Filme do Dia: Monika e o Desejo (1953), Ingmar Bergman
Monika e o Desejo (Sommaren med Monika, Suécia, 1952)
Direção: Ingmar Bergman. Rot. Adaptado:
Ingmar Bergman&Per Anders Fogelstron, baseado no romance do último.
Fotografia: Gunnar Fischer. Música: Erik Nordgren. Montagem: Tage Holmberg e
Gosta Lewin. Com: Harriet Andersson, Lars Ekborg, John Herryson, George Skarstedt,
Daggmar Ebbesen, Ake Fridell, Naeme Briesse, Gosta Eriksson.
Monika (Andersson) encontra casualmente
Henrik (Ekborg), e induz para que ele a chame para o cinema. Passam a se
relacionar. Extremamente carente e inseguro, Henrik trabalha no almoxarifado de
uma loja de porcelanas. Monika tem fama em seu bairro de ser uma mulher
leviana. Sua família é mais pobre que a de Henrik, vivendo em um cortiço e
tendo um pai alcoolátra que vez por outra a espanca. Um dia, Henrik a chama
para sua casa e, quando Monika começa a acariciá-lo o pai de Henrik chega. O
ambiente de trabalho para Henrik torna-se cada vez mais difícil, porque além de
chegar várias vezes atrasado, muitas vezes se atrapalha com as entregas,
perdido em devaneios. Um dia Monika não aguenta as humilhações do pai e resolve
sair de casa. Quando Henrik chega do trabalho é surpreendido por Monika, que
lhe conta tudo. Ela pede para subir, mas Henrik afirma que uma tia (Ebbesen)
sua lá se encontra. Lembra-se então do pequeno iate que pertence a seu pai e leva-o
até ele. Na primeira noite em que dormem juntos no iate, Henrik acorda tarde
demais para o trabalho, e após chegar mais uma vez atrasado, ouve mais
reclamações. Não mais aguentando, pede suas contas. Juntos, decidem passar um
verão sem compromisso em praias próximas
da cidade, com o dinheiro que Henrik recebeu ao sair do emprego. Vivendo dias
de idílio completo, a situação começa a se deteriorar, quando a comida começa a
escassear, um veranista chamado René
resolve invadir o iate e vasculhar seus pertences, além de tentar pôr fogo
no mesmo e Monika resolve invadir a adega de uma família, sendo flagrada
enquanto roubava um cozido. O pai da família a leva para casa e avisa que irá
chamar a polícia. Uma mulher oferece um lugar para Monika à mesa. Esta senta
mais não toca na comida, revidando as tentativas de conversa por parte da
mulher. Enquanto o pai sai do aposento, Monika rapidamente abandona a casa,
levando consigo o cozido. Após uma longa procura por Henrik, encontra-o e
começam a discutir. Chegam a conclusão que devem retornar à cidade, após Monika
afirmar que se encontra grávida. Após o casamento civil consumado, ele com
dezenove anos, ela com dezoito, passam a morar em um pequeno apartamento.
Henrik começa a trabalhar como caixeiro-viajante, porém a vida conjugal demonstra
ser menos fácil do que imaginavam. Após o nascimento da menina, que acaba
levando o nome da mãe, Henrik sente-se sobrecarregado, trabalhando fora,
estudando à noite para melhorar de vida e, ao mesmo tempo, eventualmente tendo
que tomar conta da menina para que Monika consiga dormir. Monika por sua vez
reclama da situação de penúria em que vive, que não lhe possibilita comprar um
casaco novo ou ir ao cinema e da ausência de Henrik. Após chamar sua tia, para
que tome conta da criança, enquanto se encontra fora trabalhando, Henrik parte
mais uma vez em viagem. Enquanto se encontra fora, Monika sai e se encontra com
René, o veranista. Quando Henrik retorna surpreende-os juntos. Afirma para
Monika que a situação não pode continuar como está e que talvez seja melhor que
se separem. Monika reitera suas críticas habituais à ausência de Henrik e a
falta de dinheiro. Após uma discussão, iniciam um contato amoroso, quando
Henrik interrompe e afirma que não acredita que Monika tenha levado René para o
apartamento deles. Ela afirma que não pode fazer nada pois o ama. Henrik a
agride fisicamente, e ela parte. Apesar de sua tia ter se oferecido para ficar
com a criança, Henrik afirma que pretende cuidar dela ele próprio. Diante de
uma vitrine, com a criança no braço, Henrik relembra nostálgico os melhores
momentos que viveu com Monika.
Um dos maiores
filmes de Bergman, em que a maturidade
tanto de tema quanto de estilo se aliam numa demonstração de modernidade que
deixa a anos-luz de distância as produções de Hollywood da época. Destituído de
sentimentalismo, Bergman apresenta um retrato cruel e agridoce do ciclo que
compreende: a fuga da vida cotidiana (representada pela violência do pai e a
sordidez do ambiente em que vive e trabalha para Monika e do trabalho
insuportável para Henrik); a situação idílica nas praias em que Henrik descobre
todos os prazeres do amor e do carinho que lhe foram negados desde cedo (sua
mãe morreu quando ele ainda era criança, seu pai e ele mal se comunicam); o
casamento, que acaba por solapar qualquer ilusão de estender os sonhos que
viveram no verão para o dia-a-dia. Com rara acuidade psicológica, são
construídos personagens extremamente ricos, como é o caso de Henrik, que só
consegue vivenciar a felicidade afastado do mundo real (seja na sala escura do
cinema ou nas praias afastadas do convívio social) e, em igual grau, de Monika
(que, em plena situação de dificuldades econômicas em que vivem, reclama de não
ter dinheiro para o cinema). A sensibilidade de Henrik e dificuldade para lidar
com situações que vão além de seus sonhos, construídos sobre bases nada
sólidas, se contrapõe a maior pragmaticidade de Monika, que apenas
impulsivamente reagiu a toda uma história amorosa já que o afeto, a
sensibilidade e a atenção não foram as maiores virtudes de seus parceiros
anteriores. Também curiosa e moderna é a criticidade com que Bergman vê o
próprio ilusionismo do cinema, um dos elementos que alimentou a relação imatura
do casal, afastando-se da habitual valorização do mesmo em filmes tão diversos
quanto Noite Americana, Cinema Paradiso e Splendor.
Utilização frequente de fades. Bela
fotografia de Fischer. Entre os melhores momentos se encontram o que Monika se
despe e vai tomar banho de mar observada por Henrik, a recordação nostálgica de
Henrik do mesmo momento no final e a cena em que Andersson encara a câmera por
um longo tempo, recurso que habitualmente só fora utilizado anteriormente no
cinema para efeito cômico ou narrativo. Um dos mais cruéis retratos do amadurecimento
forçado (Henrik) e de como é efemêro o sentimento de felicidade e de amor na
vida. As cenas idilícas do verão evocam uma singeleza semelhante a de L’Atalante
(1933) de Vigo, além de apresentar a
natureza como refúgio do insuportável cotidiano da cidade e em perfeita
harmonia, pelo menos no início, com o elemento humano. Svenskfilmindustri. 90
minutos.
Uma obra destruidora de ilusões juvenis idílicas sobre o amor, em outras palavras, uma obra realista.
ResponderExcluiracho que poucos filmes merecem tanto o epíteto de "agridoce" como esse, Gustavo.
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