Filme do Dia: Confissões Íntimas de uma Cortesã Chinesa (1972), Chor Yuen

 


Confissões Íntimas de uma Cortesã Chinesa (Ai Nu, Hong Kong, 1972). Direção: Chor Yuen. Rot. Original: Chiu Kang Chien. Fotografia: Chu Chia Hsin. Música: Chu Liang Fu. Montagem: Chian Hsing-Lung & Li Yen Hai. Dir. de arte: Chen Ching-Chen. Com: Lily Ho, Yueh Hua, Betty Pei Ti, Lin Tung, Wan Shan Shung, Fan Sheng Mei, Ku Chung Wen, Chan Shen.

Lady Chun (Pei Ti) recebeu uma nova carga de contrabando para seu bordel. Interessa-lhe particularmente Ainu (Ho), que não se dobra inicialmente aos interesses de Chun, temida inclusive por todos os homens da região. Ainu tenta fugir com um mudo que a salvara do suicídio, após ser violada. Os dois são flagrados, o mudo é morto e Ainu consente em se tornar amante e discípula do domínio das artes marciais quase sobrenatural que possui Chun. Essa costuma afirmar que são uma só, pelo domínio da espada e semelhança física. Ainu, no entanto, começa uma série de crimes de homens poderosos locais, que haviam feito uso dela como prostituta. Tudo isso tendo um investigar policial ao seu lado, assim como suas futuras vítimas do seu lado Após sua quarta vítima, Ainu assume todas as mortes como retaliação contra o que sofrera, solta garotas que iam ser levadas ao bordel e inicia um combate sanguinolento em que também terá que chegar às vias de fato com sua protetora, Lady Chun, que mata quase todos do bordel por ela.

A ausência de sutilezas é um ecesso que nem lhe sempre cai bem. E isso vale para o plano estilístico, repleto de zooms que rapidamente se transformam em closes no rosto de seus atores, atrelados ao seu equivalente “golpe sonoro” como – e principalmente para momentos que já antecipam que o ressentimento mortal de Ainu vale para todos, inclusive sua protetora; no momento que elas se abraçam, os olhos de Ainu envesgam de puro ódio para o espectador. Trata-se de um verdadeiro banquete, por outro lado, para um feminismo radical que pretende jogar com as mesmas armas que o inimigo – só a morte com requintes de crueldade para atenuar as humilhações sofridas, por mais que também não seja mais que um teatro (em linha análoga ao do contemporâneo britânico As 7 Máscaras da Morte) para um ressentimento que se disfarça em desejo e o que se poderia imaginar como sororidade tempos depois, mas que não poupa seu ódio para também as mulheres que a humilharam.  Trata-se de uma vingança pessoal, não exatamente de gênero. Fraquezas também existem no roteiro. Como todos os honoráveis da região não temem Ainu mesmo após sua fama de assassina? Seria uma referência ao sexo como demasiado próxima do eros e do tânatos ao mesmo tempo, mas muito mais provavelmente uma licença a mais de gênero que, somadas a todas as outras, abraça-se ou não. Por outro lado, como fantasia tresloucada sobre um ressentimento feminino que vai muito além do contextual, mas que alguns poderiam ver, não sem grande dose de misoginia, como da própria natureza e condição da mulher e da arrogância infantil masculina de a subestimar, o filme possui grande encanto. Tudo isso temperado a doses de dissimulação feminina cujo nome e encarnação máxima é Ainu. Ainu parece vingar o seu passado (e a história de exclusão feminina, particularmente na China), assim como  gerações de cenas em que a mulher sempre esteve como subjugada no próprio cinema e, juntamente com Lady Chun, tornar-se alguém tão irrealisticamente virtuosa no sabre quanto qualquer mestre da arte masculino, enfrentando, como aqueles, dezenas de opositores ao mesmo tempo. Que os golpes de efeito, tal como no noir, sejam mais efetivos que uma coerência psicológica convencional pode ser percebido no duelo final entre as duas protagonistas. O caráter de exploração sexual da nudez feminina e do erotismo lésbico é evidente, embora a ousadia do segundo, relativamente mais bem explorado, torne-se de fato instigante. Destaque para o inusitado momento do prólogo, que antecipa cena que somente será observada meia hora após o filme iniciado. Shaw Brothers. 90 minutos.

 

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