Filme do Dia: O Homem Que Viu o Infinito (2015), Matt Brown
O Homem Que Viu o Infinito (The
Man Who Knew the Infinity, Reino Unido/EUA/Hong Kong/Singapura/Emirados
Árabes Unidos/Índia, 2015). Direção Matt Brown. Rot. Adaptado Matt Brown, a
partir do livro de Robert Kanigel. Fotografia Larry Smith. Música Coby Brown.
Montagem JC Bond. Dir. de arte Luciana Arrighi & Andrew Munro. Cenografia
Ann Maskrey. Maquiagem e Cabelos Louise Coles & Cate Hall. Com Jeremy Irons, Dev Patel, Malcolm Sinclair, Raghuvir Joshi, Toby Jones, Kevin McNally,
Dhritiman Chatterjee, Stephen Fry, Jeremy Northam, Arundathi Nag, Devika Bhise.
1910,
Índia. Recém-casado com Janaki (Bhise),
que não consegue compreender o fascínio do marido pelos números, Ramanujen
(Patel) chama a atenção do eminente matemático de Oxford, G. H. Hardy (Irons),
após lhe enviar cartas com problemas matemáticos complexos, que se destacam em
meio à enxurrada de correspondências insólitas recebidas por ele. Após algum
tempo, Hardy consegue que Ramanujen venha passar uma longa temporada na
universidade, contra os desejos de Janaki e de sua mãe, que crê fortemente que
sua casta não permite uma viagem para um lugar tão distante. Após sua chegada,
e o ceticismo em relação à sua pessoa, as pessoas próximas de Hardy, aos poucos
vão se dando conta da grandeza do jovem, como o amigo de Hardy, Littlewood) e até mesmo o cético e
xenofóbico Major McMahon (McNally). A tensão entre Hardy e Ramanujen se acentua
com os pedidos de Hardy para que Ramanujen teorize e traga comprovações sobre o
que escreve, ao mesmo tempo que não consegue romper o dique emocional para que
a amizade entre ambos possua sempre uma grande distância, o que somente
ocorrerá a partir do momento que o indiano se encontra demasiado fragilizado
pela tuberculose, partindo de volta ao seu país natal.
Antes
mesmo da primeira imagem diegética emergir já se tem um apanhado de indícios
nada alvissareiros sobre o que nos acompanhará, e lógico nossa torcida é que
tais indícios sejam meros detalhes frívolos: o rebuscado dos títulos; a
epígrafe laudatória de Bertrand Russell à matemática; a presença de um astro
anglo-saxão e outro “oriental” nos dois créditos principais; sua trilha sonora
de acordes discretos mas, ao mesmo tempo, bastante audíveis; uma elaboração que
antecipa um filme de época (e James Ivory possivelmente surgindo como padroeiro
fictício da empreitada); e last but not least, como esquecer o
inescapável baseado em eventos reais? É tão previsivelmente irritante a estampa
de “bom selvagem” a ser colada em Ramanujan, deixando as ambiguidades
inconfessáveis da alma humana (ao menos à época, quando se sugere a
homossexualidade de Hardy) ao europeu. Não que os tipos superficiais das duas
histórias não pudessem ter tais elementos, mas a forma como são elaborados
apenas parecem reproduzir a mesma lógica que aparentemente pretendem se
contrapor, eurocêntrica, colonial, racista. O intuitivo, exagerado a
infinitesimal potência, fica a cargo da criatura provinda da “natureza”,
enquanto as provas de suas intuições, que o levarão a ser ao menos publicado,
ao incentivo ranzinza de seu racional tutor. Para Ramanujen o cálculo
matemático é tão natural quanto se respirar. Ele, de quem não vimos nenhum
incentivador de seu dom na Índia. E que afirma sua graça ter advindo da sua
crença para um incrédulo britânico. E que tenha sido produzido por Pressman,
conhecido por seu cultivo de espíritos independentes como Malick ou os Coen,
não é exatamente surpresa, dada a amplitude do leque de tal noção em um
universo tão estupefacientemente corporativo e massificado quanto o americano-anglo
saxão. E como se não bastasse todas suas debilidades dramáticas, ainda se junta
à equação um desnecessário ataque fictício de um dirigível à Oxford, a poucos
metros de nosso herói. Era mais digno não cria-lo e se ficar com as armas já
dispostas. Até porque é um episódio sem grande retorno dramático. E alguém
duvida que a situação limítrofe da saúde de Ramanujen quebrará a casca de
frieza emocional na qual se refugiou Hardy? E que o último até fará um discurso
emocionado indagando quem é o corpo docente da universidade para julgar
Ramanujen? E o quão estes retratos biográficos escanteiam as figuras
abertamente racistas-nacionalista enquanto colocam em primeiro plano, figuras
de uma relação exemplar, ética, ainda que progressivamente construída, ou ao
menos assim elaborados, a exemplo de outro filme a trabalhar com o mesmo mote e
também com uma dupla histórica envolvendo uma britânica e um indiano – Victoria e Abdul: O Confidente da Rainha. O sofrimento do indiano pela
distância da mulher, e vice-versa, não pode ser sentido por um espectador mais
sofisticado quando se recorre a expedientes tão melodramaticamente rasos e
protocolares – aliás toda a personagem da esposa se encontra embebida dos pés à
cabeça neste tônus. O de Hardy pode criar até certo páthos, mas resta recuperar
as apostas iniciais e seus maus presságios. A exceção talvez fique pela
apressada filiação a Ivory. Não se sustenta, não apenas pelo filme não ter os
laivos demasiado obsessivos com a ditadura da direção de arte, mas por conta de
até mesmo Ivory construir situações dramáticas mais envolventes. |Pressman
Film/Animus Films/American Ent. Investors. 108 minutos.
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