Filme do Dia: Segunda de Manhã (2002), Otar Iosseliani



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Segunda de Manhã (Lundi Matin, França/Itália, 2002). Direção e Rot.Original: Otar Iosseliani. Fotografia: William Lubtchansky. Música: Nicholas Zourabichvili. Montagem: Otar Iosseliani & Ewa Lenkiwicz. Dir. de arte: Emmanuel de Chauvigny. Cenografia: Gabriel Cascarino. Figurinos: Cori d’Ambrogio. Com: Jacques Bidou, Anne Kravz-Tarnavsky, Narda Blanchet, Radslav Kinski, Dato Tarielachvili, Adrien Pachod, Pascal Chanal, Miriam Laidouni-Denis, Arrigo Mozzo.

Vincent (Bidou) mora em uma grande casa na região agrícola de Rhones, na França, juntamente  com sua idosa mãe (Blanchet), sua esposa (Kravz-Tarbavsky), Nicolas (Tarielachvili), seu filho mais velho, Gaston (Pachod), seu filho mais novo. A casa necessita de maior manutenção. Vincent trabalha numa fábrica e sua rotina, assim como a dos que o circundam, não parece ter grandes novidades. Como hobby, Vincent pinta pequenos quadros. Ele visita seu pai, que se encontra acamado, e esse lhe entrega um dinheiro, que Vincent resolve usar viajando para Veneza. Lá encontra com um companheiro do pai da época da guerra e com um amigo, Carlo (Mozzo), sobe em um telhado que possui uma vista privilegiada de Veneza e arredores.

Essa poética do cotidiano, a rarefação dos diálogos e a exclusão que deles possa brotar alguma continuidade de ação e a perseguição pela câmera dos pequenos gestos que acontecem às margens dos personagens principais, observadas com um potencial para o humor mais oblíquo que o de Jacques Tati, com quem sem sombra de dúvida inevitavelmente será comparado, acompanha praticamente todo o filme, que por vezes se descola, por vezes segue com maior assiduidade seu protagonista, vivido de maneira apropriada pelo produtor e não ator Bidou. Algo que se estende para praticamente todo o elenco, para quem essa será sua única experiência diante das câmeras ou, no máximo, participante de alguns outros poucos filmes do realizador. O que serve como luva aos propósitos do mesmo, cuja observação da interação do grupo como um todo, incluindo suas excentricidades e idiossincrasias – também observadas com toques de humor em personagens como o do amigo do pai em Veneza, vivido pelo próprio Iosseliani, que encena todo um fausto na vida pessoal e talento artístico para impressionar seu convidado – é o que, de fato, importa. Dito isso e grandemente bem sucedido no que se propõe, não há como tampouco se deixar de frisar certo teor conservador, tal como o presente nos filmes de Tati. Se aqui não se observa, a exceção do ambiente da fábrica,  com ironia o mundo moderno nem tampouco se faz exaltação de um universo pastoral em boa parte intocado pelos “vícios da modernidade” como naquele, acaba-se por se privilegiar as figuras masculinas como epicentros de onde tudo que de fato interessante possa ocorrer. Às personagens femininas, por exemplo, sequer se dota de nomes. Elas são mulheres, irmãs, filhas, amigas, mães dos personagens masculinos, como confirmam os créditos finais. Enquanto esposas, tratam seus maridos com um cuidado maternal, ajeitando os seus cachecóis antes de partirem ao trabalho. A recorrência com que certos motivos coletivos, como o dos homens que jogam fora os seus cigarros, que apenas conseguem tragar do pequeno trajeto que vai do ônibus até a entrada da fábrica mais que sugere um comentário depreciativo sobre o controle de corpos e mentes necessário para a disciplina não apenas do ambiente de trabalho, mas do mundo moderno como um todo – como alguém que não se rende ao mesmo, o protagonista esconde por vezes seu cigarro lá dentro. Seus pequenos gestos podem ser observados como uma saudável contraposição a tudo de massacrante que tais regras cotidianas podem sugerir, porém podem igualmente ser observadas, dependendo da perspectiva, como não mais que autoindulgentes, já que tampouco beneficiam ninguém além dele próprio, quando muito. É quase um grito – se um grito não fosse no rumo oposto ao minimalismo dos gestos e situações aqui apresentadas – em defesa de uma boa vida, do vinho, da amizade e do riso, todos ameaçados pela sordidez exasperante do trabalho alienado e alienante. Porém, o respiro que Vincent encontra é não mais que isso, já que seu retorno é igualmente o retorno ao cotidiano massacrante do trabalho.  De tudo isso o que se eleva como incólume é o próprio talento gráfico com que o filme, com seus habituais e relativamente longos planos, consegue captar uma dinâmica específica das relações sociais, a partir do que é apreensível pelo olhar. Prêmios FIPRESCI e direção no Festival de Berlim. Centre Européen Cinématographique Rhône-Alpes/Canal+/CNC/Cofimage 12/Gimages 4/Mikado Film/Pierre Grise Prod./Rhône-Alpes Cinéma para Blaq Out. 120 minutos.

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