Filme do Dia: Alemanha, Ano Zero (1948), Roberto Rossellini

 


Alemanha, Ano Zero (Germania, Anno Zero, Itália/França/Alemanha, 1948). Direção : Roberto Rossellini. Rot. Original: Roberto Rossellini, Sergio Amidei, Carlo Lizzani, Max Kolpé, a partir de uma ideia de Basilio Franchina. Fotografia: Robert Juillard. Música: Renzo Rossellini. Montagem: Eraldo Da Roma. Dir. de arte: Piero Filippone. Com: Edmund Moeschke, Ernst Pittschau, Ingetraud Hinze, Franz-Otto Krüger, Erich Gühne, Jo Herbst, Barbara Hintz, Karl Krüger, Hans Sangen.

Alemanha do imediato pós-guerra. Edmund (Moeschke) vive de pequenos furtos e biscates, assim como os que lhe dá um pedófilo, que havia sido seu professor (Gühne), para ajudar a família que passa por sérias necessidades, com o pai (Pittschau) bastante enfermo, o irmão Karl-Heinz (Krüger) se escondendo da polícia por ter desertado e a irmã Eva (Hinze). Perturbado pela recorrência do pai em querer morrer para não mais ser um peso para a família, reforçado pela irritação do proprietário com o atraso dos aluguéis e a prédica de seu ex-professor que afirma que para os fracos o melhor destino é a morte, Edmund envenena o pai, no mesmo dia em que Karl-Heinz se entrega às forças policiais. O garoto, cada vez mais distante da família, tenta retornar ao grupo de crianças e adolescentes com o qual praticava furtos, mas é escorraçado por Thilde (Hintz), a garota que ocasionalmente lhe demonstrara simpatia, após ter tido seu ato duramente condenado pelo ex-professor, ao lhe contar que matara seu pai.  Confuso, joga-se do alto das ruínas de um prédio abandonado.

O último filme da segunda trilogia de Rossellini, mesmo menos interessante que os dois anteriores (Roma: Cidade Aberta, Paisà), sinaliza para um modo de efetuar sua narrativa guiada por um distanciamento emocional que não provoca um processo de identificação fácil com as situações e personagens apresentados – para efeito comparativo, basta se tomar a forma como Rossellini apresenta seu Edmund, vivido por uma criança que nunca mais faria cinema e praticamente infenso a qualquer construção psicológica mais precisa  em sua máscara facial constante e o garoto de Ladrões de Bicicleta. Se o cenário árido das ruínas de uma Berlim reforçam o padrão de um mundo de distopia agônica, os adultos apenas reforçam o sentimento de confusão mental da criança ainda incipiente em sua apreciação da retórica adulta. É evidente sua incapacidade de expressar o quanto se sente atingido com as interpretações que os outros dão de seus atos, que possuem um significado completamente diverso para si – os irmãos, o pai, o ex-professor. Assim como também testemunha os vizinhos discutindo sobre o que poderão aproveitar do cadáver do pai. Falado em alemão e com elenco idem, apresenta o outro lado da moeda da mais “fácil” vilanização da figura do nazista alemão típico, presente em Roma: Cidade Aberta. Implicitamente, o que Rossellini parece querer afirmar é que sobretudo o próprio povo sofre com as guerras. Em alguns momentos, uma retórica mais explícita quanto ao passado recente da Alemanha emerge, seja quando o pai afirma que havia perdido os filhos para Hitler mas, como sua geração, havia sido demasiado fraco para se contrapor ao rumo das coisas, ou quando um discurso do falecido líder emerge da gravação de um disco por entre as ruínas provocando um efeito irônico – posteriormente também em meio a uma igreja semi-destruída  se observará um padre ao piano. O filme é o primeiro do realizador a ser produzido após a morte de seu filho Romano, a quem é dedicado, apresentando, como O Amor,  ecos iniciais do que será uma aproximação de temas transcendentais a partir de um recorte terrestre. Tavere Films/SAFDI/UGC/DEFA. 71 minutos.

 

 

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