Filme do Dia: Alice nas Cidades (1974), Wim Wenders
Alice nas Cidades (Alice in den Städten, Alemanha Ocidental, 1974). Direção: Wim
Wenders. Rot. Original: Veith von Fürstenberg. Fotografia: Robby Müller.
Montagem: Peter Przygodda. Com: Rüdiger Vogler, Yella Rotlländer, Lisa Kreuzer,
Edda Köchl, Ernest Boehm, Sam Presti, Lois Moran, Didi Petrikat, Hans
Hirschmüller.
Phil Winter
(Vogler) é um alemão viajando pelos Estados Unidos que, quando decide retornar
para Alemanha, vê-se forçado a permanecer em Nova York, e se aproxima de uma
mãe (Kreuzer) e sua filha, Alice (Rotlländer). No dia seguinte, há um recado da
mãe, pedindo que ele viaje com Alice para a Europa. Phil apenas consegue
passagem para a Holanda. De lá, como a mãe de Alice não dá mais notícias, viaja
pela Alemanha em busca da casa de sua avó. Phil desiste no meio do caminho e a
deixa com a Polícia. Depois, muda de idéia e volta a viajar com a garota, agora
para o Vale do Ruhr, única referência que ela possui. Quando Phil viaja de
encontro a seus pais volta a encontrar o policial (Hirschmüller) que se
encontra a procura de Lisa. Enquanto o policial se encontra distraído, Phil e
Alice embarcam em um trem.
Na melhor fase de
sua carreira, Wenders apresenta personagens sem rumo e nem identidade
estabelecida que vagam a esmo por paisagens à margem de rodovias, tal como em
seu melhor filme, No Decorrer do Tempo (1976).
Aqui, de alguma forma essa angústia existencial ainda é contrabalançada pela
figura da criança. Como em seu filme posterior, igualmente se percebe uma sede
de realismo fenomenológico nas imagens que também era compartilhado por outros
cinemas novos contemporâneos (no brasileiro, notadamente em Iracema - Uma Transa Amazônica). Isso
fica muito patente quando o protagonista, por exemplo, afirma que os filmes
nunca mostram as coisas como elas realmente são, e o filme e apresenta uma Nova
York para além de ícones da cidade (o
Shea Stadium) também toda uma feiura e senso de cotidIano geralmente ausentes
dos próprios filmes americanos. E mesmo tais ícones são apresentados de um modo
completamente desglamourizado. A errância de Phil (por si só um nome
americanizado) não apenas remete à tradição do herói do faroeste (e a
conseqüente homenagem ao então recentemente falecido John Ford, maior nome do
gênero, seja através de um trecho de A
Juventude de Lincoln na tv ou de seu obituário no jornal) quanto a própria aproximação
ambivalente e descendente com relação à cultura pop americana, também
onipresente na trilha musical. Como no cinema novo brasileiro há igualmente uma
representação grandemente negativa da tv, como o símbolo máximo da banalização
das imagens. O mesmo pode ser aplicado à fotografia, já que Phil há todo
momento fotografa tudo com uma câmera polaroid, e acaba por afirmar que as
coisas fotografadas são bastante distintas da imagem que ele presencia. Resta
ao próprio cinema, portanto, essa capacidade de visualizar de modo “correto” a
realidade. Seus constantes travellings, expressão de um desejo
ainda mais intenso de se apoderar da realidade filmada e de seu momento que os
dos Irmãos Lumière, nos idos do cinema, são uma demonstração de que o enredo em
si mesmo se torna secundário diante de um personagem principal que acaba se
tornando a própria Alemanha. Como em seu filme seguinte, igualmente, há uma
menção de uma visita a casa paterna que aqui não chega a se concretizar. O
resultado final, repleto de achados visuais, como o sopro que “apaga” o Empire
State e o entediado garoto ao lado de uma juke-box escutando Canned Heat, ainda
que não tão radical e intenso quanto o de No Decorer do Tempo, já aponta certamente nessa direção. Filmverlag der
Autoren/WDR para Filmverlag der Autoren. 110 minutos.
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