Filme do Dia: O Segredo das Águas (2014), Naomi Kawase
O Segredo das Águas (Futatsume no Mado,
Japão, 2014). Direção e Rot. Original: Naomi Kawase. Fotografia: Yutaka
Yamazaki. Música: Hashiken. Montagem: Tina Baz & Naomi Kawase. Dir. de
arte: Kenji Inoue. Com: Nijirô Murakami, Jun Yoshinaga, Miyuki Matsuda, Makiko
Watanabe, Jun Murakami, Hideo Sakaki, Sadae Sakae, Tetta Sugimoto.
Kaito (Murakami) é um adolescente de 16 anos
que descobre um cadáver desnudo na praia. Ele possui uma relação afetiva com a
também adolescente, Kyoko (Yoshinaga), cuja mãe (Matsuda), uma xamã,
encontra-se em estado terminal. Kaito, que mora numa ilha distante, vai até
Tóquio visitar o pai e indaga dele o motivo de separação da sua mãe. A mãe de
Kyoko falece e Kyoko procura iniciar uma relação que inclui sexo com Kaito, mas
esse a rejeita, indo tomar satisfação da mãe pela constante presença de
amantes. Kyoko o segue. Ela é testemunha da maneira agressiva que ele trata a
mãe, que desaparece de casa. Kaito se desespera e volta a encontrar a mãe em
seu trabalho. Ela o acolhe. Agora ele consegue fazer amor com Kyoko.
Fábula decepcionantemente banal de Kawase. Os
motivos para sua banalidade são vários. Do excessivo didatismo da superação do
trauma adolescente – Kaito somente conseguirá se resolver sexualmente com a
namorada, após aceitar a sexualidade da mãe
- até sua visão místico-protocolar de pacotilha, repleta de chavões e
lugares-comuns endereçados por atores constrangedoramente sérios – e a
referência ao complexo de viadutos que ilustrava o “momento de
imponderabilidade” de Solaris, de
Tarkovski poderia servir como gradação em termos comparativos, como se o
talento aqui fosse apenas entrevisto tal e qual o complexo. A lista poderia
continuar infindável, incluindo sua irritante trilha musical e os diálogos que
expressam excessivamente o que seria melhor
caso sugerido ou trabalhado de forma oblíqua. Existe ainda os olhares
“inefáveis” e piedosos e a maquiagem carregada no branco da pretensa moribunda.
Sendo que a inefabilidade finda demasiado redundante pois se soma ao já
expresso nos diálogos, ou melhor, monólogos da mãe para a embasbacada filha.
Embora o drama seja masculino, são as mulheres que possuem essa ligação
umbilical com a terra. Elas são a própria terra, numa perspectiva mítica que
satisfará aos interessados tal como as produções da Miramax o fizeram em termos
do que era considerado cinema de arte na indústria norte-americana; e, aliás,
certos momentos que pretendem representar epifanias dos personagens não ficam
muito a dever a essa referida produção e seu apurado senso de se demonstrar
“sensível”. Teria sido mais aceitável caso tivesse sido trabalhado como
animação, cujo leque para abranger clichês sobre espiritualidade e a vida
possui um critério mais complacente. E a imagem final é a concretização da
superação do temor de Kaito com relação à água, representação do feminino,
nadando despido com sua amada, numa versão mais pudica que a de A Lagoa Azul. Em contraposição ao sexo mais realista e
visceral da mãe, curiosamente fadado a provocar um cadáver em águas
turbulentas, pois distante de “seguir os passos do bem” como afirmaria o melodrama
tradicional. Aliás, o tratamento romantizado da natureza, acentuado por sua
exuberante fotografia se torna um item importante, senão indispensável, do
canhestro conjunto, parecendo o filme perder toda a sutiliza presente em obras
de fato sensíveis da realizadora, como Shara
(2003), que chamou a atenção da crítica internacional para si e ser mesmo
demasiado pueril em sua elegia panteísta quando equiparada a visões menos
complacentes de períodos distintos e estilos diversos da história do cinema que
vão de Terra (1930), de Dovjenko a Além da Linha Vermelha (1998), de
Malick. Kumie. 121 minutos.
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