Filme do Dia: Bleak Moments (1971), Mike Leigh
Bleak Moments (Bleak
Moments, Reino Unido, 1971). Direção e Rot. Original: Mike Leigh. Fotografia: Bahram Manocheri.
Música: Mike Bradwell. Montagem: Les
Blair. Dir. de arte: Richard Rambaut. Com:
Anne Raitt, Sarah Stephenson, Eric Allan, Joolia Cappleman, Mike Bradwell, Liz
Smith.
Sylvia (Raitt) é um jovem secretária que divide a
casa com uma irmã deficiente mental, e Hilda (Stephenson) que tem como prazer
predileto, após chegar em casa, a bebida. No trabalho sua colega mais próxima é
Pat (Cappleman), problemática em seu relacionamento com uma mãe inválida
(Smith) e o medo de não mais conseguir casamento. Certo dia Sylvia é abordada por
Peter (Allan), que a visita no final de semana, levando um presente que Hilda rejeita.
Sylvia aluga sua garagem para o músico que faz bicos, Norman (Bradwell), que
passa o tempo a tocar violão, fumar e imprimir material para uma revista alternativa
de literatura. Peter combina uma nova saída com Sylvia, sendo que Pat
estrategicamente leva Hilda prá sua casa. Porém o almoço em um restaurante
oriental é constrangedor pela ignorância do garçom, e Hilda se assusta
com as discussões violentas entre Pat e sua mãe. Pat acomoda Hilda em sua cama,
quando Sylvia chega com Peter. Pat sai um tanto quanto constrangida. Peter
entabula uma conversa dissonante sobre se ela gosta mais de assistir televisão
ou ouvir rádio e as teorias de MacLuhan e Sylvia, que faz questão em que tomem
rapidamente o licor, interrompe-o abruptamente para afirmar que deveriam se
tocar. Após tocá-la brevemente, Peter se retira da casa constrangido. Sylvia
chama Norman para beber com ela, mas esse inventa que terá que sair com os
amigos para um bar. Norman abandona a garagem, já que foi despedido pelo grupo
que o contratara, deixando Hilda triste, já que gostava de sua presença e da
sua música. Sylvia reencontra Peter na biblioteca, que a aborda friamente. Pat,
com arroubos religiosos, pretende levar Hilda prá morar com ela. Ela não
resiste, porém, quando Sylvia lhe pergunta sobre como se encontra sua mãe e se
desequilibra emocionalmente. Sylvia concorda que Pat leve Hilda ao cinema,
enquanto toca sozinha ao piano.
Primeiro
filme de Leigh, com estilo seco e uma grande perspicácia para explorar o
não-dito, seja em seus silêncios, seja nas conversas evasivas que não chegam ao
ponto em questão que a motivaram. Essa visão soturna e anti-sentimental de
personagens sem qualquer glamour lembra, sob outra perspectiva e momento, O Bígamo (1953) de Lupino, sendo
igualmente ironizada, como no momento em que Sylvia reencontra Peter pela
primeira vez após a noite frustrada, e comenta com a irmã como a relação deles
lembra a de Romeu e Julieta. Auxiliando na composição de seu estilo austero se
encontra a ausência completa de trilha sonora. Por outro lado, as canções
dedilhadas por Norman no violão são de tom melancólico – Pat chega a lhe pedir
que toque algo alegre - como as próprias cores sem brilho do filme. Raitt
consegue compor uma Sylvia que expressa no olhar uma compreensão das situações
que vão muito além do transmitido verbalmente, chegando a utilizar-se de obscuros
códigos que dizem respeito apenas a si mesma – como a relação entre avelãs e
seu desejo sexual (em ambas as tentativas de conquistar Norman e Peter, ela
lhes oferece avelãs, e revela ao segundo que se trata de um código). Como
Cassavetes, Leigh lida com personagens com lacunas afetivas básicas e uma certa
psicodramatização dessas lacunas, embora não acompanhadas das freqüentes
explosões de delírio, sentimento, e álcool que essa inadequação muitas vezes
move nos filmes do cineasta americano. Destaca-se dentro da linearidade dos
planos que acompanha o filme do início ao final, a montagem rápida e virtuosa
dos rostos silenciosos e cada vez mais embaraçados pelo crescente silêncio de
Norman, Peter, Pat, Sylvia e Hilda, ao redor da mesa. A solidão é uma marca de
todos os personagens apresentados, reforçada no caso de Sylvia e da irmã, nas
longas caminhadas solitárias pelas ruas do bairro. Prêmio no Festival de
Locarno do ano seguinte. BFI/ Memorial Enterprises/Autumn Productions . 111 minutos.
Comentários
Postar um comentário