Filme do Dia: Das Leben von Adolf Hitler (1961), Paul Rotha
Das Leben von Adolf Hitler (Al. Ocidental, 1961). Direção: Paul Rotha.
Rot. Original: Rotha, a partir do conceito de Helga Koppel & Robert
Neumann. Fotografia: Robert Krüger. Música: Siegfried Franz. Montagem: Paul
Rotha.
A marca mais indelével desse documentário é o ritmo sempre frenético
em que comentário ou (mais raramente) discursos (na voz deles próprios ou de
narradores dessa produção) de líderes nazistas são acompanhados por um
turbilhão de imagens de arquivo, algumas dessas pouco referidas antes e depois
– como as impressionantes dos estragos provocados pelo fogo ao
Parlamento alemão, provavelmente perpetrado pelos próprios nazistas, mas
utilizado como elemento de deflagração de ódio às esquerdas, tidas como
responsáveis pelo mesmo. Há uma ânsia
tão grande em narrar, que nem mesmo pausas para que se escute o discurso do
próprio Hitler são concedidas, sendo logo sua voz substituída por uma das vozes
over. Imagens que serão recuperadas
pelo documentário Uma Noite no Madison Square Garden (2017), a ilustrar a influência do nazismo em países
ocidentais – no caso os Estados Unidos – temerosos de uma aproximação com o
comunismo, surgem de forma breve, enfatizando a dinâmica da violência
(justamente o momento em que o orador simpatizante do fascismo é atacado por
alguém da multidão). Na Bélgica, imagens de chocantes agressões físicas em meio
à multidão. Na escalada totalitária a difusão da ideologia nazi nas
universidades, na igreja e na arte. Sinais contraditórios entre o discurso
(“não queremos guerra”, pacto de não agressão com a Polônia) e a realidade, na
obrigação ao serviço militar obrigatório, retirada da Liga das Nações, etc. Seu
belicismo é explicitado em sua intervenção direta na Guerra Civil espanhola,
representada sobretudo pelo massacrante bombardeio aéreo a Guernica. 1937. A
visita de Mussolini à Alemanha e um discurso apoteótico desse em meio a grandiloquência
da arquitetura de Nuremberg (evocada como nunca em O Triunfo da Vontade, inescapavelmente fazendo uso de várias cenas
desse, assim como de Olympia). O líder nazista que já se apoderou do domínio da Áustria, o hoje
pouco lembrado Dolfuss, morto logo após. O narrador enfatiza a lógica
sistemática da mentira, por parte de Hitler, que afirmara poucos anos antes que
qualquer um que propugnasse a guerra, apenas teria como consequência o
caos. A Inglaterra isolada sofre os
brutais ataques nazistas. Hitler já se encontra de olho em atacar a Rússia. É o
ano de 1940. Sua ideia é iniciar a ação, antes mesmo de concluída a guerra com
a Inglaterra, que continua resistindo. Hitler busca o apoio de Franco, mas após
9 horas e apertos de mão e sorrisos para a câmera, o ditador espanhol, que
havia tido apoio alemão durante a Guerra Civil, recusa-se a entrar na guerra. A
Operação Barbarossa, como ficou conhecida a invasão da União Soviética, é
adiada quatro semanas, enquanto Hitler decide invadir a Iugoslávia e a Grécia,
que havia sofrido ataques inesperados de seu aliado Mussolini. O avanço sobre o
campo soviético não se faz como Hitler havia imaginado. A resistência é maior
que qualquer outra já vivenciada pelos nazistas (e as imagens de combate provavelmente
as mais brutais). A imagem de um soldado alemão sendo varrido pelo vento gelado
em meio a neve é uma síntese poderosa desse revés. Hitler assume o comando das
forças alemãs, após afirmar que nenhum general possui a competência de seguir
seus planos à risca. Os Estados Unidos sofrem o ataque de Pearl Harbour. Quatro
dias após o ataque, em 7 de dezembro de 1941, o führer declara guerra ao país.
O roubo de milhares de obras de arte dos países capturados, ordenado por
Göring. Sobre os campos de concentração, seu momento mais interessante é o que
se lê as indicações de uma das firmas que prestaram serviço ao governo alemão
sobre como deveria ser o modo de utilização dos fornos de gás. Fotos demonstram
a proximidade, inclusive física, das indústrias alemãs dos campos de
concentração. Uma resistência surpreendente surge onde se menos espera ao longo
de toda a Europa, como é o caso da morte de Heydrich, seguida por extermínio de
toda uma aldeia tcheca, Lídice, em represália, mesmo não se possuindo qualquer comprovação de vinculação de moradores dessa ao atentado. Todos os
homens e garotos foram mortos. As mulheres enviadas aos campos de concentração.
A intransigência suicida alemã, ao negar-se inicialmente à rendição, provoca a
morte desnecessária de milhares de soldados alemães e soviéticos. A Alemanha, em recuo, sofre bombardeios
pesados dos aliados em suas cidades. Nenhuma delas é visitada por Hitler. É
reservado a Goebbels esse papel. Os guetos judeus, com o pequeno remanescente
que havia sobrado, são incendiados com as pessoas dentro dos edifícios. Somente
duas vezes Hitler publicamente teve que se manifestar a respeito da sempre
existente resistência ao nazismo. Quando do protesto levado a universidade por
Sophie Scholl (tema dos filmes ficcionais Os Cinco Últimos Dias e Uma Mulher Contra Hitler). A segunda foi em 20 de julho de 1944, quando um grupo de oficiais
nazistas tramou um atentado contra seu próprio líder que resultou em quatro
mortes, mas apenas ferimentos leves no Führer. Uma outra cena pouco comum nos
documentários reservados ao tema é o do procedimento de julgamento de um dos
mentores do atentado, em que o juiz berra aos pulmões os maiores impropérios. A
execução do mesmo, por asfixia lenta, também foi filmada, mas de tão chocante o
documentário abriu mão de incorporá-la ao seu rico material de arquivo.
Goebbels é quem surge mais uma vez com um discurso para elevar a moral do povo
alemão, em franca situação de derrocada, com garotos e velhos sendo
arregimentados para o exército. As
últimas imagens de Hitler, distribuindo medalhas, como se nada ocorresse,
dão-se dias antes de sua morte. E embora, sua imagem tenha sido constantemente
evocada, assim como suas decisões, o filme está longe de cumprir o que o seu
título promete, uma biografia do ditador sanguinário. Parece antes mais ser uma
proposta mais ambiciosa, uma biografia da guerra, e seus antecedentes, a partir
da perspectiva militar alemã. Dada a extensão dos arquivos percorridos em uma
diversidade de países (Áustria, Canadá,
Tchecoslováquia, Dinamarca, Alemanha, Itália, Holanda, Polônia, URSS, Reino
Unido e Estados Unidos) como faz questão de frisar a produção ao início,
imagine-se a enormidade de metragem percorrida, para as vezes não se ter mais
que alguns segundos de imagem, como foi o caso das que registram o comício fascista
no Madison Square Garden. Real-Film GmbH. 97 minutos.
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