Filme do Dia: O Ébrio (1946), Gilda de Abreu

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O Ébrio (Brasil, 1946). Direção: Gilda de Abreu. Rot. Adaptado: Gilda de Abreu, a partir da peça de Vicente Celestino. Fotografia e Montagem: Afrodísio de Castro. Música: Vicente Celestino. Cenografia: Lazlo Meitner. Figurinos: Ana Laura & Lilá. Com: Vicente Celestino, Alice Archambeau, Rodolfo Arena, Victor Drummond, Manoel Vieira, Walter D´Ávila, Júlia Dias, Arlete Lester.
Gilberto Silva (Celestino) é um homem que tenta a sorte sem sucesso na cidade. Abandonado por todos vagueia pelas ruas até conseguir guarida de um padre (Drummond). Tentando ajudar o padre a comprar um vitral para a igreja, inscreve-se em um concurso de calouros e ganha. Torna-se ídolo do rádio e consegue concluir seu curso de medicina.  Gilberto se sente atraído por Marieta (Archembeau), ambiciosa enfermeira. Casados e vivendo em uma mansão, Gilberto terá que lidar com sua família de oportunistas, entre os quais o primo José (Arena), que o trai com Marieta. Forjada uma situação de adultério por parte do primo, Marieta abandona a casa no mesmo dia em que o pai de Gilberto morre. Desesperançado, ele se finge de morto e doa todos os seus bens para o religioso. Um dia, na taverna com um companheiro igualmente alcoólatra, voltará a encontrar Marieta em situação semelhante. A perdoa, mas não aceita reconciliação.

Esse melodrama que é um dos maiores sucessos de bilheteria do cinema brasileiro possui uma estrutura sofrível, personagens caricatos, intepretações carregadamente teatrais – aliás a influência do teatro transcende em muito às interpretações e está igualmente presente na rasteira trama em que sempre olhos e ouvidos testemunham as ações dos personagens. Para não comentar as indefinições no roteiro – embora bem sucedido, a carreira de Gilberto como cantor subitamente desaparece e dá lugar somente a de médico – a pieguice atroz – representada, sobretudo, pelo subenredo da garotinha paralítica – e o humor escrachado que toma conta de diversos momentos da narrativa, aproximando-a por vezes das chanchadas da Atlântida. A dimensão infantilizada do protagonista é involuntariamente traída na cena em que ele se encontra na mesa ao lado de todos seus “coleguinhas” de orfanato, como se fosse apenas um retardário em meio ao grupo. Por outro lado como se não bastasse toda a carga moralista tanto implícita quanto explícita nos diálogos dos personagens, ainda existe a presença de um narrador off que vem a dialogar e aconselhar ou tecer comentários sobre os personagens que desaparece tão esquivamente quanto surge. O filme é antes de tudo veículo para Celestino, um dos mais populares cantores do rádio à época. Quando comparado a um melodrama indiano como Pyaasa que faz uso de recursos dramáticos semelhantes, como a vitimização do protagonista, igualmente cantor popular, e sua condição de pária, traições, descaso familiar, sucesso e decadência vertiginosos, tem-se dimensão da superioridade em termos de acabamento formal, produção e interpretações da realização indiana. Entre um dos momentos que se torna constrangedor ao olhar de muitas décadas após, está o da empregada negra dedicada de Gilberto ao lher afirmar que sua esposa possui “a alma mais escura que minha pele.” Cinédia. 107 minutos.

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