Filme do Dia: Boca de Lixo (1993), Eduardo Coutinho
Boca de Lixo (Brasil, 1993).
Direção: Eduardo Coutinho. Fotografia: Breno Silveira. Música: Tim Rescala.
Média metragem que aborda pessoas que retiram sua
sobrevivência do lixo que catam em um grande aterro situado em São Gonçalo,
região metropolitana do Rio de Janeiro. Esse interessante documentário de
Coutinho parece se enocntrar a meio termo entre Cabra Marcado para Morrer
(1984) e uma produção crescentemente focada estritamente no depoimento tal como
O Fim e o Princípio (2005). Do filme anterior ainda persiste uma certa
manipulação com a montagem, ainda que em bem menor monta, quando se trata
justamente do eixo de elaboração do outro, como quando os depoentes falam de
algo ou alguma coisa e as imagens sobre o qual se referem acabam sendo inseridas – e aqui até mesmo a música de Roberto Carlos, torna-se tema de um breve exercício de montagem que, ao
som da música em questão, parece convidar o espectador a incluir seus
personagens e ambiente sem o olhar sociológico, experimental ou formalmente
virtuoso. O risco do último, por mais interessante que seja em termos formais
de linguagem audiovisual, como é o caso da abordagem de Furtado em Ilha das Flores (1989), correria o risco da abstração e obscureceria essa dimensão
humana que Coutinho pretende captar, e de certo modo o consegue, com suas
lentes e perguntas simples. Assim como a
representação do tradicional formato de “retrato da família”, com todos posando
em grupo diante da câmera, aqui repetida várias vezes, evocativa de uma imagem
semelhante pedida por um dos participantes de Cabra. Ou ainda quando
Coutinho e outros membros de sua produção surgem na própria imagem. Há uma
pretensão de dignificação da figura humana pelo que ela é e não por qualquer
outra tentativa de compreendê-la através de uma moldura social ou de
vitimização da pobreza, ainda que tampouco o filme se encontre em alguns
momentos no limite em termos de exposição dos sentimentos pessoais – no caso
aqui o momento em que uma das entrevistadas solta a voz e canta sua canção
sertaneja predileta – conseguindo se sair melhor, nesse quesito, no entanto, do
que um filme como Edifício Master (2002). A fala mais recorrente na boca
de crianças, velhos e adultos é a da dignificação de seu próprio trabalho
diante do roubo e da criminalidade, posição por vezes evidentemente defensiva
diante do que acreditam que será sua exposição diante de um público da
televisão. Talvez o mais pungente do filme seja a evocação de elementos comuns
e universais sob as condições de miserabilidade e falta de higiene,
habitualmente retratados seja pelo documentário ou ficção apenas no
enquadramento da violência ou da vitimização. CECIP. 49 minutos.
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