Filme do Dia: Transeunte (2010), Eryk Rocha



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Transeunte (Brasil, 2010). Direção: Eryk Rocha. Rot. Original: Manuela Dias & Eryk Rocha. Fotografia: Miguel Vassy. Música: Fernando Catatau. Montagem: Ava Gaitan Rocha. Dir. de arte: Marcos Pedroso. Figurinos: Alex Brollo & Maíra Senise. Com: Fernando Bezerra, José Paes de Lima, Luciana Domscheke, Bia Morelli.
Expedito (Bezerra) é um aposentado que vive solitário em um apartamento no Rio. Seu cotidiano consiste em ir buscar sua aposentadoria, fazer ocasionalmente exames médicos, observar conversas alheias, cultuar a memória da mulher falecida e buscar satisfazer sua sexualidade através de sexo ocasional com prostitutas, assim como ir assistir partidas do Flamengo no estádio e cantar serestas na noite carioca.
Uma façanha que o filme de Rocha consegue, e não se trata de nenhuma forma de algo menor, dado o panorama do cinema brasileiro talvez desde sempre, é o de desdramatizar ao ponto máximo seu protagonista, ao ponto de fazê-lo mesmo passar por um “ator natural”, encenando seu próprio cotidiano diante da câmera. Quando se percebe que tal elaboração se encontra inserida em uma mais ampla, que é a de inserção em um cotidiano que flui sem as premências que o filme dramático convencional pede o resultado demonstra ser tanto acertado quanto talvez um pouco cansativo, a depender do espectador, mas incontestavelmente sempre imantado numa representação do universo de seu protagonista. Sente-se sua solidão, pois o próprio filme reserva sua primeira fala já mais de dez minutos transcorridos de seu início. Construído visualmente sobretudo a partir da dupla face que observa o rosto de Expedito, e igualmente o que ele observa do mundo, em boa parte mediado pela comunicação de massa, do qual o rádio ganha um papel imperativo – inclusive servindo como áudio para as partidas de futebol que assiste pela TV – o filme acaba construindo, com delicadeza pouco habitual no cinema, um retrato da melancolia e solidão compartilhada que se encontra longe da vitimização. Dito isso, não se pode deixar de observar elementos que poderiam ter sido limados sem apresentarem qualquer obstáculo, inclusive, para um maior rigor e coerência estilísticos do filme. Todos eles, de certa forma, compartilham algo que se choca contra o ascetismo proposto e relativamente bem delineado, seja uma desnecessária trilha musical, por vezes de extrema redundância e soando em descompasso com o universo de seu personagem, reforçando no plano extra-diegético o que a própria diegese já havia deixado pistas, com bem mais sutileza – caso do olhar voltado para casais, evocando seu próprio passado, ou para as garotas que andam pelas ruas, a ressaltarem seu presente solitário. Tampouco se fazem necessárias as imagens que não compartilham do recorte bastante objetivo – e acertado – que havia sido a tônica do filme, como as de mar ao final. Surge com grande força visual a questão da individualidade e do peso de se carregar uma subjetividade diante de um mundo por demais massificante, quase asfixiante, figura recorrente na impressionante quantidade de janelas do complexo habitacional em que Expedito mora, ou ainda na miríade de depósitos destinados aos restos mortais daqueles que necessitam desocupar o espaço do cemitério, ao qual ele leva a sua falecida esposa, e devidamente identificável, como faz questão de ressaltar o funcionário, através de um impessoal número. Videofilmes. 100 minutos.

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