Filme do Dia: Coração Indômito (1950), Michael Powell & Emeric Pressburger
Coração
Indômito (Gone to Earth, 1950, Reino
Unido). Direção: Michael Powell & Emeric Pressburger. Rot. Adaptado:
Michael Powell & Emeric Pressburger, a partir do romance de Mary Webb. Fotografia:
Christopher Challis. Música: Brian Easdale. Montagem: Reginald Mills. Dir. de
arte: Hein Heckroth & Arthur Lawson. Figurinos: Ivy Baker & Julia
Squire. Com: Jennifer Jones, David Farrar, Cyril Cusack, Sybil Thorndike,
Edward Chapman, Esmond Knight, Hugh Griffith, Sybil Thorndike, George Cole.
A bela e jovem Hazel (Jones) vive algo isolada com o seu excêntrico
pai cigano, Abel (Knight). O aristocrático Jack Reddin (Farrar) a conhece e é
tomado imediatamente de paixão por ela. Hazel ama a todos os animais,
particularmente a sua raposinha de estimação. Quando vai cantar em um evento da
comunidade, encanta a todos, porém particularmente ao pastor Edward
Marston (Cusack), que passa a corteja-la insistentemente em casamento. Os dois
casam, mas Reddin continua a assedia-la. Sua relação com Reddin envolve ao
mesmo tempo desejo e repulsa, pois ele é um dos maiores caçadores da região.
Hazel, no entanto, não resiste a atração e foge de casa, deixando um bilhete ao
marido. Ela passa a viver no castelo de
Reddin. Edward sabe do ocorrido através de sua velha mãe (Thorndike) e vai até
a propriedade de Reddin. Esse não se opõe grandemente a partida de Hazel.
Quando Hazel retorna à casa, a mãe de Edward e sua criada abandonam o local.
Com toda a comunidade sabendo do episódio, o conselho religioso local faz uma
visita, mas Edward, que perdoou a esposa e ao mesmo tempo se sente culpado pelo
ocorrido, os escorraça. O desaparecimento de Foxy, a raposa de estimação, em
plena caça à raposa, suscitará uma tragédia.
Essa produção curiosamente mescla o que havia de mais espalhafatoso em
termos de produção e fantasia do cinema britânico (a dupla Powell &
Pressburger) com o mais megalomaníaco dos produtores hollywoodianos (Selznick e
sua estrela-esposa Jones). O resultado, ao menos nessa versão - já que Selznick
ganhará uma batalha legal e haverá o lançamento de outra produção com pouco
mais de 80 minutos e o título original Wild
Heart dois anos após - por sorte acaba pendendo para Powell &
Pressburger. De fato, há a inteligência característica da dupla na elaboração
dessa fábula em que, como outras mais célebres da dupla (Narciso Negro, Sapatinhos Vermelhos) é o desejo pulsante que mobiliza a dupla principal. Para além
desse, ou mesmo configurando sua moldura existe a criação de um senso
atmosférico que, ainda que longe de suas melhores obras, consegue evocar o
panteísmo pagão envolvendo a protagonista e seu coração selvagem com a
natureza em geral e sua raposa de estimação em particular, traçando um evidente
paralelo entre a perseguição de Hazel por sua conservadora comunidade e o da
raposa pelos cães de caça, selando o trágico destino de ambas; se é verdade que
o marido-pastor “a absolve”, o narrador não, ainda que tendo em conta suas
limitações diante de uma adaptação literária. Farrar repete aqui o papel de
conquistador de Narciso Negro, sem a
gentileza daquele vivido lá. Jones está comovedora como a expressão “autêntica”
da natureza sob forma de gente, cujo canto e simplicidade toca a toda a
comunidade que depois a condenará. Se no filme anterior, a paixão competia com
a sublimação religiosa, aqui ela possui um páreo mais fraco, o amor
dessexualizado do marido. Seu tom fabular, alegórico e algo panteísta parece
antecipar elementos do clássico O Mensageiro do Diabo (1955), de Charles Laughton. The Archers/London Film
Prod./Vanguard Films para British Lion Film Corp. 110 minutos.
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