Filme do Dia: Ravina (1958), Rubem Biáfora
Ravina (Brasil, 1958). Direção Rubem
Biáfora. Rot. Original Rubem Biáfora & Flávio Tambellini, a partir do argumento de Walter Guimarães Motta. Fotografia H.E.Fowle. Música Enrico Simonetti. Montagem Mauro Alice. Dir. de arte Pierino
Massenzi. Figurinos Sílvio Ramiro & Pia Santos. Com Eliane Lage, Pedro
Paulo Hetheyer, Sergio Hingst, Mário Sérgio, Victor Merinow, Carlos Alberto,
Ruth de Souza, Lola Brah.
Ravina
(Lage), vive com o tio Daniel (Hingst), em uma propriedade decadente, uma
sombra do que fora quando da maior pujança da família. Os dois parecem se
encontrar praticamente imantados ao passado, as lembranças da família e uma
impossibilidade de seguir adiante com suas vidas. Com a chegada do engenheiro
que pretende construir uma ponte, Márcio (Mário Sérgio), Ravina é dominada por
uma paixão fulminante. E o mesmo parece se dar da parte dele. Pouco depois
chega André (Merinow), um primo e único remanescente, como os dois, de um dos
ramos da família. O engenheiro espera em vão por Ravina para um encontro
marcado no lago. Porém, essa passeia a cavalo com André. Márcio observa Ravina
a dançar com André e parte desesperançado para a cidade. Mas, certo dia, retorna,
e ele Ravina repetem suas juras de amor e desejo de casamento. Um obstáculo a
mais surge. Um credor, Otto (Hetheyer),
que possui o direito à propriedade, e também acredita o direito a
própria Ravina, tendo poder sobre o tio dela, pelas dividas e de André, pela
realização de negócios escusos.
Embora uma
influência confessa seja o romance O Morro dos Ventos Uivantes, e
provavelmente sua adaptação cinematográfica mais célebre, de exatos vinte anos
antes, essa produção também soa um genérico de bem inferior qualidade do
ciclo de filmes góticos hollywoodianos dos anos 1940, e não apenas
tematicamente, já que sua música e movimento de câmera também se encaminham na
trilha do excesso. E, mesmo do aberto ridículo, como a declaração de paixão até
a morte de Ravina pouco depois de encontrar Márcio. Não faltam a inevitável
escadaria e o quadro de uma antepassada na parede. Seus diálogos conseguem soar
ainda mais artificiais e pomposos que as produções sério-dramáticas da Vera
Cruz, de quem herda a sua estrela feminina mais conhecida, Eliane Lage,
bastante limitada como atriz, e atuando em seu último papel de uma curta carreira. E não apenas ela, também Mário Sérgio, Lola
Brah, Ruth de Souza, dentre outros. Tudo ressoa a cinema ou literatura, como é
o caso da representação da anciã errante que é atormentada pelas crianças. O
que nem seria um mal em si, se fossem trabalhadas a partir de uma inserção em
uma boa construção atmosférica, o que talvez seria a ambição (ou pretensão)
maior de Biáfora. As demonstrações de cultura popular seguem a mesma linha da
representação da mulher errante em sua artificialidade, além dos personagens
envolvidos com Ravina e a própria serem o centro de atenções com o qual
interagem, demonstrando que o mundo se encontra a serviço da trama de amor que
se parece anunciar trágica. Quase uma fantasia (ou pesadelo, a depender da
perspectiva) erótica feminina, o filme traz quatro homens orbitando em torno de
uma mulher. E se todos se encontram obcecados, um único é amor (portanto
digno), dois são possuídos pela paixão descontrolada, e a atacam um após o
outro, e o quarto tem os impedimentos dos laços de sangue, mas tampouco deixa
de ser incomodado por ela, como fica evidente na cena inicial, em que
subitamente a afasta de seu peito. E, como uma herança tão forte quanto a que
Ravina acredita ter herdado da mãe e sua morte misteriosa, os ocasionais belos
movimentos de câmera, sobretudo o que é feito ao lado de uma roda como
introdução a um número artístico em uma feira de diversões, é uma demonstração
de certa virtuosidade técnica e nada além – não por acaso realizado pelo mesmo
fotógrafo do estúdio mais famoso da década no país, Chick Fowle. Noutro
momento, consegue maior efeito dramático – e conseguiria ainda mais se Lage
fosse uma atriz de maior talento – quando aproxima belamente a câmera de uma
Ravina consumida pela dor e impotência diante da morte de seu amado e da
indiferença dos sobreviventes, apoiada pelo tio. E como se não bastasse todo o
filme ser uma panóplia de clichês hollywoodianos, ainda existem referências
mais específicas, como a de Ravina descer com o mesmo vestido que pertencera a
mãe e se encontra imortalizado no quadro à parede, que é uma das cenas
climáticas de Rebecca, de Hitchcock. O filme também é distribuído pela
mesma companhia norte-americana que distribuiu boa parte dos filmes da Vera
Cruz no exterior. Brasil Filmes lmtd./Selig Studios para Columbia Pictures do
Brasil. 112 minutos.
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