Filme do Dia: O Coração do Mundo (2018), Nataliya Meschaninova
O Coração do Mundo (Serdtse Mira,
Rússia/Lituânia, 2018). Direção: Nataliya Meschaninova. Rot. Original: Natalia
Meschaninova, Boris Khlebnikov & Stepan Devonin. Fotografia: Evgeniy
Tsvetkov. Montagem: Daria Danilova. Dir. de arte: Kirill Shuvalov. Figurinos:
Alana Snetkova. Com: Stepan Devonin, Dmitriy Podnozov, Yana Sekste, Ekaterina
Vasilijeva, Viktor Ovodkov, Evgeniy Sytyy, Aleksei Kashnikov.
Egor
(Devonin) trabalha como veterinário e ajudante de serviços gerais em uma grande
propriedade pertencente a Nikolai (Podnozov), acusada por ambientalistas de
maus tratos a animais. Sua vida está tão completamente imersa nas demandas da
propriedade, que se recusa a ir aos funerais da própria mãe, e esconde o
ocorrido da família. Ele também é solicitado aos avanços sexuais da filha de
Nikolai, Dasha (Sekste). Porém, as tensões vão se intensificando. O grupo de
ecologistas potencializa sua marcação. Egor destrói um drone do grupo que
filmava na propriedade de Nikolai. O grupo solta as raposas, principal fonte de
renda de Nikolai, no treinamento de cachorros, e também principal alvo dos
ecologistas. Enquanto algumas voltam, de três delas apenas se encontra os
cadáveres, tendo sido criadas em cativeiro desde o nascimento. Uma tia de Egor
vem atrás, sem sucesso, de que ele assine um documento liberando a herança da
mãe para ela, e ele a escorraça de casa. Enquanto faz sexo com Dasha, seu
filho, Ivan, corre desesperado em busca da mãe, e Egor afirma que não pode
continuar os encontros fortuitos com essa. Egor ataca as barracas onde se
encontram acampados os ecologistas, após uma noite em que teve que buscar
Nikolai, juntamente com sua esposa, de um porre fenomenal na casa de um
vizinho. Quando esse surge bêbado na cabana onde vive Egor, esse o espanca
fortemente. E leva sua cadela predileta para o canil, dormindo em meio aos
cachorros. Passada a noite, no entanto, um retorno às obrigações do trabalho se
tornam imperativas.
Não se
cumpre exatamente com as expectativas postas ao início dessa produção, sejam
elas quais forem – e talvez a aposta de um espectador que conheça algo de um
cinema autoral contemporâneo seja a da negação continuada do gozo de situações
dramáticas de maior calibre, no segundo longa ficcional de uma realizadora que
possui tanto ou maior experiência com séries para TV e também uma incursão pelo
cinema documental até o ano de sua produção. E como estudo psicológico de seu
personagem, vivido bravamente por Devonin, que colaborou igualmente com o
roteiro. Como em muitos filmes, infelizmente não se consegue sustentar o ritmo
de sua primeira metade. Mesa posta, pratos alinhados e se passa a chafurdar nas
inconsistências emocionais de seus dois personagens masculinos principais,
sobretudo Egor, sobre o qual paira o ponto de vista de todo o filme. E tal como
na pornografia, o que é sugerido talvez possua maior alcance erótico que o
propriamente desnudado, mais do mesmo. Ao se tornar um agregado sobre o qual se
põe demasiado peso nas expectativas, do pai que o explora no trabalho, da filha
para quem supre suas carências, ao mesmo tempo que serve como pai sobressalente
de seu garoto, Egor, filho de uma mãe alcóolatra e de uma família que pretende
manter distância, não encontra outra saída que a de deslocar sua afetividade
para a cadela, como ele, ferida – só que no caso dela fisicamente, ao ponto de
ser motivo de eutanásia para Nikolai. E, no limite, de abandonar a convivência
humana para se tornar ele próprio mais um cão dentre os outros. Derrapando da
metade para o final, estabelece-se certa pátina de catarse, sem que nenhuma das
questões tenha sido verdadeiramente superada. Mas, ao menos um rearranjo
provisório poderá se estabelecer. Até quando? A próxima bebedeira de Nikolai? A
queixa na polícia dos ecologistas pela violência ou até algo pior sofrida? Just
a Moment. 104 minutos.
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