Filme do Dia: Z (1969), Constantin Costa-Gravas
Z (França/Argélia, 1969). Direção:
Constantin Costa-Gravas. Rot. Adaptado: Jorge Semprúm, a partir do romance de
Vassilis Vasilikos. Fotografia: Raoul Coutard. Música: Mikis Theodorakis.
Montagem: Françoise Bonnot. Dir. de arte e Cenografia: Jacques D’Ovidio.
Figurinos: Piet Bolscher. Com: Yves Montand, Irene Papas, Jean-Louis
Trintignant, François Périer, Jacques Perrin, Charles Denner, Pierre Dux,
Magali Noël, Renato Salvatori, Marcel Bozzuffi, Clotilde Joano.
No meio de um governo militar
autoritário, um líder de esquerda pacifista e contrário ao armamento nuclear
(Montand), é atingido em um atentado em praça pública, quando saía de um
comício por homens (Salvatori, Bozzuffi) contratados por pessoas do alto
escalão do governo. O procurador da república (Trintignant), no entanto,
insatisfeito com a pressa da versão oficial, desmonta a tese de acidente que se
queria fazer a população acreditar, com auxílio involuntário de um intrépido
fotógrafo.
Talvez o mais lembrado filme do
realizador se deva a nele ter mesclado de forma mais sedutora o thriller com o comentário político que
faz menção a uma ditadura militar em nada muito diversa de qualquer república
latina contemporânea (Brasil, incluído, daí o filme ter sido censurado aqui)
mas particularmente a sua própria Grécia, lembrada como provocação nos créditos
iniciais ao se registrar que qualquer semelhança com a realidade ou pessoas
vivas ou mortas é “deliberada”. E, de fato, tendo o filme, assim como o livro
no qual foi inspirado, se inspirado por sua vez fortemente no atentado contra o
líder de esquerda grego Grigoris Lambrakis, bastante similar ao aqui
representado. O que deve ter provocado
boa parte do frisson do filme, em
termos de premiações internacionais, deve-se ao seu caráter tecnicamente
virtuoso, sobretudo quanto à encenação de uma briga com carro em movimento –
muito provavelmente sendo esse o motivo de Bozzuffi surgir em papel não muito
diverso pouco após em Operação França.
Quanto ao comentário político, existe certa ingenuidade na forma tosca com que
são selecionados, por exemplo, os responsáveis pelos ataques contra os
políticos de esquerda, mesmo se levando em conta uma distância de quem fosse
membro do exército, o que nem sempre foi o caso, quando se descobre que o
motorista que transferiu o líder político em grave estado era o mesmo do
general para ficar em um exemplo demasiado óbvio. Quanto à montagem, premiada
pela Academia de Hollywood no ano em que concorreu, o que mais chama a atenção
é um exercício de flashbacks que se insinuam como rompantes subjetivos
brevíssimos de alguns dos personagens envolvidos, caracterização longe de
original mesmo à época da produção. E igualmente sendo excessiva em sua
metragem. No molde do filme de mensagem liberal, por sua vez, o personagem do
procurador praticamente surge como herói individual pouco crível a se debater
contra todo um sistema. E não se furta o filme a apresentar, em termos de
imagens, o julgamento de todos os envolvidos no crime, inclusive o comando
militar, numa saída que negocia com uma catarse somente para negá-la, no
momento em que já não é mais que um apêndice do filme, descrevendo os eventos
que ocorreram após o momento focado, com o assassinato do político que ficara
apenas ferido, confundido que fora com Z, os militares sendo absolvidos pela
sua própria justiça e o procurador sofrendo reveses em sua carreira. Dentre os
vários exemplos de falta de sutileza se encontram, além dos exibicionistas
fascistas do lumpem-proletariado ou o homem que decide contar tudo à imprensa
numa ingênua boa fé, também um fotógrafo que mais se assemelha a um repórter
investigativo, tirando fotos de tudo e de todos sem que as pessoas percebam,
embora com uma câmera nada pequena a tiracolo e, curiosamente, sendo o único
representante da imprensa que está acompanhando com mais afinco o caso. Numa
trama que a maior estrela é ela própria, os personagens podem ser esquemáticos
o suficiente para não exigirem grandes demandas de nomes como Montand (visto em
não mais que 15 minutos) ou Papas e de boa parte deles, inclusive o
protagonista, não se sabe sequer o nome, sendo a letra Z, no alfabeto grego,
como se afirma ao final, “aquele que ainda vive”, e que é probida do alfabeto
pela ditadura juntamente com um sem número de outros itens, que vão da
minissaia aos Beatles, passando por Sartre e a própria prata da casa (Sofócles,
Eurípedes) e chegando aos cabelos compridos, sociologia e Beckett, dentre
várias outras referências, com maior número de dramaturgos. Embora não
creditado, Costa-Gravas também foi roteirista. Destaque para vários intérpretes
emblemáticos da cinematografia francesa do período, associados sobretudo com
realizadores da Nouvelle Vague como Chabrol e, sobretudo, Truffaut. Reggane Films/Office National pour la
Commerce et l’Industrie Cinematographique. 127 minutos.
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