Uma Noite em Miami...(One Night in
Miami..., EUA, 2020). Direção Regina King. Rot. Adaptado: Kemp Powers, a
partir de sua peça homônima. Fotografia Tami Reiker. Música Terence Blanchard.
Montagem Tarik Anwar. Dir. de arte Barry Robison & Mark Zuelzke. Cenografia
Tamar Barnoon & Janessa Hitsman. Figurinos Francine
Jamison-Tanchuck. Com: Kingsley Ben-Adir, Leslie Odom Jr., Eli Goree, Aldis Hodge, Lance Reddick,
Christian Magby, Joaquina Kalukango, Nicolette Robinson.
Malcolm X
(Ben-Adir) se reúne em uma modesta hospedaria de Miami à noite com três das
personalidades negras mais famosas dos Estados Unidos de então, Jim Brown
(Hodge), astro do futebol americano que está começando a ingressar em carreira
de ator no cinema, Cassius Clay (Goree), na noite em que acaba de ganhar o
título mundial dos pesos-pesados no boxe e o popular cantor soul Sam Cooke
(Odom Jr.). Não apenas uma reunião de congraçamento, já que pontuada por
tensões, como a cobrança de Malcolm X a respeito da postura distanciada de
evocar a realidade social sofrida pelos negros no país nas letras de Cooke ou
de Clay quando Malcolm anuncia que sairá do Reino do Islã. A reunião terá que
ser interrompida com a chegada de um batalhão de jornalistas querendo entrevistar
Clay.
Consegue expressar a
encruzilhada ou opções possíveis para algumas das celebridades negras mais
significativas de sua época nos Estados Unidos, sem cair em um esquematismo
moral com relação as suas formas diferenciadas de vivenciá-la e sua forma de
negociar (ou não) com o establishment branco do país nas áreas da cultura e dos
esportes, reunindo cinco dessas celebridades para um encontro ficcional em
Miami. Igualmente, porém, tropeça em algumas pedras nem de longe
insignificantes. O dissenso que gera conflito no grupo é apaziguado pela
liderança inquestionável da figura mais intelectualizada (e também mais
radical) do grupo, Malcolm X, deixando que os “golpes baixos” sejam observados
apenas ao arrepio da narrativa e em flashback – caso da armação feita por James
Brown em relação a Sam Cooke no momento de sua apresentação. E o mesmo vale
para o domínio do primado sobre os “irmãos” de Malcolm que também se encontrava
na hora h e no local l de dois dos envolvidos na reunião, e não por acaso os
dois mais destacados, Sam Cooke e Cassius Clay, em vias de se transformar em
Muhammad Ali. E para as mudanças que os dois terão como “ponto de virada”, tal
como o abraçar do socialismo nos filmes soviéticos de vanguarda da década de
1920. Também não esconde sua origem teatral na sua dependência dos diálogos e
de pouca mudança de cenários, o que pode ser aflitivo para o espectador que
queira mais ação e menos palavras. King consegue um grande equilíbrio de seu
elenco, de nomes ainda relativamente desconhecidos, ao menos do público
internacional. E das figuras públicas que a peça se apropria (ou ao menos o
filme, caso haja diferenças nesse quesito), a que possui menos a ver com as
inquietações de Malcolm é a única que se encontra viva no momento de sua
produção, o que pode ser explicado na ficção por já se encontrar em final de
carreira, ser mais velho e, portanto, potencialmente menos fácil de ser
influenciado pelo líder mas que no plano da produção do filme (e antes dele, da
peça) talvez tenha a ver com o temor de algum processo judicial. De todos,
aliás, ninguém ficou mais fisicamente próximo de seu personagem, uma
especialidade desse tipo de produção, que Hodge. Estreia ficcional de
King no cinema, sendo bastante atuante como diretora de tv e ainda mais como
atriz. ABKCO Films/Snoot Ent. para Amazon. 114 minutos.
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