Filme do Dia: Amargo Triunfo (1957), Nicholas Ray
Amargo Triunfo (Bitter Victory, EUA, 1957). Direção: Nicholas Ray. Rot.Adaptado:
René Hardy, Gavin Lambert, Nicholas Ray & Paul Gallico, a partir do romance
de René Hardy. Fotografia: Michel Kelber. Música: Maurice Leroux. Montagem:
Léonide Azar. Dir. de arte: Jean d’Eaubonne. Com: Richard Burton,
Curd Jürgens, Ruth Roman, Raymond Pellegrin, Anthony Bushell, Alfred Burke, Sean
Kelly, Christopher Lee.
Uma missão praticamente suicida é enviada do
Cairo a Bengasi. Os dois oficiais que comandarão o grupo são Capitão Leith
(Burton), mas experiente no contato com o deserto e amigo de um nativo, Mekrane
(Pellegrin), que conhece bastante o deserto e o oficial de carreira, Major
Brand (Jürgens), que se torna o comandante da operação. Leith e Brand possuem
algo em comum. Leith foi a grande paixão de Jane (Roman), atual mulher de
Brand. As hostilidades entre ambos são patentes desde o início da ação, quando
no ataque à fortaleza nazista, embora bem sucedida, Brand não possui coragem de
esfaquear uma sentinela, sendo observado por Leith e Mekrane. Após a missão
cumprida a travessia do deserto leva todos a exaustão. Quase picado por um escorpião,
Brand observa, sem nada fazer, esse entrar na calça de Leith, que é picado.
Posteriormente, quando Mekrane tenta ataca-lo é morto pelo mesmo. Leith morre
pouco depois. Não sem antes dizer mais uma vez o que pensa de Brand e entregar
uma medalha como lembrança a Jane. Retornando ao Cairo, Brand é condecorado por
seu superior.
Se os afetadamente explícitos, em termos de
provocar alguma sensação de desconforto,
créditos iniciais, típicos da época, suscitam de imediato a forte
possibilidade de uma ação imediata e eletrizante a se seguir, como nos
contemporâneos Samuel Füller ou Robert Aldrich, o que se segue vai na
contra-mão. Iniciando com um triângulo amoroso que se adivinha de imediato, a
partir de uma entrada em um bar, ainda que a música incidental e toda a
apresentação visual seja mais discreta que a de outra célebre situação do tipo,
em Casablanca, com um algo introvertido Capitão Leith, vivido por um
Burton próximo dos cacoetes de Montgomery Clift, que originalmente havia
sido pensado para o papel, entre algo alucinado e vulnerável e uma Ruth Roman
ensaiando ser blasée mas mal contendo a emoção. É com prazer perverso e
cínico que Leith/Burton responde a indagação da mulher de seu rival sobre o que
deverá afirmar ao marido com uma série de clichês de o quanto ele é bom,
heroico e que estará esperando por ele ao retornar. Ao contrário dos filmes
hollywoodianos produzidos à época, os alemães falam alemão e sem o recurso as
legendas (como nos filmes neorrealistas tal como Paisà). Os filmes de
Ray do período parecem sofrer do efeito do relativamente breve interstício
entre um cinema clássico consolidado e a revitalização (inclusive em termos de
realismo e verossimilitude) do cinema norte-americano a partir de cerca de
meados da década seguinte. Menos interessado nas ações vinculadas aos gêneros
(como em Johnny Guitar) que em trabalhar elementos de crítica social
e/ou, como aqui, sobretudo do perfil psicológico de seus personagens, não se
pode dizer que seu intuito seja cumprido a rigor nesse caso específico. Se, de
fato, sua intenção era o da crítica ao establishment militar, que privilegia os
oportunistas a custa dos verdadeiros heróis, não se pode dizer exatamente que o
personagem vivido por Jürgens seja propriamente um vilão. Se Jürgens é
contraditório, Leigh também o é, e inclusive admite sê-lo. Se é a venalidade
que faz com que Brand não consiga matar a sangue frio, mas o faça, em sua
legítima defesa, tampouco é exatamente algo que pese contra si. E, para
completar, alguém aparentemente tão preocupado com a carreira e a fama de herói
não agiria exatamente como ele o faz ao final, espetando sua medalha em um dos
bonecos, por mais que essa percepção tenha sido efetuada ao longo de todo um
processo, que inclui a morte de Leith e o aparente abandono da esposa, assim como
a rejeição dos soldados a ele – e, quer queiram quer não, ao longo do filme,
Brand, que curiosamente não possuía nenhuma experiência com o deserto, consegue
se manter mais firme que qualquer outro do grupo. Filmado na própria Líbia e em
estúdios na França. Columbia Pictures Corp./Transcontinental Films/Robert
Laffon Prod. para Columbia Pictures. 102 minutos.
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