Filme do Dia: Barsaat (1949), Raj Kapoor
Barsaat (Índia, 1949). Direção Raj Kapoor.
Rot. Original Ramanad Sagar, a partir de seu próprio argumento. Fotografia Jal
Mistry. Música Jaikishan Dayabhai Panshal & Shankarsingh Raghuwanshi.
Montagem G.G. Mayekar. Dir. de arte S.N. Desai. Figurinos Goomers & Krishan
Kumar. Com Nargis, Raj Kapoor, Premnat Malhotra, K.N. Singh, Cuckoo, Nimmi, B.M.
Vyas, Ratan Gaurang.
Enquanto Pran (Kapoor) possui uma
visão poética e romântica da vida e das mulheres, seu amigo Gopal (Malhotra) é
seu extremo oposto, pragmático e decidido apenas a ter aventuras e iludir suas
“presas”, como Neela (Nimmi). Pran e Reshma vivenciam diversos obstáculos, como
o pai de Reshma, contrário a união, ao ponto de cortar a corda com a qual ela
buscava se unir a seu amado, após o pai ter afundado o barco em que ela fazia a
travessia. Uma desacordada Reshma é encontrada por um bruto pescador, que
decide que ela deverá casar com ele. Dada como morta, provoca um desinteresse
em Pran pela vida. Gopal tenta animá-lo, levando-o a uma prostituta, mas este
apenas se compadece da situação social da mesma, com filha bastante enferma, e
deixa dinheiro com ela sem buscar seus favores sexuais. Perturbado pela música
em um casamento a ocorrer na região, Pran perde o controle do carro e provoca
um acidente, sendo socorrido pelos que se encontravam na festa, que é
justamente o do casamento entre Reshma e o pescador. Socorrido e levado a casa,
os jovens amantes se reencontram e Reshma afirma ao pescador que ele é o homem
que ama, provocando a fúria do pescador, que tenta mata-lo, mas é preso pela
polícia. Enquanto isso, Gopal, tocado pela história de amor do amigo, busca
reencontrar a jovem Neela, mas chega com algumas horas de atraso, após ela ter
cometido suicídio.
Paralelos pontuais podem ser justificadamente tratados com o clássico mexicano Maria Candelaria. Ambos possuem seu casal amoroso se deslocando de barco pelas lagunas, mesmo o tema romântico sendo de longe mais enfatizado na produção hindu. Ambas se tornariam películas marcantes nas filmografias de seus países (do então chamado Terceiro Mundo). Há também diferenças a considerar. Em termos técnicos, o filme mexicano é disparadamente melhor produzido – basta, no quesito em questão, se comparar a cena do passeio de barco ao luar de Candelaria e Lorenzo Rafael, com os vários passeios do casal Reshma e Pran; os passeios do casal indiano são grotescas evocações com projeção ao fundo, sendo as tomadas em locação distantes, justamente para não se perceber que não são os atores, enquanto observamos com detalhe e foco os mexicanos na canoa. Apesar disto, de longe a produção indiana consegue criar um senso atmosférico maior, mesmo com seus cenários fajutos a gerar afirmações poéticas de um Pran, vivido não por acaso pelo próprio Kapoor, encarnação de um romantismo contra o pragmatismo cínico de seu amigo, sendo a mais tocante de todas os momentos que morremos em vida, e que necessitamos de um amor ao nosso lado. Sem falar que o filme indiano possui várias camadas, uma delas musical. E, talvez mais fundamental que tudo, há de longe maior carisma na construção da relação romântica do par principal, sendo um tanto indigente este quesito no caso mexicano. E há momentos de forte carga arquetípica, com uma filha dividida entre a pressão vigilante paterna, cuja imagem mais parece de um ícone de bronze, e seu amado a se desmanchar em seu violino, tão próximo dela, a ponto de escutá-lo. Destaque para um momento em que Ave Maria é tocada em sua forma instrumental, atravessando sequencias – de uma conversa entre Reshma e Gopal ao dia seguinte, quando visitam o hospital e Pran retira as bandagens do rosto. E para a cena na qual Bopal caminha rumo à câmera, e de sua cabeça emerge um fade. E se as coincidências existem porque não fazer uso delas, com Pran ferido sendo atendido na casa do noivo de Reshma e Gopal indo de encontro a sua iludida amada e a flagrando morta. Imagem que, aliás, encerrará o filme, e não a do outro casal unido. |All India Film Corp./R.K. Films Lmtd. 171 minutos.
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