforme e maquiagem, um velho faz propaganda com o boné de uma atração
turística, outro faz a barba em plena rua, vários rostos melancólicos),
possuindo como contraponto a irônica mensagem de um anúncio publicitário vista
pouco antes que exorta a felicidade. Igualmente não faltam as tradicionais e
diversas sequências em que se destaca o caráter serial da linha de produção
(que agora fazem justamente o oposto da pretensa louvação da modernidade que
filmes como Berlim, Sinfonia de uma Metrópole efetivaram, demonstrando o
banal e o desumano, que aliás, inconscientemente, o próprio filme de Ruttman já
apresentava). Também sobra uma rápida sequência para ironizar com o bombardeio
de informações e imagens proporcionados pela televisão. O resultado,
sintetizado na longa e bela sequência final, que acompanha a explosão de um
foguete e, particularmente, de uns destroços aos quais acaba se sobrepondo a
imagem de uma pintura do povo Hopi é mais que evidente: se continuarmos nesse
ritmo perderemos qualquer possibilidade de fruição da essência humana e
estaremos, ainda pior, condenados ao apocalipse. Tal sequência, aliás, é um
explícito contraponto ao otimismo e fé na razão que articulavam o plano às
avessas de 2001: Uma Odisséia no Espaço (1968), de Kubrick, quando o
osso jogado pelo macaco se transformava em uma moderna nave singrando pelo
espaço. Aqui, opera-se em sentido inverso, da alta tecnologia para uma pintura
ancestral. Porém, em última medida, a crítica efetivada por Reggio soa
grandemente retórica, senão mesmo conservadora, tão presa se encontra de uma
idealização de culturas do passado e igualmente sem apontar qualquer saída no
presente que não seja a mera abstração. Seu último filme da trilogia apenas
confirma, senão de modo ainda mais acentuado, um humanismo vago e irritante que
é o mesmo motor para documentários igualmente supervalorizados como o
brasileiro Nós que Aqui Estamos Por Vós Esperamos. Utilizando-se
igualmente somente da música e imagens, em sua maior parte de arquivo, e
provavelmente com preocupações bastantes semelhantes as de Reggio, o cineasta
armeno Pelechian consegue resultados bem mais notáveis e intrigantes. Prêmio do
Público na Mostra Internacional de São Paulo. Institute for Regional Education.
87 minutos.
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