Filme do Dia: Não Olhe para Cima (2021), Adam McKay
Não Olhe para Cima (Don’t Look Up, EUA,
2021). Direção Adam McKay. Rot. Original Adam McKay, a partir do argumento dele
próprio e de David Sirota. Fotografia Linus Sandgren. Música Nicholas Britell.
Montagem Hank Corwin. Dir. de arte Clayton Hartley & Brad Ricker.
Cenografia Tara Pavoni. Figurinos Susan Matheson. Com Leonardo DiCaprio,
Jennifer Lawrence, Meryl Streep, Cate Blanchett, Rob Morgan, Jonah Hill, Mark
Rylance, Tyler Perry, Timothée Chalamet, Ariana Grande, Ron Perlman, Melanie
Lynskey.
A doutoranda em astrofísica Kate
Dibiasky (Lawrence) casualmente descobre um cometa. Porém a alegria logo cede a
extrema apreensão, quando o dr. Randall (DiCaprio), a quem se encontra
subordinada, efetua um cálculo que prevê que o gigantesco asteroide se chocará
com a Terra em seis meses. Quando os dois, juntamente com o dr. Teddy
Oglethorpe (Morgan), cientista de maior renome, vão para a Casa Branca divulgar
a notícia, deparam-se com a demora de acesso à presidente, Madame Orlean
(Streep) e seu filho e assessor bufão, Jason (Hill). Com os resultados nada
proveitosos deste primeiro contato com a cúpula do poder americana, Kate e
Randall vão ao programa em que Brie (Blanchett) é uma das apresentadoras. Por
conta de seu descontrole emocional diante da dinâmica de um jornalismo
sensacionalista e raso, Kate vira motivo de memes, enquanto Randall provoca
atração de Brie, que se torna amante dele. Com a comprovação dos cálculos de
Randall por outros cientistas renomados, este é convocado outra vez a se
aproximar da Casa Branca e fazer parte de um grupo de trabalho designado para
criar um projeto que destruirá o cometa. O lançamento dos foguetes é observado
com esperança ao redor do globo. No seu comando vai o reacionário general
Benedict (Perlman). Porém, a operação é abortada após sua partida. O motivo é a
influência do terceiro homem mais rico do mundo, o visionário Peter Isherwell
(Rylance) sobre a madame presidente. Isherwell prevê uma ação que fragmente o
cometa Dibiasky em vários pedaços, pois ele é uma rica mina de elementos que
são base para a produção de celulares, atualmente monopolizados pela China.
Desiludida, Kate joga a toalha e vai trabalhar como caixa de supermercado,
sendo reconhecida por um jovem fã, Yule (Chalamet), que se torna seu namorado.
Enquanto isso, cada vez mais próximo do poder, Randall busca se reaproximar de
sua mulher, June (Lynskey). O cometa se torna visível a olho nu.
Já sendo vexatório para o espectador
assistir um curta-metragem com as premissas e escolhas narrativas aqui postas,
o que não dizer de um longo longa que sofridamente se acompanha um rosário de
clichês, de tipos e também de situações, assim como pretensões de comentário
sobre os pesadelos disruptivos contemporâneos. Tudo encalacrado, em um modelo
desavergonhadamente gasto de tão usado. E a madame presidente tonta e nada
sofisticada, uma espécie de antena de fake News, uma Trump de saias. Há
ainda seu guru bilionário, espécie de Elon Munsk, que consegue colonizar o bom
senso, a ciência e o poder, submetendo-os ao vil metal, e que findará
provocando o apocalipse – vivido de forma previsivelmente menos dramática que
sua versão autoral europeia (Melancolia). E aí o filme acaba por
demonstrar o quão é cativo da visão de mundo que tanto critica. Seja na
suavização do fim dos tempos, algo que é criticado por seus estoicos heróis,
seja no ódio que faz com que a presidente seja vítima de uma grotesca cena nos
créditos finais. E, mais importante, por seu descrédito com um mundo político
que é observado como derisório, para além de sua ocupação por um grupo
conservador e provavelmente de extrema-direita. Kate, por sua vez, está quase
sempre a um passo do choro e do descontrole emocional, demonstrando certo viés
misógino do filme para com as duas mulheres de maior destaque, para não dizer
três, já que a jornalista de Blanchett não fica atrás em sua articulada
competitividade, disposta na quantidade de títulos, línguas, amantes (dois ex-presidentes) e maridos (um
ex-secretário de Estado) de seu currículo. A postura agressiva de Brie, faz com
que deslize sua mão para a coxa do apatetado e infenso cientista de DiCaprio,
por baixo da bancada do telejornal que apresenta. Antípoda da simpática
mulher-mãe de Randall, que prescreve frente a amante, todas as medicações que o
marido toma, jogando-as literalmente em sua cara, e que irá recebe-lo de braços
abertos, e sensibilizada com as flores trazidas, quando este decide redirecionar o prumo rumo à virtude
temporariamente perdida, abandonando o círculo malvado do poder, após declinar
de ser cordial e sorridente no mesmo programa da amante, que o havia projetado
para este círculo. Se ao menos este uso ostensivamente caricato gerasse humor,
teríamos um descendente, inferior que fosse, ao Dr. Fantástico de
Kubrick. Não é o caso. Seu general reacionário, inclusive, pode ser um aceno
àquele, mas tal piscadela apenas o desfavorece. Já o elenco vistoso e painel
amplo de personagens, ou melhor, caricaturas, traz alguns que não disseram a
que vieram, como o de Chalamet ou o dr. Teddy de Morgan, que não seja talvez,
no caso do último, trazer o equivalente mínimo a uma cota racial no
elenco, e nos fazer ter saudades de
Altman. Hyperobjects Industries/Bluegrassfilms para Netflix. 138 minutos.
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