Filme do Dia: Paterson (2016), Jim Jarmusch
Paterson (EUA, 2016).
Direção e Rot.Original: Jim Jarmusch. Fotografia: Frederick Elmes. Música: Jim
Jarmusch, Carter Logan & Sqürl. Montagem: Affonso Gonçalves. Dir. de arte:
Mark Friedberg. Cenografia: Lydia Marks. Figurinos: Catherine George. Com: Adam
Driver, Golshifthe Farahani, Rizwan Manji, Barry Shabaka Henley, William
Jackson Harper, Chasten Harmon, Kara Hayward, Jared Gilman, Sterling Jerins,
Johnnie Mae, Sophia Muller, Masatoshi Nagase, Nellie.
Paterson
(Driver) é um motorista de ônibus, amante de poesia e que descarta a
necessidade de um smart phone, mesmo quando ocorre uma pane no veículo que
dirige. Ele vive com Laura (Farahani) e o cão Marvin (Nellie). Paterson vive na
cidade de mesmo nome no estado da Nova Jersey e aproveita as horas vagas para
escrever seus poemas. Laura possui várias manias como pintar, aprender a tocar
guitarra – ela sonha com a possibilidade de vir a ser uma futura Tammy Wynette
– ou ganhar muito dinheiro com cupcakes. Certo dia Marvin faz picadinho do
caderno que Paterson escrevia seus poemas e Laura advertia continuadamente que
ele devia tirar uma xerox.
Dividido
em oito dias, iniciando e findando justamente pela segunda, o filme observa a
repetição dos atos cotidianos no melhor estilo do realizador, sem exatamente
uma trama posta, tirando partido grandemente de um humor (subliminar ou não)
dos absurdos cotidianos de forma ainda mais avessa a uma narrativa tradicional
que Kaurismaki. Como em outros filmes recentes do realizador, a exemplo de Amantes Eternos, também existe a
recorrência de planos do alto que filmam o casal protagonista, mas aqui sem as
firulas saracoteantes do outro, que possui uma aproximação excêntrica com o
filme de gênero distante daqui, em que a câmera permanece quieta nos planos em
questão. E, como naquele, também Doc, o dono do bar frequentado por Paterson,
possui igualmente seu “altar” de personalidades, boa parte delas que dizem
respeito à própria cidade, como o que ele afirma ser o seu cidadão mais
ilustre, Lou Costello da dupla Abbot & Costello – um filme da dupla está
entre os cartazes observados no cinema da cidade que exibe filmes antigos, Abott & Costello às Voltas com Fantasmas
(1948). Existem estranhas coincidências como vários personagens que cruzam
com Paterson amarem poesia – e o aficionado japonês ao final, vivido pelo mesmo
ator de seu Trem Mistério, parece
devolver a Paterson o impulso à escrita quando lhe deixa um caderno em branco
nas mãos – ou ainda o encontro recorrente com gêmeos, após Laura ter sonhado
que eles teriam gêmeos ou ainda as cataratas do pequeno quadro sobre a parede
logo após uma garota bem jovem lhe contar um poema que iniciava justamente com
uma. Ou seja, Jarmusch chama atenção para que o próprio cotidiano, mesmo imerso
no que pode ser tido como habitualmente mais modorrento, também é um espaço em
que a fantasia, de certa forma, erige a realidade, no que talvez seja um traço que alguns
críticos observaram como potencialmente conservador/conformista do filme. E é
justamente quando traz esse elemento onírico e não explicável por padrões
realistas para o filme que Jarmusch consegue como que chamar a atenção para o
filme em si mesmo enquanto construção narrativa de forma mais sutil que
realizadores com diferentes abordagens na mesma linha, de Godard a David Lynch.
O que Paterson escreve é observado sobre a imagem, em caracteres que reproduzem
a letra de alguém e nesse cotidiano que envolve o seu trabalho no ônibus, uma
saída para passear com Marvin e tomar um chope no bar de Doc após o trabalho, etc.,
existe o que talvez o que de melhor o filme traga, que são justamente aqueles
personagens que Paterson encontra uma única vez, mas que deixam sua marca de
forma indelével, ainda mais que a dos atores de apoio que surgem várias vezes.
Destaque para seus belos, suaves e relativamente longos fades em negro e sua
bela fotografia. O filme não deixa de
ser um tributo tanto a cidade de Paterson quanto ao livro de poemas de Willliam
Carlos Williams, que lá morou, de mesmo título. As quedas d’água (e talvez a
própria ponte?), observadas diversas vezes no filme, são tema do pioneiro Passaic Falls, New Jersey (1896), de
James H.White. O filme assistido pelo casal no cinema é A Ilha das Almas Selvagens (1932), de Eric C.Kenton. Amazon
Studios/Animal Kingdom/Inkjet Prod./k5 Film/Le Pacte. 118 minutos.
Comentários
Postar um comentário