Filme do Dia: Meu Passado Me Condena (1961), Basil Dearden

 


Meu Passado Me Condena (Victim, Reino Unido, 1961). Direção: Basil Dearden. Rot. Original:   Janet Green& John McCormick. Fotografia: Otto Heller. Música: Philip Green. Montagem: John D. Guthridge. Com:  Dirk Bogarde, Sylvia Syms, Dennis Price, Anthony Nicholls,  Peter Copley,  Norman Bird,   Peter McEnery,  Donald Churchill,   Derren Nesbitt,  John Barrie,  John Cairney, Margaret Diamond ,  Hilton Edwards.

Melville Farr (Bogarde), magistrado de reputação ilibada, estremece com as ligações seguidas de Jack Barrett (McEnery), uma relação homossexual  que levara paralela ao casamento com Laura (Syms). Temendo chantagem, Farr acabará descobrindo através do amigo de Barett, Eddy (Churchill) que Barrett na verdade se suicidara após tentar arranjar o dinheiro para pagar aos chantageadores e não envolvê-lo na situação. Farr descobre existir uma quadrilha que sistematicamente age chantageando vítimas que observam em um bar que é ponto de encontro de homossexuais. Uma das vítimas, um cabelereiro, não resiste e tem um ataque cardíaco. Farr pretende utilizar sua notoriedade para levar o caso adiante, seja contatando uma das vítimas, um famoso ator , que nega tudo, ou ainda pagando a chantagem de um filho da alta sociedade que não possui o dinheiro suficiente e teme ser deserdado caso seu pai venha a saber sobre sua identidade sexual. Sempre resistindo a continuar sendo chantageado, Farr se vê acossado entre decidir por fazer a denúncia do crime e ver a sua carreira comprometida ou silenciar sobre tudo e posteriormente ser acusado de pactuar com a chantagem, no momento em que se encontra prestes a ser promovido. Ao mesmo tempo, sua mulher, que já sabia das aventuras homossexuais de Melville anteriores ao casamento, surpreende-se e vive um momento de grande instabilidade emocional. Melville, juntamente com o Inspetor Harris (Barrie), prende em flagrante a quadrilha, que inclui uma funcionária da loja de uma das vítimas, Miss Benhan (Diamond). Disposto a ir a julgamento e sem pedir anonimato, Melville pede a esposa que se afaste temporariamente até que o caso sai de evidência e que volte para ele se ainda o quiser, já que ele acredita que necessita mais do que nunca dela. Ela, após um tempo, concorda.

Esse curioso suspense une à todas as convenções trabalhadas - até de melhor forma - pelo cinema clássico americano, um tema bastante ousado para a época. Mesmo que o motivo a priori tenha sido o de provocar sensacionalismo, a abordagem que o tema da homossexualidade recebe não deixa de ser democrática, apresentando toda a opressão social, inclusive reproduzida em muitos dos homossexuais que se conformam por serem “contra a natureza”, mas também a simpatia de uma mulher que frequenta a boate e a reação final do casal Farr, com a corajosa tomada de decisão de Melville, que vai de encontro à hipocrisia da sociedade. Também apresentando a curiosa neutralidade do investigador, que quando indagado sobre Melville em relação ao que acharia das leis judiciais serem um prato cheio para a ocorrência de chantagens contra homossexuais, responde apenas cumprir seu dever e não possuir sentimentos. Apresentando nos créditos uma montagem e ângulos pouco convencionais, a forma acaba se adequando à estrutura convencional da narrativa. Com uma trama que investe de maneira quase obsessiva na narrativa de investigação, perdendo provavelmente ao secundarizar o drama humano e existencial dos principais envolvidos. O  filme também possui um viés irônico e cômico subterrâneo, presente, por exemplo, na personagem farsesca de Miss Benhan, caricata com  seu discurso de militância anti-homossexual e pateticamente sóbria no momento da prisão, caracterização que se opõe ao tom dramático que as personagens principais vivenciam. Foi citado, ainda que pejorativamente, como precursor ao lidar abertamente com a tématica homossexual - mesmo que faça lá também seus rodeios antes de revelar explicitamente do que se trata -  pelo documentário O Celulóide Secreto, espécie de antologia de títulos sobre o tema em língua inglesa. Boas interpretações de Bogarde e Syms. Allied Filmmakers/ Parkway/Rank. 90 minutos.

 

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Filme do Dia: Der Traum des Bildhauers (1907), Johann Schwarzer

Filme do Dia: El Despojo (1960), Antonio Reynoso