Filme do Dia: Carta para Jane (1972), Jean-Luc Godard & Jean-Pierre Gorin


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Carta para Jane (Letter to Jane, França, 1972). Direção e Rot. Original: Jean-Luc Godard & Jean-Pierre Gorin.
Com a possível exceção de Vento do Leste, trata-se da produção mais interessante da  fase marxista do cineasta e certamente a  mais lúcida e penetrante análise sobre temas recorrentes ao período em questão. Partindo de uma relação problemática tida com a atriz Jane Fonda durante as filmagens de seu Tudo Vai Bem (1972), realizado pouco antes, Godard constrói com habilidade praticamente ímpar, a leitura de uma famosa foto publicada em L´Express de Jane Fonda em sua viagem de apoio ao povo vietnamita, no qual a análise estética se torna um canal para observações argutas sobre políticas de representação do outro numa sociedade espetacularizada e sua provável recepção nos EUA, Europa ou Vietnã. Não fazendo uso mais que predominantemente de fotos fixas, sobretudo da referida fotografia na qual se baseia o ensaio e da tela em negro na qual somente se sobressai os comentários, toda a estrutura formal desse média-metragem é calcada no desejo de ser o mais “científico” possível na análise: para tanto Godard utiliza-se além de seus inspirados comentários, da seriedade irônica da voz off e de seu alerta de que se utiliza de Fonda apenas enquanto expressão genérica de uma atriz e pacifista americana no Vietnã. Embora não convença em sua pretensa objetividade com relação à atriz, retratada do modo mais antipático e superficial possível de modo maldosamente vingativo, o que importa é que sua análise consegue transcender algumas de suas motivações particulares, traindo momentos de bom humor, como quando equipara o olhar de Fonda ao de seu pai, Henry Fonda, enquanto representação da perpetuidade de uma mesma ideologia de dominação e conservadorismo, em contraposição a uma poética da individualidade que acredita existir nostalgicamente nos astros do cinema mudo como Valentino ou Lilian Gish, identificando a ascensão do cinema sonoro como portador da mensagem do New Deal. Ao final das contas, em linhas gerais, sua análise acaba por enfatizar os usos e interesses peculiares de cada um dos interessados. Se aos vietnamitas interessava utilizar Fonda para seus propósitos ideológicos e pouco importava sua fala, os elementos vietnamitas se tornam evidentes coadjuvantes na composição da imagem, e sua veiculação nos meios de comunicação de massa do Ocidente quanto ao seu pretenso caráter de denúncia, conseqüentemente, completamente despido de eficácia. Por outro lado, pode ser acrescentada a essas leituras a própria leitura efetuada por Godard que, mesmo efetuando provavelmente a mais completa abordagem de uma fotografia por parte do cinema, tampouco deixa de idealizar excessivamente a figura do vietnamita enquanto representante de suas simpatias maoístas – felizmente evidenciadas aqui de maneira muito tangencial em relação a outros filmes do período como Sons Britânicos. De qualquer modo, é brilhante o radicalismo com que evidencia a construção arbitrária embutida em qualquer imagem veiculada pela grande imprensa, fazendo uso além da própria imagem, do texto como fundamental manipulador da mesma. Duas ou três vezes Godard faz menção ao Tio Brecht, sobrepondo uma foto de Bertolt Brecht aos comentários e faz igualmente uma paródia do Efeito Kulechov, a partir de fotos fixas, e com fins evidentmente políticos.  Sonimage. 52 minutos.

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