Filme do Dia: Budapeste (2009), Walter Carvalho
Budapeste (Brasil/Hungria/Portugal, 2009). Direção: Walter Carvalho. Rot. Adaptado: Rita Buzzar, baseado no romance de Chico Buarque de Hollanda. Fotografia: Lula Carvalho. Montagem: Pablo Ribeiro. Dir. de arte: Marcos Flaksman. Cenografia: Zoltán Horváth. Figurinos: Kika Lopes. Com: Leonardo Medeiros, Gabriella Hámori, Giovana Antonelli, Antonie Kamerling, Nicolau Breyner, Ivo Canelas, Andrea Balogh, Tamás Puskás.
José Costa (Medeiros) é um
escritor-fantasma que vive no Rio de Janeiro escrevendo narrativas tornadas
sucesso no nome de outros autores, como o alemão Kaspar (Kamerling). Casado com
a apresentadora de TV Vanda (Antonelli), ele casualmente vai parar em
Budapeste, onde se envolve com uma mulher mais jovem, Kriska (Hámori), que lhe
faz aprender a língua húngara e onde se torna novamente escritor reconhecido
menos por si mesmo do que das obras que escreve para outros. Convidado a se
retirar do país, retorna ao Brasil. Porém, logo recebe uma ligação do consulado
húngaro que lhe concede visto permanente.
O estilo entrecortado que alterna
passado e presente, imaginação e realidade, Rio de Janeiro e Budapeste, arte e
vida, apresenta um mergulho na subjetividade de seu protagonista sem a
radicalidade (talvez cansativa) da adaptação do romance anterior de Buarque
para as telas, Estorvo. Aqui tudo, da bela fotografia à cuidadosa
direção de arte, das locações ao elegante trabalho de câmera, assim como a
montagem menos afeita a motivações eminentemente dramáticas, ajustam-se sem
maiores problemas aos protocolos de um cinema de arte europeu. Não são raras as
vezes que seu existencialismo soa empostado ou que personagens, como a vivida
por Antonelli, particularmente, soam demasiado caricatas, em sua
superficialidade e desejo de fama – não parece ser esse, ainda que por vias
mais perversas e aparentemente mais claudicantes e sofridas para ganharem uma chancela
de dor que toda experiência artística “profunda” se crê merecedora, o mesmo
desejo que, no fundo, acomete o próprio protagonista? Ou ainda que certas cenas
demonstram ser francamente desnecessárias, como é o caso da investida em um
clube do submundo de Budapeste. O resultado final, afinal de contas, tanto no
que há de melhor quanto de pior de sua errância procura espelhar o próprio
desequilíbrio de Costa. Ao mesmo tempo que consegue dar conta de modo
relativamente bem resolvido da ambiguidade entre objetividade e subjetividade,
mesmo que com momentos dispensáveis, como o do encontro com a efígie do artista
desconhecido, sua narrativa fragmentada também torna-se porto seguro contra
potenciais insuficiências crônicas da produção nacional como a falta de
sutileza da interpretação –exceção deva ser feita ao próprio Medeiros – ou
mesmo o desafio de tentar desenvolver uma narrativa dramática mais convencional
sem tais apelos. A má consciência quanto a questão da desigualdade social
brasileira surge como que numa nota de rodapé simplória até mesmo quando
confrontada com outras produções em que protagonistas também haviam construído
sua celebridade igualmente no exterior tais como O Príncipe ou O Maior Amor do Mundo. Entre algumas das cenas mais intrigantes se encontram
a da barcaça que atravessa o rio carregando a monumental estátua de Lênin
despedaçada e o momento em que, de volta ao Rio, José escuta Feijoada
Completa de Chico (presente em uma ponta) ser entoada em húngaro. A
sensação que se fica ao final é que falta uma certa cola que consiga trabalhar
muitas das questões lançadas pelo filme, inclusive o tom metadiscursivo que vem
a ser explicitado, de modo longe de original, ao final. Nexus Cinema e
Video/Eurofilm Studio/Stopline Films para Imagem Filmes. 113 minutos.
Comentários
Postar um comentário